Elvira Fortunato
E se, de repente, deixasse de ser preciso verificar os prazos de validade, porque a embalagem muda de cor para lhe dizer que o iogurte ou o medicamento já não estão em condições de serem consumidos?
E se a escolha da cor para as paredes lá de casa deixasse de ser sinónimo de discussões infindáveis, porque a qualquer momento pode carregar e substituir o frio creme da parede da sala por um ocre quente e tropical?
E se deixasse de haver conta da EDP, pois os vidros acumulam durante um dia energia suficiente para o consumo doméstico? E se as persianas e cortinas se tornarem obsoletas, porque com um simples toque controla a tonalidade (mais escuro ou mais claro) dos vidros e até pode usá-los como mostradores de informação ou ecrãs de tv?
Estas novas novidades que vão revolucionar o nosso dia a dia num futuro não muito longínquo, serão possíveis graças a invenções geniais saídas da cabeça de Elvira Fortunato, 44 anos, cientista e líder do Laboratório de Ciência de Materiais da Nova de Lisboa.
A Elvira mais famosa do Mundo (critério Google) escolheu almoçarmos no Barbas, que considera, sem espinhas, o melhor restaurante de peixe de toda a Margem Sul, onde ela faz o essencial da sua vida. Mora em Almada e o laboratório fica no Monte da Caparica. Só atravessa a ponte para apanhar o avião (para já…) e ir a Alvalade ver o Sporting (ela e o marido compram sempre a gamebox).
Garoupinhas. Ela ia com a ideia nas garoupinhas, mas não como não as havia, aceitamos a sugestão da casa de uma (divinal!) cataplana de cherne e gambas.
Como estava um fabuloso dia de praia, comemos na esplanada – o marido Rodrigo (cientista e inventor como ela) e a filha Catarina, 11 anos (que não tinha aulas nesse dia) optaram pela sala.
Elvira tornou-se um caso sério na comunidade científica internacional com a patente da electrónica invisível, que logo despertou a cobiça da Samsung, que vai usar em todos os mostradores (telemóveis, máquinas fotográficas, tv, etc) a invenção made in Caparica, que proporciona resoluções altíssimas.
O ano passado, foi aclamada como o Cristiano Ronaldo da electrónica mundial, quando o mundo se apercebeu das enormes potencialidades da sua invenção do transístor de papel – que estão a ser exaustivamente inventariadas pela Universidade do Texas.
Jornalistas e cientistas de todo o mundo entupiram-lhe o telemóvel nos dias seguintes à divulgação, a 21 de Julho de 2008, de que ela tinha conseguido substituir o silício pelo papel (mais barato e flexível) como suporte de um transístor. O reconhecimento foi instantâneo e Elvira ganhou uma bolsa de 2,25 milhões do European Research Council, uma distinção sem precedentes para o nosso país.
É muito excitante estar à conversa com uma pessoa genial, capaz de arranjar novas aplicações para materiais comuns. Durante as duas horas que durou o almoço, abrimos sucessivamente diversas janelas fomos minimizando, sem nunca as fechar.
Elvira transpira uma autoconfiança sã, desprovida de uma gota sequer de arrogância. Está bem com a vida, apesar de não calar algumas criticas ao lado lunar da alma portuguesa: “Faço aquilo que gosto e ainda me pagam por cima”.
Quando lhe perguntamos como resiste à tentação de emigrar, responde: “O dinheiro é importante, mas há coisas mais importantes na vida do que um bruto ordenado. A minha família não está à venda. Em que outro país podia estar a almoçar o que comemos hoje com esta vista?”.
A satisfação e orgulho que tem na sua equipa (30 cientistas, de várias disciplinas, dos quais 12 doutorados) é infinita: “É a melhor equipa do mundo. No meu laboratório não existe a palavra impossível”.
Mas não esconde que lhe custa que num país, com uma fileira de papel poderosa, empresas como a Portucel e a Renova tenham desperdiçado a fantástica oportunidade que lhes foi oferecida, de aproveitar a invenção do transístor de papel para fabricar produtos inovadores e de maior valor acrescentado que o papel higiénico ou de fotocópia. Mal souberam do assunto, os brasileiros da Suzano atravessaram logo o Atlântico a correr….
Jorge Fiel
Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias
O Barbas
Praia do CDS, nº 13, Costa da Caparica
Ameijoas à Bolhão Pato
Cataplana de cherne com gambas
Bucelas Myrtus branco
Água Vitalis
2 cafés
O almoço foi oferecido pelo Barbas por cortesia “com a professora” que, apesar de sportinguista, é cliente da casa