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Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Sofia Sousa

“Hoje estou a cometer um excesso”, confessa, Sofia Sousa, 37 anos, enquanto olha, com um sorriso ligeiramente maroto, para o prato (pequeno) de raviolis de espinafres, com beterraba e couve, que trouxe do bufett do restaurante do Holmes Place de Miraflores, explorado pela cadeia de comida saudável Bits & Pieces.

O excesso de Sofia eram os raviolis. Por norma, ela não come massas. “Gosto mais de peixe do que de carne. E na carne prefiro sempre a branca à vermelha”, explicou a directora geral da Holmes Place Portugal, uma rede nacional de 19 clubes, com cerca de 60 mil sócios.

Sofia iniciou com um creme de legumes uma refeição que acompanhou com o sumo do dia (banana, laranja e morango). Estar em forma é uma preocupação que a acompanha desde os três anos, a idade em que a mãe (jurista) e o pai (jornalista) acharam apropriada para ela começar a fazer ginástica no Colégio Portugal, na Parede.

Ganhou-lhe o gosto e nunca mais parou. Fez ginástica desportiva, no Clube Nacional de Ginástica, até que no início da adolescência, em meados dos anos 80, se deixou contagiar pela moda da aeróbica, introduzida por Jane Fonda.

Pelo menos três a quatro vezes por semana, Sofia começa o dia às 7h30 com um treino de 45 minutos, de RPM (bicicleta) ou Total Condicionamento (“trabalha, localizadamente, diversos grupos musculares”, esclarece), em aulas com professor, num dos ginásios da rede Holmes – o seu centro de gravidade está em Algés, mas devido às suas funções, ela passa boa parte da semana em digressão pelos diferentes clubes.

“O treino relaxa-me”, afirma Sofia, que pesa 58 quilos, distribuídos por 1m72 de altura, o que além de excelente cartão de visita para a empresa que gere é a prova dos nove de que compensa ter um estilo de vida saudável, exercitando regularmente o corpo e sendo criterioso na escolha do que metemos na boca.

Licenciada em Gestão de Empresas pela Lusíada (1997) e sócia desde a primeira hora do Holmes (que abriu em 1998, com o clube da Quinta da Fonte), nunca passou pela cabeça a Sofia que iria trabalhar e ganhar a vida no local onde tinha prazer - e que pagava para frequentar.

Debutou profissionalmente no sector financeiro. Após um estágio no Credit Lyonnais, passou pelo BNU, experiência que recorda como deveras gratificante: “Na faculdade inundam-nos com muitos conceitos e teoria. No BNU vi como é que as coisas se faziam na vida real, lidando directamente com os clientes, enfrentando todos os dias situações diferentes. Aprendi muito com esta experiência enriquecedora”.

O departamento financeiro da Samsung, em Linda a Velha, foi a última etapa antes de deitar âncora no Holmes Place Portugal. Soube que havia uma vaga de directora de serviço, candidatou-se e ficou. Foi há uma dúzia de anos que começou a fazer alpinismo na hierarquia da empresa – até atingir, o ano passado, o vértice da hierarquia, dirigiu os clubes de Defensores de Chaves e de Miraflores e foi supervisor regional.

“Gosto do que faço, porque adoro trabalhar com pessoas e para pessoas, Aqui não há rotinas. Todos os dias há situações diferentes para resolver . Temos de ter a cabeça aberta e sermos humildes para estar sempre a aprender”, sintetiza.

Sofia (ainda?) não sentiu os efeitos da crise. Após o acelerado crescimento inicial, o número de sócios está estabilizado nos 60 mil (na maioria mulheres e do escalão etário 35/45 anos). Está preparada para enfrentar algumas desistências no pequeno grupo de sócios absentistas, que não frequentam os clubes (a média geral ronda as duas visitas por semana). Mas acredita que num período de crise as pessoas são mais criteriosas na aplicação do seu dinheiro e não vão poupar na prevenção e privar-se de um estilo de vida saudável.

“O conceito do Holmes é diferente dos ginásios de bairro. Nós somos um clube, que os sócios frequentam para treinar, nadar, fazer um sauna ou banho turco, relaxar no jacuzzi, encontrar os amigos, conviver com eles, fazer uma refeição ou até fechar negócio. É um convívio presencial e por isso bem mais simpático e saudável do que o Facebook”, conclui Sofia.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

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Bits & Pieces

Holmes de Miraflores, Oeiras

Creme de legumes …1,90

Prato do dia pequeno … 6,50

Prato do dia grande … 7,50

2 sumos naturais … 4,50

2 cafés … 2,40

Total … 22,80

 

 

Curiosidades

 

De acordo com um estudo do IHRSA, apenas 6 a 7% da nossa população faz exercício regulamente (o que não significa necessariamente que estejam inscritos num ginásio ou health club) . Ou seja, o Holmes Place tem uma quota de cerca 10% no mercado de 600 mil compatriotas cuja dose diária de exercício físico vai além do gesto de rodar a chave na ignição do carro e pressionar o botão de chamada do elevador. Há pois margem para o negócio crescer, tanto mais que em Espanha a percentagem de pessoas que pratica regularmente actividade física é o dobro da nossa (14%)

 

Os 900 mil portugueses obesos são, a um tempo, um dado estatístico preocupante e um target apetecível.  Com o reality show Peso Pesado, a Sic faz surf em cima da preocupante tendência para engordar. O Holmes Place Portugal formatou um produto para ajudar obesos e pessoas com peso a mais (40% da nossa população) a tornarem-se mais saudáveis. Peso Vital é o nome deste programa específico, com a duração de um ano e o custo de 149 euros/mês, em que os participantes são reunidos em grupos com um máximo de dez participantes e beneficiam de acompanhamento por um médico e um nutricionista    

 

Sofia não encara como concorrentes do Holmes as cadeias de clínicas de estética que pululam no nosso país como cogumelos depois da chuva: “Não se trata apenas de perder peso. A nossa preocupação vai além disso, contemplando mudança de hábitos e estilos de vida”

 

António Gonçalves

O irmão mais velho foi futebolista profissional no Boavista. O mais novo distinguiu-se como internacional de voleibol pelo Leixões. Lá em casa alguém tinha de estudar a sério. Depois de ter falhado por três décimas a entrada em Arquitectura, Tozé arrastou-se sete anos pelo curso de Engenharia Civil, enquanto cá fora reunia os conhecimentos, experiência e competência que fariam dele um pioneiro da indústria de videojogos em Portugal

 

Como o filho do meio

rompeu o cerco paterno

 

Nome:  António Gonçalves

Idade:  41 anos  

O que faz: Director geral da Seed Studios

Formação: Frequentou Engenharia Civil (FEUP) e fez o curso de Design Assistido por Computador na ESAD (Escola Superior de Artes e Design de Matosinhos), para além de uma data de cursos profissionais de fotografia, realização cinematográfica, representação e interpretação teatral, etc   

Família: Casado, tem um filho de cinco anos, o Manuel Maria, que tem um PS3 adora videojogos

Casa: Andar recuado no Paço da Boa Nova, em Leça da Palmeira (Matosinhos)

Carro:  BMW 320 D, com cinco anos

Telemóvel:  Blackberry (“para usar mesmo como telefone”) e IPhone

Portátil:  Asus ( mas vai mudar para Mac)

Hóbis:  Adora videojogos, mas esclarece que quando está a divertir-se com o War Craft (o seu jogo preferido), na PS3, também está a trabalhar. Duas vezes por semana (domingos e às terças), joga futebol de sete com os amigos. Gosta muito de cinema, que consome maioritariamente em casa   

Redes Sociais: “O Facebook é fantástico mas tenho pouco tempo para lá estar”

Férias:  Como não gosta do Algarve na época alta (“é muita confusão”), faz lá praia em Junho, o que este ano até dá jeito porque tem já encomendado um irmão para o Manuel Maria, que deve vir ao mundo em Agosto. O ano passado estiveram 15 dias na praia de S. Rafael, junto a Albufeira. Em Agosto gostam de viajar para destinos diferentes, como Açores, Tailândia ou Madeira. Tem prometida à mulher uma viagem a Nova Iorque – “Talvez para o ano!”   

Regra de ouro: “O que mais valorizo é o carácter. A seguir, a humildade, honestidade e ambição – que não deve ser confundida com ganância. Depois, vêm a criatividade e capacidade de trabalho”

 

Se não fosse o filho do meio muito provavelmente não seria agora um dos pioneiros da indústria portuguesa de videojogos, responsável pelo jogo mais caro de sempre jamais produzido no nosso país – o Under Siege, para PS3, cuja produção custou 1,4 milhões de euros e que começou esta semana a ser vendido na loja online da Sony, nos Estados Unidos.

Quis o destino que António (Tozé para os amigos) fosse o filho do meio do casamento entre uma doméstica e um funcionário do porto de Leixões – e que o Jorge, o irmão mais velho, se tornasse profissional de futebol (jogou na I Divisão ao serviço do Boavista) e que Armando, o mais novo, se salientasse no voleibol, onde acumulou internacionalizações.

António ainda alinhou a extremo esquerdo, nos juniores do Leixões, mas teve de arrumar as botas no ano da passagem a sénior. Naquela família alguém haveria de estudar e foi a ele que saiu essa fava.

Foi contrariado que se inscreveu em Engenharia Civil, na FEUP, onde se demorou sete anos sem concluir o curso. “Engenharia não tinha a ver com as minhas capacidades”,explica Tozé, que falhou por três décimas a entrada em Arquitectura, para onde, um ano depois, pediu sem sucesso a transferência – “Havia seis vagas, eu fiquei em sétimo”..

Mas não pensem que mandriava enquanto se arrastava pela rua dos Bragas. Arranjou um part time na Cinerama, uma produtora onde foi homem dos setes instrumentos (assistente de câmara, operador, editor…) e fez o curso de Design Assistido por Computador, na ESAD, enquanto se iniciava nas artes da 3D.

Ainda universitário, fez a sua primeira empresa (Urbimagem, especializada na produção de maquetes em 3 D para gabinetes de arquitectura), onde não aqueceu o lugar devido a divergências com os sócios. Partiu para outra, a Miragem, de Henrique Oliveira (o ex-Táxi agora na HOP), que o contratou como responsável pela 3D da série Major Alvega.

Em Outubro 1997, mal acabaram as aventuras televisivas do aviador,  Tozé, com 27 anos, dá uma volta à sua vida. Vai dar aulas de Materiais e Tecnologia para a ESAD de Matosinhos, ganhando assim tempo para pensar e criar.

Seis meses volvidos, estava a criar a Linha de Terra (LT Studios),  que fez a maquete em 3D do Estádio do Dragão e se iniciou no mundo dos jogos por causa de uma encomenda do Euro 2004. Tozé reuniu à sua volta competência na área de jogos (Filipe Pina, Bruno Ribeiro, Jeffrey Ferreira). Não acertaram à primeira (o jogo para o Euro 2004) nem à segunda (um jogo para PC intitulado Holy War), mas apenas à terceira. Em 2006, foi criada a Seed Studios, um spin off da Linha de Terra vocacionado para a produção de videojogos.

Após ter feito três jogos para Nintendo DS (Sudoku for kids, Aquatic Tales e Toy Shop Tycoon), a Seed aventurou-se a jogar na I Divisão e começou a namorar a Sony, propondo-se a fazer um jogo, o Under Siege, para a PS3.

“Apesar de termos uma equipa de 20 pessoas a trabalhar em full time no jogo, o projecto atrasou-se um ano. Tivemos todos os problemas que possa imaginar, desde técnicos, até burocráticos, operacionais e financeiros. Aconteceu-nos de tudo. Mas agora, para nós, fazer um videojogo já não tem segredos”, conclui Tozé, que espera  alcançar três milhões de euros de vendas com o Under Siege e está empenhado em apoiar a criação de uma industria portuguesa de videojogos, sector que desde 2009 já factura mais do que o cinema e a música juntos.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

O resto são tretas

Nunca falhávamos um jogo em casa. Ao domingo de manhã eram os juvenis na Constituição ou os juniores no campo de treinos das Antas. À tarde, duas horas antes do jogo, já estávamos na paragem do D para conseguirmos um lugar bom na Superior, bem perto do Tribunal.

No regressoa casa, fazíamos uma escala na Casa das Tortas, onde ouvia o meu pai comentar o jogo com os amigos, enquanto bebiam taças de Três Marias e petiscavam pasteis de Chaves quentinhos.

Sou portista desde que me lembro. De miúdo de calções até meados da adolescência, nunca deixei de acompanhei o meu pai aos domingos. As Antas eram a nossa catedral, o FC Porto a nossa religião, o jogo dos seniores a nossa missa.

Movidos por esta fé atravessamos, durante 18 anos, um deserto de vitórias, apenas pontuado por um pequeno oásis (a Taça de Portugal de 68). Tivemos de esperar pelo 25 de Abril para que a esta fome de títulos se sucedesse a fartura de vitórias de que este ano das quatro taças é um belo exemplo. 

A longa e esmagadora hegemonia azul e branca tem gerado tensões difíceis de ultrapassar, devido à incapacidade dos principais concorrentes em acertarem numa estratégia e modelo de gestão que assegurem a viabilidade do negócio do futebol no nosso pais.

Nos anos 60, o Benfica construiu a sua liderança à sombra das mesmas regras de Condicionamento Industrial. A gramática do Estado Novo era simples. Só se iniciava uma actividade económica após a obtenção prévia da bênção de Salazar. Depois não era preciso ser um Einstein para enriquecer, pois beneficiava-se de mercados cativos e acesso privilegiado às matérias primas das colónias.

Até ao 25 de Abril, o nosso futebol viveu em regime de duopólio, com os dois grandes de Lisboa a partilharem as pérolas futebolísticas da África portuguesa e das ruas deste pobre país - protegidas da cobiça alheia pela lei e vontade do Salazar que impediu a transferência de Eusébio para o Inter.

O Benfica e o Sporting ganham poucas vezes porque nunca souberam adaptar-se a um mercado cada vez mais aberto, primeiro com a democracia, depois com a CEE, e finalmente com a lei Bosman que levou ao futebol o mercado único europeu que desde 92 funcionava nas outras áreas da economia.

O Porto é hegemónico porque tem sempre sabido aplicar ao futebol o catecismo estratégico dos países desenvolvidos, que consiste em nunca parar de subir na cadeia de valor, vendendo, no momento certo e com valor acrescentado, jovens talentosos recrutados em mercados periféricos – depois de os fazer crescer e os mostrar na Champions.

Só quando se convencerem que o Porto ganha apenas porque é mais competente é que o Benfica e o Sporting poderão aspirar a quebrar a hegemonia azul e branca. Tudo o resto são tretas.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

Champanhe e pentelhos

- You are drunk, Mr Churchill, constatou, escandalizada, a catatua que partilhava a mesa do antigo primeiro ministro britânico.

-  Sim,  estou bêbado, mas pela manhã estarei sóbrio e você continuará feia, ripostou Winston, que comandou com mão de ferro a resistência europeia ao expansionismo nazi e soube fazer do champanhe um precioso aliado para derrotar Hitler.

“Tirei mais do álcool do que o álcool tirou de mim”, escreveu o velho leão, consumidor frequente de Pol Roger e que no Dia D teve presença de espírito para gracejar que não estava só em causa a libertação de França - mas também do champanhe.

Imortalizado pelos célebres discursos do blood sweat and tears e da cortina de ferro,  Winston (que aguardou a morte pintando marinhas em Câmara de Lobos) cunhou outras frases célebres, como aquela sobre a imprescindibilidade do champanhe (In victory I deserve it, in defeat I need it), uma variante da frase de Bonaparte (“Bebo sempre champanhe; na vitória para celebrar e na derrota para me consolar”).

Não escassearam as oportunidades para Churchill, pelas boas e más razões, se enfrascar em champanhe durante uma carreira política que foi longa porque ao seu tempo a opinião publicada não tinha sido ainda  sequestrada por um bando de falsos moralistas, que se tivessem nascido no Afeganistão dos talibãs teriam feito carreira no Ministério para a Promoção da Virtude e Prevenção do Vício.

Lembrei-me da paixão de Churchill pelo champanhe a propósito do coro condenatório de virgens ofendidas que se fez ouvir quando o acelerado Catroga se deixou arrastar pelo coloquialidade e criticou na televisão os jornalistas por andarem “a discutir pentelhos”.

Eu não gosto de Catroga porque ele, quando ministro das Finanças, ordenou a ridícula penhora da retrete do Estádio das Antas e fez tábua rasa das leis do mercado, prejudicando os interesses dos pequenos  accionistas para engrossar a fortuna da Champalimaud ao reduzir-lhe a factura da compra do grupo Totta.

Eu não gosto de Catroga, pensionista com uma reforma de 9.693 euros e 54 cêntimos, porque teve a desfaçatez de contar em público a confidência que Manuel Pinho lhe fez ao almoço: “Dizem que vou para a Caixa, mas aquilo só dá 350 mil euros e o carro também não é grande coisa”.

É por estas e por outras que Catroga não deve ser ministros das Finanças – e não por ter falado em pentelhos. É por ter menosprezado um salário de 350 mil euros que Pinho não deve voltar ao Governo – e não por ter feito corninhos na Assembleia. O moral da vida exemplar de Churchill é esse: o que conta nos políticos  é o seu carácter e competência. Tudo o resto, é uma questão de pentelhos.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias 

José Paulo Duarte

O feijão verde, a cenoura, o ovo, a couve flor e as batatas, ou seja todos os acompanhamentos da posta de pescada cozida que foi o almoço de José Paulo Duarte, tinham sido entregues nesse dia, pela manhãzinha, por uma das suas empresas (a Confraria da Horta), na cozinha do restaurante O Policia.

Se lhe falam em Paulo Duarte o mais provável é que a primeira coisa que lhe venha à cabeça sejam camiões e não os espargos ou as mais 200 variedades de produtos frescos que as 14 carrinhas da Confraria distribuem, todos os dias, ao romper da bela aurora, por hotéis, restaurantes, cafés e lares de toda a Grande Lisboa.

Já todos nos cruzamos na estrada com um dos 600 camiões da Paulo Duarte, a maior empresa portuguesa de transporte de alimentos e combustíveis - mais de 75% da sua frota é constituída por camiões cisternas.

Mas sucede que o quartel general da Transportes Paulo Duarte é em Torres Vedras, onde bate o coração do Oeste, a região que concentra cerca de 80% da produção nacional de frescos, pelo que se compreende que José Paulo Duarte, 55 anos, não tenha resistido à tentação de investir na produção e distribuição de produtos horto-frutícolas.

Além da Confraria da Horta, o grupo controla a Abrunhoeste, responsável por uma produção anual de mais de seis mil toneladas de fruta, essencialmente pêra rocha (4,7 mil toneladas), mas também ameixa (775 t), maçã (400 t) , pêssego, meloa e nectarinas.

“Temos óptimas condições naturais para a produção de horto-frutícolas. A laranja algarvia é deliciosa, enquanto que na maior parte das vezes a laranja espanhola é intragável. O problema é haver poucos agricultores empresários. Em 2009, as exportações do sector valeram 800 milhões de euros, mais 200 milhões que as de vinho. E a procura externa de fruta e produtos hortícolas portugueses não pára de crescer. Só nos últimos três meses, e para um único cliente alemão, transportámos 1500 camiões de batata, cenoura e cebola”, afirma José Paulo Duarte, que vai alargar em mais 90 hectares a sua área de produção.

Apesar do futuro próximo na nossa economia se apresentar carregado de nuvens, os negócios do grupo Paulo Duarte prosperam sob o céu tão azul que até parece acabado de lavar na máquina. A fruta toda vendida e no primeiro trimestre do ano o negócio dos transportes registou um crescimento de 20%, completamente à revelia do ciclo económico.

A falência de muitas pequenas empresas, com apenas um ou dois camiões, que baseavam a sua competitividade num preço baixo (e não acautelavam nos contratos uma revisão de preço em caso da subida do gasóleo) ajuda a perceber esta performance brutal da Transportes Paulo Duarte, que tem a sua blindagem à crise reforçada pelo facto de se ter especializado no transporte de bens de primeira necessidade (alimentação e combustíveis).

“Temos dezenas de camiões a andar 24 horas por dia durante os 365 dias do ano”, declara José Paulo, que durante a juventude foi ginasta e jogou hóquei em patins na Física de Torres Vedras, e começou a trabalhar na empresa fundada pelo pai, quando, com 24 anos, decidiu casar e pôr um ponto final a uma carreira universitária feita entre Agronomia (quatro anos) e Gestão de Empresas (dois).

Escolheu almoçarmos no Polícia, e não era preciso ser muito observador para reparar logo que é a cantina onde faz as suas refeições, quando está em Lisboa. Os empregados, que trata pelo nome, conhecem-lhe os hábitos. E a clientela habitual ou o cumprimenta ao longe ou vai mesmo à sua mesa dar duas de paleio.

“Desde pequeno que venho aqui com o meu pai. Dantes havia ali, junto ao restaurante, um posto de abastecimento da Sacor e os transportadores tinham o hábito de virem aqui almoçar”, conta, antes de atender um telefonema. Era um amigo (mas não cliente) que estava desesperado e precisava muito que ele lhe assegurasse um transporte. José Paulo pediu desculpa, mas não podia fazer-lhe esse favor. A sua frota, apesar de recentemente aumentada, só chega para as encomendas dos clientes habituais…

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

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O Polícia

Avenida Conde Valbom 127

Pescada cozida …17,50

Garoupa grelhada … 21,00

Vinho da casa branco (Vinha das Servas) … 11,00

2 cafés … 2,40

Total … 51,90

 

 

Curiosidades

 

José Paulo Duarte pai (na foto) nasceu em 1918, numa família de agricultores abastados do Oeste. Como ficou órfão com 14 anos (o pai dele morreu tuberculoso), foi trabalhar como mecânico para ajudar a mãe a sustentar os seus sete irmãos. Depois de ter aproveitado a tropa (feita em Cascais) para tirar a carta, em 1946 comprou um camião Chevrolet e estabeleceu-se, fundando a Transportes Paulo Duarte. À sua morte, o filho homónimo sucedeu-lhe à frente do grupo, onde já trabalha a terceira geração – Gustavo e António, filhos de José Paulo Duarte filho, ambos internacionais de rugby 

 

A maçã Royal Gala ultrapassou a Golden na preferência dos portugueses. Mas a fruta de eleição de José Paulo Duarte é a pêra rocha, que aprecia ao natural, cozida (sem açúcar à sobremesa) ou mesmo a substituir batatas ou arroz como acompanhamento: “Fatias fininhas de pêra rocha, salteadas em azeite e sal, ficam muito bem com um prato de porco”   

 

A criação do mercado único europeu com a abertura das fronteiras tornou o transporte rodoviário imbatível relativamente à concorrência ferroviária. “Dantes, ficávamos um ou dois dias parados em Vilar Formoso. Agora fazemos Madrid-Lisboa em oito horas. E em 36 horas ponho os morangos de Odemira à porta do comprador inglês. Hoje em dia, as empresas não tem stock. O stock está no camião”, diz José Paulo Duarte

 

João Ferreira Gomes

 

A vocação para a Arquitectura começou a revelar-se no jeito para desenho e no gosto por brincar com legos. Confirmou-se com o incêndio do Chiado. Ainda adolescente, na Buraca, ajudou ao balcão de uma drogaria e fundou a Trombeta, um jornal local. Antes de ir para a faculdade, trabalhou na Dun & Bradstreet, um emprego que abriu uma nova janela na vida deste arquitecto que ganha a vida a vender janelas eficientes 

 

O arquitecto que ganha a vida

a vender janelas eficientes

 

Nome:  João Ferreira Gomes

Idade:  38 anos  

O que faz: Presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Janelas Eficientes (ANFAJE) e director comercial e de marketing da Caixiave

Formação: Licenciado em Arquitectura   

Família: Vive há oito anos em união de facto com uma socióloga que tem um negócio de moldes de plástico

Casa: Apartamento em Linda-a-Velha, Oeiras

Carro: VW Passat  

Telemóvel:  Blackberry (“que nos deixa viciados…”)

Portátil:  Tsunami (“fabricado em Portugal pela JP Sá Couto”, sublinha)

Hóbis:  Gosta de dar passeios ao ar livre (“evito ir a centros comerciais”), visitar exposições e ir ao cinema – é frequentador assíduo da Cinemateca, Gulbenkian e CCB     

Redes Sociais: Facebook, que vai actualizando através do Blackberry

Férias:  Não se mete no avião para fazer praia. “Da minha casa, em Linda a Vela ponho-me na praia de Carcavelos em menos de dez minutos”. Prefere fazer férias culturais. O ano passado esteve 15 dias em Nova Iorque. No anterior andou entre Moscovo e S. Petersburgo. Este ano talvez vá à China

Regra de ouro: O caminho faz-se andando

 

 

O incêndio do Chiado, que o apanhou no 9º ano, levou-o a tomar contacto com o mundo da Arquitectura e teve o condão de lhe acender a vocação. Ainda adolescente, começou a acompanhar os planos para recuperar a zona ardida, riscados por Álvaro Siza Vieira, o autor da edifício que João mais aprecia – o Pavilhão de Portugal - apesar que achar deplorável que se mantenha sem funções há mais de uma dúzia de anos.

Não entrou à primeira. O acesso a Arquitectura exige médias elevadas e os 92%, com que se candidatou eram curtos. Para ser admitido precisava de ter 98%. Como o dinheiro não abundava em casa, enquanto se preparava para a segunda tentativa de entrar no curso que queria, arranjou emprego, respondendo a um anúncio do Expresso Emprego que pedia um business analyst .

Durante um ano trabalhou na Dun & Bradstreet, a recolher informações comerciais, fazendo telefonemas e espiolhando à lupa relatórios e contas de centenas de empresas. Além de dinheiro, ganhou experiência e uma visão mais alargada da vida e do mundo.

Filho mais novo (o irmão, oito anos mais velho, é polícia) do casamento de uma doméstica com um responsável pela doca de Alcântara, João fez o secundário no Liceu Nacional de Queluz, onde o seu jeito para desenho deu logo nas vistas.

“Passava as aulas a desenhar. Nos primeiros dez minutos aprendia, depois distraía-me a desenhar caricaturas dos colegas e professores”, recorda João, acrescentando que por causa disso foi acumulando faltas de castigo, pois nem sempre os professores apreciavam a sua veia artística. Os primeiros sinais da vocação que o levou a arquitectura manifestavam-se nesta queda para o desenho e no gosto por brincar com legos, que ainda mantém (“Ofereço legos aos meus sobrinhos e depois aproveito e sou eu que os monto”, conta).

Desenrascado, cedo começou a ganhar dinheiro. Com 14 anos, nas férias grandes, arranjou um biscate ao balcão de uma drogaria ao pé de casa. E depois, num rasgo precoce de empreendedorismo, dinamizou o grupo de colegas do bairro que fundou um jornal local, a Trombeta, financiado com as receitas de publicidade angariadas junto dos comerciantes da Buraca.

Mas quando finalmente entrou na faculdade, teve de abandonar os ganchos. “O curso de Arquitectura é excelente, mas um full time job. Nos outros podia estudar-se de véspera. No nosso tinha de ser o ano inteiro”, conta João, que herdou do pai o seu primeiro carro, um Fiat 127 preto, com uma risca laranja, que fez mais de 250 mil km sem uma única avaria, e que ele, nas descidas, punha em ponto morto para poupar gasolina.

Acabado o curso e o estágio (no atelier de Nuno Leónidas), ainda fez alguns pequenos projectos de arquitectura, para familiares e amigos, mas logo reparou que o trabalho era pouco e a concorrência grande, pelo que tinha de se virar para outro lado. Começou por promover as torneiras Oliva, tendo como patrão Ludgero Marques, antes de em 1999 desaguar no mundo das janelas.

“Além das vantagens em segurança e isolamento acústico, ter janelas eficientes permite uma poupança até 40% em aquecimento e ar condicionado”, explica João Ferreira Gomes, que além de trabalhar, desde 2004 no departamento comercial da Caixiave (empresa de Famalicão que é  líder ibérica em janelas em PVC), fundou a Associação Nacional de Fabricantes de Janelas Eficientes, para ajudar a superar as debilidades de um sector muito atomizado e que carece de inovação permanente.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

Rerum Novarum 2.0

 

Dou-me muito bem com o hábito do banho diário. Passam-se anos sem tomar um banho de imersão (talvez não fosse assim se tivesse uma daquelas  banheiras modernas com jacuzzi), mas não dispenso o duche matinal, rápido, mais para o frio do que para o tépido, com um jacto forte  - detesto quando, por falta de pressão, a água sai a pingar.

O duche diário (que pode ser bidiário quando, no fim de um dia quente, chegámos pegajosos a casa) até pode mau para a pele, como argumentam alguns dermatologistas. Mas é óptimo, e não só do ponto de vista higiénico. É um auxiliar tão precioso como o café no milagre da nossa ressurreição diária após uma noite dormida a correr. E, confesso, dá-me muito prazer sentir a água a escorrer-me pelo corpo.

A componente voluptuosa do duche não passou despercebida ao cardeal Segura, arcebispo de Sevilha durante a guerra civil, que considerou o banho como “uma invenção dos pagãos, senão do próprio diabo”.

Apesar desta declaração desassombrada, estou em crer que a Igreja Católica recomenda aos fiéis a prática regular do banho. Desde esses tempos bárbaros, em que os legionários pró-franquistas (a trincheira de Segura) gritavam “Viva la Muerte!”, o mundo mudou muito e o Vaticano vai-se esforçando por acompanhar essa evolução, se bem que nem sempre os homens da Igreja consigam estar em sintonia com os novos tempos.

Parece-me mal que o antagonismo do cardeal patriarca ao bispo do Porto o tenha levado a criticar publicamente D. Manuel Clemente por ter aceite o Prémio Pessoa – e a transformar numa espécie de réplica das eleições do Sporting a escolha para a presidência da Conferência Episcopal Portuguesa.

D. José Policarpo não esteve bem ao forçar a sua eleição (à terceira volta!) para um lugar que já ocupara (1999-2005), jogando o prestigio do seu cargo para derrotar a candidatura do bispo do Porto, provocando uma dispensável tensão Norte/Sul na igreja e envolvendo-se numa manobra lida como de pressão para que o Vaticano lhe prolongue por mais três anos o mandato como patriarca de Lisboa, apesar já ter atingido a idade da reforma canónica (75 anos).

Tive uma educação católica, mas na adolescência afastei-me de uma igreja incapaz de dar respostas ao vendaval de coisas novas que a partir dos anos 60 começaram a abalar o mundo a uma velocidade estonteante – e que teima em não abrir de princípios bolorentos, como a discriminação da mulher e o celibato dos padres.

Ao fim e ao cabo, como poderia olhar para D. José Policarpo como um modelo, se ele é incompleto, por ser solteiro e nunca ter vivido com uma mulher. Porque viver com uma mulher é uma das coisas mais difíceis que um homem tem de aprender nesta vida.

A Igreja está mesmo a precisar de uma encíclica Rerum Novarum 2.0.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias 

Andreia Jotta

O que está a dar no franchising é, em primeiro lugar, o negócio de compra e venda de ouro. O que faz todo o sentido. O ouro é o valor em que historicamente todo o mundo se refugia em tempos de crise e de incerteza como aqueles em que vivemos. Quem tem ouro e precisa de dinheiro vai vendê-lo. Quem tem dinheiro para aplicar compra ouro. Este movimento levou a cotação do ouro a ultrapassar os 1500 dólares a onça e há analistas a prever que atinja os 2000 dólares.

Só em 2010, a rede Valores, um conceito português nascido há três anos em Braga, foi acrescentada por 60 novas lojas, abertas em regime de franchising, que fazem surf em cima da acelerada mudança de mãos do ouro das famílias.

Logo a seguir ao ouro, os cuidados estéticos são o sector mais procurado pelos portugueses que recorrem ao franchising para abrir um negócio. O que volta a fazer todo o sentido. Todos os economistas sabem que as vendas de baton disparam nos momentos de crise, porque as mulheres sentem que devem caprichar ainda mais no seu aspecto - e fica muito mais barato chamar a atenção para uns lábios atraentes do que comprar um vestido novo.

O negócio do franchising é dos que melhor tira partido da crise e por isso ostenta invejáveis indicadores de crescimento. No ano passado, o volume de negócios do sector (12.044 unidades, de 570 marcas) cresceu 450 milhões de euros, passando a valer 3,1% do PIB, e criou 3.600 novos empregos.

“Há cada vez mais pessoas a usarem o franchising para criarem o seu próprio emprego”, explica Andreia Jotta, 35 anos, directora do Instituto de Informação em Franchising (IIF), uma organização privada que além de recensear o sector e editar a revista Negócios e Franchising, também promove, anualmente, duas feiras e encontros, para atribuição de prémios e troca de experiências.

Licenciada em Relações Internacionais pela Autónoma de Lisboa,  Andreia passou pela Unesco, a Comissão Euro do Ministério das Finanças, e a formação e organização de conferências antes de aterrar no grupo francês IFE, que, entre outras coisas, edita a Teleculinária e há três anos comprou o Instituto de Informação em Franchising (IIF).

Andreia apareceu sem adornos de ouro (e usando um baton discreto) no Green Pepper o restaurante da José Malhoa que escolheu por duas razões: fica próximo da sede do IIF e é ovo-lacto-vegetariano.

“Não sou exactamente vegetariana. Como frango e, muito de vez em quando, vaca. Porco é que nunca”, explicou a directora do IIF, que acompanhou o buffet de quentes e frios com sumo de laranja e beterraba – e não tomou café.

O almoço serviu para perceber porque é que até o aumento de desemprego é benéfico para o desenvolvimento do franchising. Só no ano passado, cinco mil portugueses aproveitaram os incentivos ao auto-emprego, recebendo à cabeça todo o subsídio de desemprego a que tinham direito para abrirem um negócio.

“Nunca houve tanto interesse pelo franchising. Muitas pessoas recorrem a ele para minimizarem o risco, já que arrancam com um modelo de negócio já testado e beneficiam logo à partida de formação e apoio”, explica Andreia.

Além de ser mais rápido abrir um negócio obtendo um franchise, as estatísticas garantem que também está a aumentar as probabilidades de a coisa dar certo. De acordo com Andreia, a taxa de sucesso de um novo negócio em franchising varia entre os 80% e os 90%, percentagem que, nos novos negócios independentes, cai para o intervalo 20% a 40%.

Como o financiamento é muitas vezes o único entrave à abertura de um negócio, a tendência é para os donos das marcas (franchisadores) subirem o standard de exigência para conceder uma licença mas baixarem o nível do investimento inicial.

Para aspirar a abrir um McDonald’s é preciso ter 450 mil euros em carteira, mas com três mil euros já se pode tornar um Mr Electric (dono de uma área geográfica exclusiva para usar a marca e proceder a trabalhos de electricista e reparações de electrodomésticos e) e se tiver 3500 euros já pode ter uma loja Optimus Negócio.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

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Green Pepper

Avenida José Malhoa 148, Lisboa

2 Buffets de quentes e frios …13,90

4 Sumos de laranja e beterraba … 7,40

1 café expresso …0,75

Total … 29,45

 

Curiosidades

 

Se fosse abrir agora um negócio, Andreia escolheria um franchise tipo Comfort Keepers, por apostar num aumento da procura da prestação ao domicílio de cuidados de enfermagem, higiene pessoal e de alimentação a idosos

 

A maior rede de franchising  em Portugal é a Optivisão, seguida da ReMax e Multiópticas. O panorama varia de país para pais. Em Espanha, quem lidera são as redes de distribuição e restauração. Em França, cadeias de artigos de decoração para cozinha, como a Genevieve Lethu, têm um enorme impacto. E em Itália a liderança é dividida pelas lojas de iogurtes gelados e as de estética 

 

A Melom, um conceito formatado por Manuel Alvarez (que, com Beatriz Rubio, detém o master franchise para Portugal da ReMax), é um bom exemplo de um dos segmentos que está a conhecer uma procura mais explosiva – o de reparações e obras domésticas, de remodelação ou manutenção

Pedro Guimarães

 Quis ser polícia, lavou carros, distribuiu auto-colantes, foi caddy, carregou e descarregou camiões, montou palcos para os Rolling Stones e The Cure, criou uma software house. Até que tropeçou na rua num antigo colega da faculdade que tinha uma empresa chamada PacSis e precisava de alguém que lhe desse uma mão, durante duas ou três semanas, na preparação de uma exposição sobre a Apollo XIII…

 

A viagem atribulada e engraçada

de um patriota romântico

 

 

Nome:  Pedro Guimarães

Idade: 42 anos

O que faz: Director geral da PacSis

Formação: Uma cadeira atrasada do 4ª ano (Investigação Operacional) separa-o da licenciatura em Gestão, pelo ISEG

Família: Casado uma antiga colega de turma, com que começou, aos 18 anos, um namoro que durou mais de dez anos. Têm duas filhas

Casa: Andar em Alfragide, que se vê da varanda do escritório da PacSis

Carro:  A6 (carrinha), com cinco anos de idade

Telemóvel:  iPhone

Portátil:  Toshiba

Hóbis:  “O que é isso?” Adora muito de ler. “Livros são a prenda mais frequente que dou e recebo”. Lê de tudo, desde ficção histórica a não ficção, passando por técnicos, revistas, etc . “Não sou obcecado por nada”.Também gosta de ir ao cinema (parte importante do namoro com a mulher foi passado nas salas do Quarteto)   

Férias: A rotina consiste em duas a três semanas de férias de Verão, em Portugal, repartidas por vários locais – a praia da Rocha, no Algarve (onde os sogros têm casas), Baiões, S. Pedro do Sul (em casa dos pais)  e Reguengos, no Alentejo. “Nas férias gosto de passar os dias sem fazer nada”. No resto do ano fazem pontualmente escapadas pelo país, nos fins de semana

Regras de ouro: “Honestidade, fiabilidade, espírito de equipa, vontade de aprender e trabalhar. Não se pode ser preguiçoso, nem ficar mais ou menos satisfeito com o trabalho que fizemos. Cada um tem de se preocupar em ser o melhor que puder em tudo o que faz”

 

Aos três anos queria ser polícia. Já adolescente, adorava História, mas escolheu Económicas por não achar sexy a perspectiva de passar o resto da vida a dar aulas. Lavou carros, foi caddy, montou palcos para os Rolling Stones e passou pela publicidade, até aterrar na PacSis, empresa de marketing especializada em promoções e na gestão de vales de desconto.

Ao longo dos seus 42 anos de vida, Pedro cumpriu à risca o conselho de Agostinho da Silva: “Não faças planos para a vida para não estragares os planos que a vida tem para ti”.

“Sou um patriota romântico”, diz, num auto-retrato a la minuta, este empresário descomplexado (“Não me importo nada de ir fazer café, tirar fotocópias ou passar aqui uma noitada a ajudar os meus colegas”), acrescentando: “Vivemos num mundo difícil e exigente. Mas tem sido uma viagem engraçada”.

A viagem começou em Luanda, onde nasceu em 1968 (o ano em que começou a florescer a breve Primavera marcelista), filho de uma professora de liceu (dava Português, Inglês e Alemão) e de um geólogo que deixou o seu nome associado à estrada da Serra da Leba, uma das mais emblemáticas obras da engenharia portuguesa.

Retornada a Portugal, a família deitou âncora na Linha. Pedro fez o liceu entre Paço de Arcos e Oeiras, enquanto, à míngua de mesada, se ia desdobrando em diversos biscates.

“Sempre quis fazer coisas. Habituei-me a suportar as minhas despesas. Fiz de tudo, desde lavar carros a distribuir auto-colantes do posto médico, passando por carregar os sacos dos jogadores de golfe, na sua maioria estrangeiros. Ganhar um tanto por volta, recebia gorjetas e praticava o inglês”, conta.

A fluência em inglês foi-lhe muito útil na ocupação seguinte que consistiu em criar com uns amigos uma empresa especializada em fazer o back office dos mega-concertos das digressões de estrelas rock que tocaram o nosso país, entre o final dos anos 80 e os 90.

Descarregavam os camiões TIR, montavam o palco e voltavam a carregar tudo. Estrearam-se com Gary Moore, no Dramático de Cascais, e foram por adiante, sendo os homens por detrás da cortina das memoráveis actuações em Alvalade de Rolling Stones, The Cure, Iron Maiden, entre outros.

No entretanto, lá ia progredindo no curso, que achou engraçado. “Viviam-se os tempos esperançosos dos primeiros anos do governo Cavaco, cheios de orgulho por termos ultrapassado a Grécia. A escola estava a modernizar-se, ainda funcionava a dois tempos, mas a cultura dominante era que o seu papel não devia ser formar empregados mas sim empreendedores”, recorda.

Andava pelo 4º ano quando começou a trabalhar numa agência de publicidade e a negligenciar os estudos. Era claro que a vida planeava que ele fosse empreendedor. Em 1995, após ter passado três anos como sócio de uma software house, tropeçou na rua num antigo colega, que tinha uma empresa de serviços de marketing para o grande consumo, chamada PacSis, e precisava de alguém como ele para lhes dar uma mão na preparação de evento para um cliente (Omega) - uma exposição sobre a missão da Apollo XIII nas Amoreiras e CascaiShopping.

Foi o início de uma bela amizade empresarial. Pedro foi parar a PacSis para dar uma mão, durante duas ou três semanas. 16 anos depois ainda lá está, como sócio, e transformou a empresa, especializando-a na gestão de vales de desconto e em todo o tipo de promoções, ou, para ser mais preciso, “na gestão operacional das ferramentas de marketing promocional e directo”.

Dar palha ao animal

É muito pouco variada a paleta de preferências alimentares do meu filho João, que vai fazer 11 anos. Por ele, só comia McDonald’s, Pizza Hutt, salsichas com batatas fritas, porco preto com feijão e arroz, ovos estrelados e nachos. Pouco mais. Verduras ou peixe? Começa logo a resmungar só de ouvir falar deles.

Quase todas as crianças são assim. Compete-nos educá-las para terem uma dieta saudável, nunca desistindo de as desafiar a experimentarem novos sabores. Ao fim e ao cabo, antes de meter pela primeira vez à boca nachos com guacamole (e extra queijo), o João nunca poderia saber que ia adorar este clássico da cozinha tex-mex.

É  claro que dá muito trabalho estar sempre a tentar convencer a generalidade da pessoas, sejam crianças ou adultos, a darem uma oportunidade ao novo, desobedecerem à rotina e a não fugirem da diferença.

Um crítico musical (cujo nome lamentavelmente não fixei) deu recentemente um exemplo luminoso dos malefícios do conservadorismo ao escrever que as obras de Mahler começaram sempre por ser mal recebidas, o que era um bom sinal porque o público apenas gosta do que já gostou e só quer o que já quis.

Basta andar pela rua e olhar para a cor dos carros (98,9% são cinzentos, brancos ou pretos) para tirar a prova dos nove deste espírito de rebanho, a que alguns chamam de moda e que, só para citar mais um exemplo, levou 78,9% das mulheres (estimativa conservadora) a, de um momento, passarem a usar as calças dentro das botas e a pintarem as unhas.

“Dar palha ao animal” é a expressão que sintetiza esta atitude conservadora, que é a regra número 1 do manual de sobrevivência da multidão de yesmen e yeswomen que povoa as empresas. Se o chefe quer assim, faz-se assim. Se a coisa der para o torto, a culpa é dele. Para quê perder tempo e arranjar chatices a contrariá-lo e explicar-lhe o nosso ponto de vista?

O drama das democracias é que o conceito de “dar palha ao animal”, de dar às pessoas o que elas gostam, mesmo que achemos que elas estão erradas, passou a fazer parte do catecismo político-partidário.

A incompetência dos políticos gerou a vitória da economia e levou os chefes partidários a adoptarem a gramática empresarial e travestirem-se em marketeiros. O eleitor foi transformado em cliente, que tem sempre razão. Ideias e convicções? Isso não interessa para nada. O que importa é dizer-nos o que as sondagens e focus group garantem que nós queremos ouvir. O lucro são os votos. Para ganharem a 5 de Junho, Sócrates e Passos vão a dar-nos fardos da palha de que acham que gostamos.

É triste concluir que Vítor Bento tem razão quando disse que “quem governa bem não ganha eleições”.  É triste ser tratado como consumidor – e não como cidadão.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada o Diário de Notícias

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