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Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

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O pecado mortal de Júlio Resende foi não ter deitado âncora em Lisboa

  Auto-retrato, 1944, 42 cm x 28 cm

 

 Ouça um bom conselho. Faça a si próprio o favor de se deixar mergulhar na formidável explosão de cores intensas (acentuada pela solene alvura das paredes), que experimentará ao visitar a exposição comemorativa dos 90 anos de mestre Júlio Resende, que está na mais bonita de todas as salas da Alfândega – a que recebeu a Cimeira Ibero-Americana que trouxe Fidel Castro ao Porto.

 

A entrada é de borla, o único preço que terá de pagar por esta imperdível experiência é a subida até ao último andar na severa escadaria de pedra deste edifício tão bem recuperado por Eduardo Souto de Moura. Mas apresse-se, porque domingo dia 4 de Novembro é o último dia. E que tal aproveitar o feriado?

 

Eu já gostava da obra de Júlio Resende, que me foi apresentada pelo meu amigo Germano Silva.  E apesar de não o conhecer pessoalmente ficarei a dever para sempre ao mestre o enorme favor de ter correspondido a um pedido meu para fazer uma capa de uma Revista do Expresso dedicada ao Porto.

 

Sabia que António Oliveira era um dos maiores, senão mesmo o maior, coleccionador de telas de Resende.

 

A minha amiga Augusta Bastos tem um óleo magnífico do mestre, uma pequena jóia que me habituei a admirar com detenção, sempre que a visito.

 

Apesar de instalado numa curva difícil, nunca desperdicei a hipótese de dar um mirada, ainda que de relance, ao painel Ribeira Negra.

 

E, recentemente, tive a oportunidade de olhar, ver, reparar e tocar no painel que Resende fez para a estação de metro do Bolhão.  

 

Em 2001, a Câmara de Matosinhos, por iniciativa do meu amigo Fernando Rocha (o colega bussolista, não o triste contador de pobres anedotas), facultou-me uma visão mais global da sua obra ao promover uma exposição retrospectiva, creio que comissariada por Armando Alves.

 

Mas foi ontem à tarde, na Alfândega, que me apercebi da importância nuclear da obra de Resende e fiquei sem perceber porque é que ele não ocupa o lugar cimeiro que lhe merece no panorama da artes no nosso pais.

 

É impossível não ficar deslumbrado com a maestria de Resende em harmonizar e homogeneizar nas suas telas a variada e rica gama de cores intensas da sua paleta.

 

Tentei perceber porque é que os panditas que ditam as modas na arte em Portugal teimam em injustiçar Resende. Por que é que ele está representado no Museu de Arte Moderna de S Paulo, na Bliblioteca Real Alberto I (Bruxelas) ou no Museu de Helsínquia – e nenhuma tela dele consta do espólio do Museu de Serralves.

 

Só encontrei duas explicações, uma estética e outra de roteiro, para explicar o criminoso desdém que o «mainstream» artístico dedica a um pintor que ao longo da sua longa vida recebeu praticamente todos os prémios que podia receber.

 

Resende terá cometido o pecado estético da permanência no figurativo, que apesar de muitas vezes roçar o abstraccionismo nunca deixa de ser figurativo.

«A minha pintura não deve ser considerada abstracta, pois parto sempre de objectos, de figuras, de formas, para extrair deles valores plásticos», explica o próprio.

 

Resende terá cometido o crime de continuar a viver no Porto - a Itaca onde regressa sempre após as muitas e longas viagens que se reflectem na sua obra – , de não se ter rendido a Lisboa, cidade que não faz parte do um roteiro geográfico onde constam paragens tão variadas como Paris, Alentejo, a floresta alemã, Brasil, Cabo Verde, Itália, Moçambique ou Goa.

 

Vivesse o mestre no Príncipe Real, e não em Gondomar, e a história seria, com certeza, diferente.

 

Tivesse o mestre juntado umas «Mulheres de Alfama» a uma obra vasta onde constam «Família Alentejana», «Vendedeiras de Roma» ou «Mulheres na Ribeira» e a história seria com certeza diferente.

 

O pecado mortal de Resende foi não ter deitado âncora em Lisboa.

 

Jorge Fiel

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