O PSI 20 é que conta, o resto é paisagem
Tenho uma enorme simpatia pelos burros. Não exactamente pelos meus concidadãos desprovidos de inteligência, mas pelos animais propriamente ditos. Gosto de os ouvir zurrar e do seu aspecto pachorrento.
Persistente, trabalhador e capaz de se adaptar a meios adversos, o burro está pouco conceituado em Portugal, mas nos Estados Unidos é o símbolo dos Democratas, sendo corrente, nos estados por eles governados, ver nos vidros dos carros um autocolante com a imagem de um burro montado num elefante, o animal que representa os Republicanos.
Sei de alguns algarvios que não têm nada de burros e vivem às custas do burro, que entre nós é um animal subsidiado. O que o Estado português paga anualmente ao dono, chega para o alimentar, sobrando ainda um pequeno lucro que é engordado no Verão, através da venda a turistas alemães de passeios de burro na Costa Vicentina.
Vem esta algaraviada a propósito de uma folha A4 policopiada, que nos anos 70 estava afixada um pouco por toda a parte, de mercearias a repartições públicas, em que a frase tese “Cooperação? Até os burros compreendem” era demonstrada com auxílio de uma banda desenhada em que dois burros, atados um ao outro, percebiam que, se cada um puxasse para o seu lado, não iriam a lado nenhum.
Em Paredes, algures no coração da região mais jovem do país (Vale do Sousa) onde está 80% da indústria de mobiliário, um empresário chamado António Augusto Rocha em boa hora descobriu uma alternativa à luta inglória para ter preços para fornecer a Ikea e especializou a sua Móveis Viriato num nicho de mercado: a indústria hoteleira. Vende primeiro e depois fabrica soluções personalizadas aos cerca de 50 hotéis cinco estrelas de cadeias como a Meridien, Hilton, Radisson, Pestana, Renaissance ou Club Med que, em média, equipa todos os anos.
Logo a abrir este 2010, António Rocha deu-nos a boa notícia da constituição da hi.Global, empresa em que estão associadas oito fabricantes portugueses. A ideia é que os hotéis a quem a Moveis Viriato fornece camas, cadeiras, armários, candeeiros, cortinados e candeeiros passem a adquirir uma solução local portuguesa, incluindo alcatifas da Lusotufo, revestimentos cerâmicos da Recer, torneiras e fechaduras da Cifial, revestimentos de cortiça da Amorim, louça de porcelana da Costa Verde, têxteis lar da Lasa e colchões da Molaflex.
Nenhuma destas empresas é visita frequente das páginas da imprensa económica, que se deixa encandear pelas EDP, GALP, PT e bancos, convencida de que a economia portuguesa é o PSI 20 e o resto é paisagem. Já agora, e por falar em burros, cooperação e grandes empresas, alguém é capaz de me explicar direitinho por que é que a Zon e a Soanecom ainda não fundiram?
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias