Francisco Albariño Horta
Francisco Albariño Horta, 31 anos, é o director delegado para Portugal da X-TB, uma broker online com base em Varsóvia que se publicita nos monolugares de Fórmula 1 da McLaren. Antigo campeão nacional de vela, em Optimist, com duas participações em Europeus de Laser, foi sem motor que ele aprendeu a desembrulhar-se no mar encapelado dos mercados financeiros, evitando andar à deriva e navegando aos ziguezagues até encontrar o rumo certo. “A vida é uma sucessão de regatas duras. O mar, com ondas grandes e ventos fortes é como os mercados”, afirma este financeiro com uma costela galega, que passou pelo bancos Best e Carregosa e diz que a vela é como um jogo de xadrez, só que com parte física
O drama dele foi a falta de peso. Francisco tinha 18 anos e pesava 72 quilos. O ideal era que andasse na casa dos 80 quilos – até 85 kg estaria bem. Ser leve demais afastou-o de uma boa classificação nos Europeus de Laser, que em 1997 foram disputados ao largo de Cascais, com muito vento. “Pesava pouco para o barco. O corpo serve de alavanca para o barco andar a direito contra o vento, que é onde se decidem as regatas”, explica, simulando com o corpo o movimento, o director para Portugal da broker online X-TB, que acaba de se instalar no nosso país.
Francisco Albariño Horta, 31 anos, tem agora o peso que lhe fez falta quando era jovem velejador, um peso literal que agora lhe dará muito jeito para se desembrulhar no mar encapelado dos mercados financeiros, evitando andar à deriva e navegando aos ziguezages contra o vento até apanhar o rumo certo. A vida é uma sucessão de duras regatas.
O nome do meio denuncia-lhe a origem galega. A família do lado da mãe é originária de Ponteeareas. Os Albariños partiram de uma Galiza que era pobre para outras partes do Mundo em demanda de mais felicidade, que é como quem diz dinheiro e bem estar. Um ramo aventurou-se a atravessar o Atlântico rumo a sul, fixando-se no Chile. Francisco visita com alguma regularidade os primos e tios chilenos, cuja prosperidade pode ser medida pela diversidade dos seus negócios: entre outras coisas, são donos de quintas com cavalos, um colégio com dez mil alunos, uma fábrica de velas de cera, uma panificadora, bem como de extensas plantações de mirtilhos, amoras e framboesas.
O avô de Francisco viajou menos. Desceu das rias galegas até à de Aveiro, com uma filha de 12 anos, e deitou âncora na Costa Nova onde se estabeleceu com um hotel e interesses no comércio de mariscos. Quando ele nasceu, já a mãe completara o curso de Engenharia Electrónica em Coimbra, que usou para se tornar professora de Matemática.
Vivendo na Costa Nova, Francisco aprendeu ao mesmo tempo a arte de juntar letras, operar somas e subtracções e fazer um pequeno Optimist navegar. Tinha seis anos exactos quando recebeu um troféu, feito de lata de conservas de sardinha, que premiava a sua precoce estreia no mundo da vela.
O primeiro barco foi um Freitas, era assim que se chamavam o tipo de barco da classe Optimist, made in Portugal e totalmente manufacturado em madeira, que o acompanhou durante dois anos, até ser substituído por um outro, de fabrico dinamarquês. Ao sábados de manhã, quando os colegas iam para a catequese (ele frequentou um colégio de freiras), o jovem Francisco dirigia-se ao Clube de Vela da Costa Nova. Passava os fins de semana a velejar, em regime intenso, das dez até ao fim da tarde. Ao futebol nunca ligou muito, apesar de se declarar sportinguista, como o pai, obediência que manteve mesmo depois de ganhar consciência futebolística. “Não sou muito de ir ao estádio, mas lembro-me de gostar muito do Balakov e de ter visto na televisão o jogo em que perdemos o título ao sermos derrotados por 6-3 pelo Benfica”.
Toda a família se entusiasmava com as suas proezas marítimas. O avô galego não perdia uma regata. O padrasto (fotógrafo e cameraman profissional, que lhe meteu o vício da fotografia) incentivava-o. E quando ele, em 1991, completou 12 anos, o pai perdeu o amor a 300 e tal contos – e comprou-lhe um competitivo Winner dinamarquês, que o encheu de orgulho.
“O que é preciso para se ser bom na vela? Têm de se reunir um conjunto de factores físicos e mentais. Temos de ter abdominais e mãos fortes para aguentar e conseguir ter bons desempenhos em regatas com ventos fortes. As mãos calejadas denunciam um velejador. Para estar em forma, eu corria regularmente e fazia ginásio. Depois há a parte mental e táctica. A vela é como um jogo de xadrez com parte física, em que temos de ter em atenção as probabilidades. E para além da meteorologia, também é muito importante a afinação do barco, muitas das vezes feita e corrigida em andamento”, explica.
A primeira grande e boa recordação que guarda dos tempos da vela, data dos 14 anos - foi a vitória, em 1993, no campeonato nacional Optimist, classe B, em Cascais. No ano seguinte, passou à classe A, e depois, quando completou 15 anos, mudou para um Laser e começou a treinar sozinho. Teve uma entrada auspiciosa nesta classe olímpica, onde logo se sagrou logo vice-campeão nacional júnior e conseguiu o apuramento para os campeonatos europeus disputados ao largo da ilha de Wight. Passar 15 dias no estrangeiro, a velejar ao lado dos melhores de Europa, foi um sonho tornado realidade para um miúdo de 17 anos apaixonado pela vela.
Em 1996, no Europeu de Laser, obteve uma classificação meritória (56º entre 140 participantes) que lhe deu o estatuto de alta competição, beneficio nada negligenciável para um estudante em idade de ir para a faculdade. “Podia entrar no curso que quisesse, Medicina de Lisboa, Economia do Porto, etc. Era só escolher”, conta. Acabou por não tirar partido desta prerrogativa. Desde o 9º ano que tinha a ideia de fazer Economia, porque lhe interessavam os mercados. Quando acabou o secundário, feito num colégio em Albergaria, preferiu inscrever-se no curso de Economia da Católica, não tirando partido da boleia que a vela lhe podia dar. “Foi a qualidade do ensino que me levou a decidir-me pela Católica, onde achava que teria melhor acompanhamento”, conta.
Trocou Albergaria pelo Porto, instalando-se com uns amigos num apartamento na Fernão de Magalhães, onde vivia e estudava durante a semana. Quando chegava a sexta-feira ia até Campanhã apanhar o comboio para Aveiro, de onde só regressava ao domingo. O horário das viagens aos fim-de-semana flexibilizava-se sempre que a mãe lhe emprestava o carro dele – o seu primeiro automóvel, um Ford Focus, comprou-o em 2001.
O interesse precoce pelos mercados foi-se aguçando durante o curso, e manifestava-se ao aplicar na compra de acções os trocos que conseguia poupar da semanada. Recorda com agrado alguns investimentos, como o feito no papel da PT Multimédia; “ Lembro-me que dei a ordem de compra no BCP da Foz. Chegaram a subir 10% ao dia. Abriram a 11 euros e a cotação foi até aos 150 euros”.
A vela começou a ser sacrificada no altar dos estudos. Após o brilharete nos Europeus de 96, na costa inglesa, seguiu-se uma presença bem mais apagada nos Europeus de 97 em Cascais. A história podia ter sido outra se não tivesse falhado o apuramento para os Jogos Olímpicos de Atlanta (1996). Mas a verdade é assim que trocou a Costa Nova pelo Porto (e o Colégio em Albergaria pelo curso de Economia da Católica), a vela começou a perder importância na sua escala de prioridades. “Ainda tentei conciliar as duas coisas. Ao nível da competição, a vela já era bastante profissional. Não era com treino de fim-de-semana que conseguiria manter-me a um bom nível”, afirma Francisco que não deixou de andar no mar, começando a fazer windsurf – e depois (a partir de 2003) kitesurf.
Acabado o curso, em 2003, o serviço de carreiras da Católica encaminhou-o para o escritório no Porto do Banco Best (Grupo Espírito Santo), um 10º andar do edifício da Tranquilidade, ali bem ao lado do Palácio de Cristal, onde ganhou o seu primeiro dinheiro como personal advisor, enquanto desfrutava de uma bela vista sobre a cidade. Descreve como um choque a entrada na vida profissional. “Não tinha tempo para nada! Enquanto andamos na faculdade há sempre tempo para tudo”, constata.
Demorou-se dois anos e meio no Best, até o professor Ricardo Valente o desafiar a ser consultor financeiro na Personal Value, um family office que tinha 25 milhões de euros de activos sob gestão e que em 2008 foi incorporado no Banco Carregosa – e Francisco trocou a casa da Foz, com jardim à volta, da Personal Value, pela sala de corretagem da sede do Carregosa, num prédio da avenida da Boavista.
Estava posto em sossego no charme do Carregosa - com sofás Chesterfield coçados por mais de um século de uso e salas com as paredes pintadas -, quando recebeu, no final do mês de Maio, um telefonema de um head hunter a desinquietá-lo. Estaria ele interessado em abrir a operação em Portugal da X-Trade Broker, uma corretora online fundada em 2002 em Varsóvia que abreviou a razão social para X-TB a partir do momento em que passou a patrocinar a McLaren (o espaço publicitário num Fórmula 1 é tão raro como caro)?
Francisco gostou das cartas postas em cima da mesa e foi a jogo. O ser fluente em castelhano lubrificou as conversas mantidas em Madrid com o responsável da X-TB em Espanha, o que levou a mudar de emprego e de cidade (a broker tem a sua sede no 9º andar do Atrium Saldanha, onde ele tem um gabinete com vista para a avenida da República) e a investir as férias no trabalho de constituição da sociedade, obtendo os registos e autorizações necessárias para começar a operar neste Outono – a tempo de cumprir os objectivos fixados para este ano (20 mil transacções, no valor global de 7,5 milhões de euros).
“O objectivo final é sermos líderes. Mas ficaremos satisfeitos se chegarmos ao fim do próximo ano com uma carteira de dois mil clientes”, quantifica Francisco, que trocou os ventos da praia da Barra, na Costa Nova, pelas ondas do Guincho, em Cascais, onde testa os seus limites com fazendo kitesurf, um desporto mais radical e que proporciona mais emoção como a vela. “O mar com ondas grandes e ventos fortes é como os mercados”, conclui.
Jorge Fiel
Esta matéria foi hoje publicada em O Jogo