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Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

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A operária que puxou pela manga de Pinho

Em Abril, Manuel Pinho estava de visita a uma corticeira de Aveiro quando uma operária lhe puxou pela manga e pediu: “Salve o nosso patrão, senhor ministro. Se o salvar a ele, salva os nossos empregos”.

Apesar de ter raízes familiares em Espinho, Pinho ficou de boca aberta. Como está mais habituado a visitar as grandes empresas da cintura industrial de Lisboa, ainda não reparara que nas PME nortenhas o velho conceito marxista de luta de classes foi substituído pela colaboração no duro combate pela sobrevivência.

Com o PIB e as exportações em queda livre, e o desemprego a galopar, a oposição clássica entre patrões e empregados deu lugar a uma nova dicotomia – entre empregados e desempregados.

Mesmo a tradicional tensão entre trabalhadores a prazo (que podem ser despedidos sem pagamento de indemnização) e do quadro foi atenuada pela chuva torrencial de falências que se adivinham.

A aristocracia operária, de que a Auto Europa é o expoente, faz mal em olhar com desdém e sobranceria para o sábio desabafo da operária corticeira. Na esmagadora maioria das PME, que são 99% do nosso tecido industrial, já toda a gente entendeu que patrões e operários estão no mesmo barco e devem unir esforços para evitar que ele se afunde.

Em Outubro de 2006 (ainda as celebridades pagavam exorbitâncias para serem apresentadas a Madoff e o Lehman era uma vaca sagrada e admirada urbi et orbi), os dirigentes do poderoso sindicato IG Metall já tinham percebido o fim da luta de classes e aceitaram aumentar a semana de trabalho, sem pagamento extra, contra a garantia da administração da Volkswagen de manter, até 2011, os 100 mil postos de trabalho na Alemanha e fazer novos investimentos no país – assinando a certidão de óbito do “operários de todo o Mundo uni-vos”.

Mais recentemente, os trabalhadores da FedEx, HP e Saks Fith Avenue (só para citar três exemplos), aceitaram reduzir os salários para ajudar as suas empresas a tentar manter a cabeça fora de água.

O recurso ao apelo à generosidade dos trabalhadores já desembarcou em Portugal. Com a perspectiva de fechar o ano com um prejuízo superior a seis milhões de euros, o Público pediu aos seus colaboradores que aceitassem reduzir o salário.

Participar no esforço de sobrevivência da empresa em que trabalhamos é um acto de coragem e lucidez que tem de ser elogiado. Mais vale perder 200 euros por mês do que o salário de 2000 euros todos os meses.

Mas para os apelos à solidariedade serem bem sucedidos, o exemplo de sacrifício tem de vir de cima. Ninguém ouvirá um apelo à redução do ordenado vindo de dirigentes que acabam de trocar de carro e de receber suculentos prémios.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

Chora não supera Sylvia na arte do suicidio

Auto-retrato de Sylvia Plath em 1951, quando tinha 18 anos

 

Morrer

é uma arte, como outra coisa qualquer

e eu executo-a excepcionalmente bem

Sylvia Plath

 

Sylvia Plath suicidou-se a 11 de Fevereiro de 1963. Tinha 30 anos. Levantou-se da cama, preparou uma bandeja com o pequeno almoço  e colocou-a no quarto dos filhos. Depois dirigiu-se à cozinha, vedou as brechas, ligou o gás e meteu a cabeça no forno.

Há quem opte por sair desta vida de uma forma mais vulgar, dando um tiro na cabeça ou atirando-se da ponte abaixo  - nesta última modalidade sempre achei curioso que a esmagadora maioria dos suicidas mergulhem para jusante, encurtando assim a viagem até ao mar.

Há quem opte por uma morte mais lenta, como os fumadores compulsivos, os dependentes de drogas duras ou os hipertensos que teimam em manter elevados níveis de colesterol no sangue.

Os 3 038 trabalhadores da Autoeuropa escolheram uma solução intermédia, um suicídio a curto prazo, ao apoiarem a linha de intransigência negocial adoptada pela Comissão de Trabalhadores (CT).

A indústria automóvel já conheceu melhores dias. As pessoas não estão a comprar carros. As fábricas de automóveis estão a fechar a velocidade superior à da abertura de lojas de chineses. Gigantes como a GM estão à beira da falência.

Comprada pelo Governo com o nosso dinheiro, para ajudar a resolver a aguda crise que se fazia sentir na Península de Setúbal, a Autoeuropa não escapa a esta crise generalizada.

Como está a trabalhar 40% abaixo da sua capacidade instalada (este ano vai produzir 82 mil veículos, quando tem capacidade para fabricar 180 mil), a administração propôs uma reorganização, que contempla, entre outras coisas, laborar oito sábados por ano, nas alturas de pico de produção.

Sucede que a CT, liderada por um cavalheiro chamado António Chora, entende que só pode aceitar essa flexibilização se a administração pagar 18 horas pelas oito horas trabalhadas a cada sábado.

Indiferente ao facto de Bruxelas nos ter avisado que há 12 milhões de postos de trabalho em risco na indústria automóvel, a CT estica a corda, apesar de saber que a Volkswagen equaciona prescindir de algumas fábricas europeias e que está em cima da mesa a possibilidade da absorção da produção de Palmela pela unidade de Emden, na Alemanha.

Morrer é uma arte, como outra coisa qualquer. Mas Chora não a está a executar com originalidade. Limita-se a copiar o modelo da GM da Azambuja, que fechou as portas por causa da inflexibilidade dos seus trabalhadores. Só tenho pena que esteja a arrastar no seu suicídio mais 6.910 trabalhadores, cujo emprego depende indirectamente da Autoeuropa e que não foram ouvidos nem achados neste caso.

Jorge Fiel

www.lavandaria.blogs.sapo.pt

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

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