O misterioso caso do Nokia E 71 às escuras
Isto é um suponhamos. Numa 6.ª-feira, em Fevereiro de 2009, a Judite Sousa entra na Ensitel do Saldanha Residence e comunica a avaria na luz do ecrã do Nokia E71 que o Fernando Seara lhe comprou, nessa loja, há uma semana.
Sou capaz de jurar que as meninas da loja logo se prontificaram a trocar o telemóvel avariado e educadamente pediram desculpa pelo incómodo, pelo que o misterioso caso do Nokia E71 com o ecrã às escuras ficaria para todo o sempre encerrado.
Na vida real, a história foi diferente. Quem naquela 6.ª-feira entrou na loja Ensitel do Saldanha com o Nokia avariado foi a cara anónima da Maria João Nogueira (aka Jonas), pelo que o caso deu para o torto, com os seus efeitos a prolongarem-se até aos dias de hoje, tal como um mau cheiro que teima em não desaparecer.
O catálogo das desculpas (o problema do software, as lacunas do stock, o risco no ecrã, o risco na bateria, etc.), bem como a via sacra da Jonas, estão disponíveis para consulta (uma vista de olhos vale a pena) no blogue Jonasnuts.
O fundamental é que em Maio de 2009 um centro de arbitragem decidiu a favor da Ensitel e os danos na imagem desta empresa poderiam ter sido controlados se ela não tivesse caído na tentação de adornar a vitória ao, três dias antes do último Natal, accionar judicialmente Jonas, para a obrigar a apagar todos os posts que escrevera sobre o caso Nokia E71.
O céu das redes sociais abateu-se inclemente sobre a Ensitel, que demorou nove dias a perceber não lhe restar outro remédio senão bater em retirada, com o rabo entre as pernas, retirando a acção, reconhecendo publicamente a sua "postura inadequada", pedindo desculpas à cliente que transformou em inimiga e prometendo emendar-se.
Numa 6.ª-feira dia 13, a Ensitel passou três vezes debaixo de escadas, partiu dois espelhos e cruzou- -se com um gato preto, pelo que não pode queixar-se de azar por ter tropeçado numa cliente habituada a fazer valer os seus direitos (à diferença da maioria dos portugueses que se queixam muito mas reclamam pouco), e que, ainda por cima, coordena a comunidade de blogues do Sapo e é mais célebre e influente nas redes sociais do que a batata frita.
Orwell ensinou-nos que somos todos iguais, mas há uns que são mais iguais que outros. O caso Ensitel avisa-nos que nem todos aqueles que são mais iguais são portadores de uma cara famosa, arejada frequentemente nas televisões e revistas. Quantos dos mais de 40 mil empregados da Sonae serão capazes de identificar Margarida, a mulher de Belmiro? Por isso, e para evitar meter o pé na poça, recomenda-se a todos o regresso ao bom e velho princípio de que o cliente tem sempre razão.
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias