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Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

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A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

O homem que precisava de uma janela

Para ter mais luz em casa, queria abrir uma nova janela para a rua, mas como vivia num prédio no centro histórico não ousava fazê-lo sem a prévia (e improvável) autorização camarária.

Emboscado nesta variante imobiliária do humor boomerang de Groucho Marx (“não posso ser sócio de um clube que me aceite como sócio”), matutou no assunto, repetindo o mantra de quanto mais complexo é o problema, mais simples é a solução. O que é preciso é pensar fora do quadrado.

Há mais de 80 anos, Alves dos Reis, antes de se celebrizar por ter mandado imprimir notas falsas verdadeiras de 500 escudos, resolveu o problema da interrupção dos seus estudos, provocado pela falência do negócio de cangalheiro do pai, falsificando um diploma em Engenharia por um inexistente Politécnico de Oxford – que destruiu logo após ter obtido uma cópia autenticada (e por isso oficial) do documento num cartório de Sintra.

O homem que precisava de uma janela escreveu uma carta ao competente departamento camarário, solicitando autorização para entaipar uma janela (inexistente), argumentando que ela o incomodava sobremaneira.

A pretensão foi liminarmente indeferida, com ameaça de retaliações se ele ousasse tapar, à margem da lei, uma janela inexistente – e que por vias deste artifício passou a ter existência legal.

Esta história, que me foi contada como verídica pelo meu amigo Henrique (nome fictício), ilustra duas verdades de sangue: 1. O velho Einstein tinha razão quando avisou que a imaginação é ainda mais importante que o conhecimento; 2. O licenciamento de obras nos centros históricos rege-se por regulamentos paranoicamente cegos e imobilistas.

Vem esta história a propósito do Porto e Lisboa terem crescido como manchas de azeite e agora ser mais adequado reciclar. É preciso parar de construir e passar a reabilitar.

O país não se pode dar ao luxo de ter um milhão de habitações a precisarem de obras e 100 mil milhões de euros empatados em casas vazias. No coração do Porto há 15 mil edifícios a cair e na sua área metropolitana há 160 mil habitações à venda (contra 66 mil em 2007) e um stock de 800 mil m2 de escritórios, que ao ritmo actual demorarão 50 anos a escoar (em 2009 foram vendidos 16 mil m2). Do total de 55.350 edifícios existentes em Lisboa, 4.618 (8%) estão abandonados e 7.700 ameaçam ruir.

Em face a esta situação é impossível não achar estranho que, apesar das obras no Parque Escolar, a reabilitação pese menos de 7% no nosso mercado português de construção, quando em Espanha vale 29% e a média europeia é de 36%. Requalificar, reordenar e reabilitar são as soluções para desatar o nó complexo que nos impede de progredir.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

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