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Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

António Pires de Lima

António Pires de Lima, 48 anos, presidente executivo da Unicer, fez-se homem no S. João de Brito, onde limpava todas as provas de fundo e corta-mato, correu nos kart e foi durante dois anos titular indiscutível no meio campo da selecção de futebol do colégio. Na Católica, foi fundador e atleta de uma equipa de futebol que fazia boa figura no campeonato universitário e por pouco não subiu à II Distrital da AF Lisboa.  “O desporto é uma forma de educação fantástica e uma escola de virtudes onde aprendemos a ganhar, a saber perder e a compreender a importância do trabalho em equipa”, afirma este gestor que até chegar às cervejas, passou pelos pensos Evax, tampões Tampax, papel higiénico Scottex, embalagens Tetra Pak e sumos Compal

 

O futuro de António Pires de Lima como futebolista ficou seriamente comprometido naquele dia em que a equipa da Católica foi à Musgueira derrotar os Águias por 1-0.

O jogo era decisivo para a subida à II Distrital da Associação de Futebol de Lisboa, e os adeptos locais não encararam bem que os betinhos da Católica, com um equipamento todo naice à Ajax (só que a barra vertical no meio da camisola era azul e não vermelha), tivessem a ousadia de ir ganhar ao seu campo.

O caldo entornou-se quando os universitários fizeram o golo, que o árbitro, insuspeito de caseirismo, validou, apontando para o centro do terreno. Levou logo com uma pedrada, que o deixou duas semanas de baixa, e o jogo quedou-se por ali.

Ao verem as coisas mal paradas, os jogadores da Católica rapidamente se refugiaram na casa de banho, onde permaneceram trancados - e sitiados pelos adeptos em fúria do Recreativo Águias da Musgueira - até à chegada do contingente da PSP que os resgatou.

Apesar de ter concluído num brilhante 2º lugar a época de estreia no Distrital da AF de Lisboa, a Católica descontinuou a sua participação nesta prova e concentrou os esforços no campeonato universitário de futebol, bem mais pacífico e onde o seu onze também fazia boa figura.

“Os jogos do Distrital, disputados em campo pelado e com o público sempre muito hostil, eram muito violentos. Os adversários davam muito cacetada e nós estávamos sempre lesionados porque não fazíamos o aquecimento como devia ser. Mas foi uma experiência engraçada”, diz António, em jeito de balanço da época em que andou pela Liga dos Últimos.

Ser futebolista do Sporting foi o primeiro e mais consistente sonho de juventude do presidente executivo da Unicer, ambição que não era incentivada pelo pai, homónimo, um advogado que chegaria a bastonário.

António nasceu a 7 de Abril de 1962, numa família conservadora e tradicional, em que, apesar do avô paterno ser director geral do Ministério do Interior, o pai não escapou a ser mobilizado por três vezes para o Ultramar, onde serviu no exército como capitão miliciano. Com quatro anos apenas, teve o baptismo do ar, ao embarcar com a mãe, na Portela, num avião da TAP com destino a Luanda, para se juntar ao pai que partira três meses antes para cumprir a sua terceira e última comissão.

“As minhas primeiras memórias – os cheiros, as imagens, as casas - são de Luanda. No mês passado, fui em trabalho a Angola e senti alguma nostalgia desses tempos quando passei junto à casa onde vivemos, no bairro de Alvalade, e relembrei as idas à escola e os meus primeiros passeios de bicicleta”, conta.

Em 1968, com seis anos, regressou a Lisboa e ao 4º esqº do nº 15 da rua Padre António Vieira, onde moraria até aos 22 anos – e que agora é habitado por Maria José Ritta e Jorge Sampaio, que compraram o andar aos pais dele (na altura em que ele miúdo moravam no rés-do-chão direito), onde são vizinhos do ex-ministro Correia de Campos, que reside no 4º dtº.

Os jesuítas encarregaram-se da sua formação, cultural e desportiva, durante os onze anos seguintes. Entre 1968 e 1979 fez a primária e o secundário no Colégio de S. João de Brito, um período marcante na sua vida.

Na altura, os terrenos do colégio estendiam-se até à Alameda das Linhas de Torres e incluíam uma pista de kart, gerida pelo padre Ferreira da Silva, que arranjava os karts e organizava corridas, em que António participou activamente, até à 4ª classe, sem resultados por aí além.

“Os motores nunca foram a minha especialidade”, confessa António, cujas capacidades motores o habilitavam a distinguir-se noutras modalidades, como o atletismo ou o futebol.  

Como tinha a mania das corridas - ao ponto de dispensar os serviços da Carris nas suas deslocações casa-colégio –, foi acumulando uma resistência notável que lhe permitiu limpar todas as provas de corta-mato e fundo, não só as internas, mas também as competições da Festa dos Alunos que contavam com a participação de atletas externos.

No futebol, começou logo a jogar na primeira classe, onde desde logo se tornou o delegado da turma para efeitos desportivos, organizando campeonatos e jogos com equipas de fora, como do Colégio Militar, do Valssassina ou até das camadas jovens do Sporting (“levávamos sempre grandes tareias”, recorda). Nos dois últimos anos no S. João de Brito, foi titular da selecção do colégio, alinhando a médio centro (posição para que recuou depois de ter sido avançado durante os quatro anos da primária), numa equipa orientada pelo padre Alberto, que teve o imenso prazer de rever este ano, no camarote do Sporting, após longos anos sem contacto,

Esta intensa actividade desportiva proporcionada pelas excelentes instalações desportivas do S. João de Brito, ajudavam a queimar os excessos de adrenalina acumulada num colégio cuja frequência estava vedada.

“É uma grande maldade educar jovens num ambiente exclusivamente masculino”, declara, antes de gracejar que Deus o compensou por isso, já que vive rodeado de mulheres: tem seis em casa (a mulher e cinco filhas), já não contando com a empregada - e duas afilhadas.

Além de estudar e praticar todo o tipo de desporto (desde os karts até ao futebol, passando pelo atletismo, caricas, basquetebol, etc), António ainda arranjou tempo no colégio para se iniciar na política, conquistando a direcção da Associação de Estudantes com uma lista feita com Paulo Portas, seu amigo e colega de turma desde a 1ª classe, que naqueles primórdios da sua juventude ainda era militante da JSD.

Hesitou quanto ao curso a seguir. Sabia o que não queria (continuar a tradição familiar e ir para Direito) mas não tinha certezas sobre o que queria, para além de ser um “um profissional bom”. Ainda lhe passou pela cabeça ir para Engenharia, mas depois, por exclusão de partes, optou por Economia.

Na Católica, onde apanhou pela frente um verdadeiro Dream Team de professores (Alfredo de Sousa, Cavaco Silva, os manos Pinto Barbosa, António Borges, João César das Neves, entre outros), começou por experimentar algumas dificuldades (o curso era demasiado conceptual para o seu gosto) até ter descoberto a vocação ao fazer umas cadeiras do curso de Gestão ligadas ao Marketing.

O curso de Economia não foi a única coisa que estranhou na Católica, onde, ao contrário do que sucedia no S. João de Brito, havia raparigas com fartura- mas não havia espaços dedicados à prática desportiva. Logo tratou de resolver o problema. Com a ajuda de colegas como Rui Horta e Costa (que viria a ser CFO da EDP), Paulo Pereira (“uma defesa central bruto como as casas”, que trabalha num banco de investimento), João Queimado (que posteriormente trocaria o futebol pelo rugby) e Carlos Mota (que se tornaria CEO das Carnes Nobre), montou a equipa de futebol da Católica e estabeleceu um protocolo para usarem o Estádio Universitário.

Além do futebol de onze – que disputou o campeonato universitário (“Classificava-nos entre o 2º e o 3º lugar. Quem ganhava sempre era o Técnico que tinha uma equipa muito boa”) e teve a passagem acidentada pela III Distrital já aqui referida -, António ainda alinhava regularmente na equipa de futebol de salão dos alunos, que aplicava grandes tareias à dos assistentes, onde jogavam António Mexia e Viana Baptista.

A paixão assolapada pelo Sporting, tolerada pelo pai, foi alimentada desde a infância pelo tio Zé, um empresário que vinha da Parede no seu Mini e que o ia buscar para ambos sofreram pelos leões no velho José de Alvalade, onde ele coleccionou alegrias e tristezas naquele tempo em que o seu clube ganhava um campeonato de quatro em quatro anos – e o Benfica arrematava os três que ficavam neste intervalo.

Yazalde foi um dos jogadores que mais lhe encheu as medidas, mas recita dum fôlego outros ídolos da sua adolescência: Damas, Pedro Gomes, Zé Carlos, Laranjeira, Baltasar, Dinis, Keita, Jordão, Manuel Fernandes. E Peres era indubitavelmente o melhor na posição em que alinhava (médio direito) nos gloriosos tempos da Católica: “O Fraguito, que veio do Boavista, também era muito bom mas as lesões encurtaram-lhe a carreira”.

Mas Carlos Lopes, vencedor olímpico da Maratona de Los Angeles, em 1984, foi sem dúvida o herói maior para ele, que se fartara de ganhar provas de fundo no S. João de Brito e estava na altura expatriado em Barcelona, onde fazia um MBA com patrocínio paterno. Como era tarado pelo Sporting, devorava a Bola, apesar de a receber com três dias de atraso. E o pai estava obrigado a ligar-lhe no final dos jogos para informá-lo dos resultados do seu Sporting – foi assim que soube dos memoráveis 7-1 aplicados ao Benfica.

Já de volta à pátria, chorou como uma Madalena no final do jogo em que Carlos Queirós deixou fugir o título ao ser derrotado por 6-3 com o Benfica. E, por muitos anos que viva, nunca mais se irá esquecer da tragédia leonina em que, numa semana, no ano em que o clube comemorava o seu centenário, perderam o título para o Benfica, a final da Taça UEFA, em Alvalade, contra o CSKA de Moscovo, e o apuramento para a Champions num jogo contra o Nacional.

Reconhece que teve alguma dificuldade em explicar ao avô que o seu primeiro emrpego, na Procter & Gamble, consistia em vender pensos higiénicos Evax, tampões Tampax e fraldas Dodot. Depois de três anos nesta multinacional, saltou para outra, arrancando, quase a partir do zero, com a operação portuguesa da Scottex e rapidamente abocanhou um quarto do mercado nacional de papel higiénico.

A Tetra Pak (92-93) foi a última escala no seu périplo por multinacionais, antes de decidir que criaria raízes em Portugal, cobrindo-se de glória na Compal/Nutrinveste, onde numa dúzia de anos logrou multiplicar os meiso libertos por 16.

“O desporto é uma forma de educação fantástica, que nos deixa preparação física para o resto da vida, e uma escola de virtudes, onde aprendemos a ganhar, a saber perder e a compreender a importância do trabalho em equipa. Foi uma óptima escola para a minha formação como gestor”, remata António Pires de Lima, que deixou de jogar futebol quando a dor da lesão superou o prazer da diversão e que agora vai umas duas vezes por semana ao ginásio, onde um personal trainer o ajuda a atenuar os efeitos de uma hérnia discal, e não passa um fim-de-semana sem jogar golfe (handicap 15), de manhãzinha cedo, no Estoril: “É um prazer enorme. Quando estou a jogar, desligo por completo das minhas preocupações profissionais e políticas. É o anti-stress total”.

Jorge Fiel

Esta matéria foi publicada hoje em O Jogo

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