A culpa é toda do Paulo Macedo
Nunca fui muito de doces. A minha perdição são os queijos e os presuntos, mas tenho-me forçado a disciplinar o seu consumo.
Um S. Jorge picante, um Manchego muito curado e um Parmesão apimentado constituem a base da minha tábua de queijos. Guardo o Serra para o Natal. É o mais maravilhoso dos queijos, mas cada colherada equivale a um chuto de colesterol administrado directamente na veia. E só compro Roquefort quando me oferecem uam botelha de vinho que precisa dele como companhia.
Tenho-me inibido de levar para casa presuntos e salpicões, mas, caramba, um homem não é de ferro, e por isso não resisto a tentaçôes como a que me foi feita, esta semana, pelo Pedro do Solar dos Presuntos que me pôs à frente um prato de pata negra verdadeiramente extra-terrestre.
É por estas e por outras que compreendo perfeitamente o alcance da decisão de Ulisses em se amarrar ao mastro para evitar ser vítima do sedutor canto das sereias. Só mesmo com as mãos amarradas eu resitiria à sedução das finas fatias de presunto.
Os pecados do queijo e do presunto já teriam atirado para patamares preocupantes os meus niveis de colesterol, se não se desse o caso de eu tomar diariamente um comprimido de pravastatina.
Reconheço que este regime de tomar o antidoto a seguir a ingerir o veneno não é o mais recomendável.
Seria muito mais saudável reduzir à mozarela fresca com azeite, rodelas de tomate e oregãos o meu apetite por queijo. E ignorar olimpicamente o pata negra, preferindo concentrar as atenções no polvo à galega - ou nos pimentos em azeite recheados com barriga de atum, produzidos pelo Rui_Madeira . Mas eu não sou o único a optar pela solução fácil e preguiçosa para atacar os problemas.
Quando tomou posse, este Governo tinha em cima da mesa o problema sério do défice excessivo. O_Estado gastava mais dinheiro do que o que recebia - para além dos 3% da tolerãncia máxima que Bruxelas fixou para quem quer fazer parte do clube euro.
Sob a batuta de Ferreira Leite, a gerência anterior foi contornando ardilosamente a questão. Compunha as contas vendendo activos. Bruxelas fechava os olhos, mas era batota e não se tratava de uma solução de futuro porque, mais tarde ou mais cedo, a familia deixaria de ter jóias para vender.
A solução de Sócrates é mais engenhosa. Tinha duas alternativas: cortar na despesa ou aumentar as receitas. Apostou nesta última e ganhou. A máquina de cobrança fiscal, dirigida por Paulo Macedo, extorquiu aos contribuintes o dinheiro necessário para trazer o défice abaixo dos 3% e assim o Estado pôde continuara gastar como dantes.
O aumento extraordinário da receitas dos impostos foi a pravastatina de um Estado gordo que se mantém anafado, a comer queijo, presunto e salpicão.
O problema é que não se pode tirar sangue das pedras e os contribuintes estão exangues. O regime de terror fiscal já rapou o fundo do tacho. Agora o Estado tem de começar a fazer dieta - a gastar menos. Já o devia ter começado a fazer há muitos anos . E se não o fez a culpa foi da eficácia do Paulo Macedo.|
Jorge Fiel
Esta crónica foi publicada no DN