José Paulo Duarte
O feijão verde, a cenoura, o ovo, a couve flor e as batatas, ou seja todos os acompanhamentos da posta de pescada cozida que foi o almoço de José Paulo Duarte, tinham sido entregues nesse dia, pela manhãzinha, por uma das suas empresas (a Confraria da Horta), na cozinha do restaurante O Policia.
Se lhe falam em Paulo Duarte o mais provável é que a primeira coisa que lhe venha à cabeça sejam camiões e não os espargos ou as mais 200 variedades de produtos frescos que as 14 carrinhas da Confraria distribuem, todos os dias, ao romper da bela aurora, por hotéis, restaurantes, cafés e lares de toda a Grande Lisboa.
Já todos nos cruzamos na estrada com um dos 600 camiões da Paulo Duarte, a maior empresa portuguesa de transporte de alimentos e combustíveis - mais de 75% da sua frota é constituída por camiões cisternas.
Mas sucede que o quartel general da Transportes Paulo Duarte é em Torres Vedras, onde bate o coração do Oeste, a região que concentra cerca de 80% da produção nacional de frescos, pelo que se compreende que José Paulo Duarte, 55 anos, não tenha resistido à tentação de investir na produção e distribuição de produtos horto-frutícolas.
Além da Confraria da Horta, o grupo controla a Abrunhoeste, responsável por uma produção anual de mais de seis mil toneladas de fruta, essencialmente pêra rocha (4,7 mil toneladas), mas também ameixa (775 t), maçã (400 t) , pêssego, meloa e nectarinas.
“Temos óptimas condições naturais para a produção de horto-frutícolas. A laranja algarvia é deliciosa, enquanto que na maior parte das vezes a laranja espanhola é intragável. O problema é haver poucos agricultores empresários. Em 2009, as exportações do sector valeram 800 milhões de euros, mais 200 milhões que as de vinho. E a procura externa de fruta e produtos hortícolas portugueses não pára de crescer. Só nos últimos três meses, e para um único cliente alemão, transportámos 1500 camiões de batata, cenoura e cebola”, afirma José Paulo Duarte, que vai alargar em mais 90 hectares a sua área de produção.
Apesar do futuro próximo na nossa economia se apresentar carregado de nuvens, os negócios do grupo Paulo Duarte prosperam sob o céu tão azul que até parece acabado de lavar na máquina. A fruta toda vendida e no primeiro trimestre do ano o negócio dos transportes registou um crescimento de 20%, completamente à revelia do ciclo económico.
A falência de muitas pequenas empresas, com apenas um ou dois camiões, que baseavam a sua competitividade num preço baixo (e não acautelavam nos contratos uma revisão de preço em caso da subida do gasóleo) ajuda a perceber esta performance brutal da Transportes Paulo Duarte, que tem a sua blindagem à crise reforçada pelo facto de se ter especializado no transporte de bens de primeira necessidade (alimentação e combustíveis).
“Temos dezenas de camiões a andar 24 horas por dia durante os 365 dias do ano”, declara José Paulo, que durante a juventude foi ginasta e jogou hóquei em patins na Física de Torres Vedras, e começou a trabalhar na empresa fundada pelo pai, quando, com 24 anos, decidiu casar e pôr um ponto final a uma carreira universitária feita entre Agronomia (quatro anos) e Gestão de Empresas (dois).
Escolheu almoçarmos no Polícia, e não era preciso ser muito observador para reparar logo que é a cantina onde faz as suas refeições, quando está em Lisboa. Os empregados, que trata pelo nome, conhecem-lhe os hábitos. E a clientela habitual ou o cumprimenta ao longe ou vai mesmo à sua mesa dar duas de paleio.
“Desde pequeno que venho aqui com o meu pai. Dantes havia ali, junto ao restaurante, um posto de abastecimento da Sacor e os transportadores tinham o hábito de virem aqui almoçar”, conta, antes de atender um telefonema. Era um amigo (mas não cliente) que estava desesperado e precisava muito que ele lhe assegurasse um transporte. José Paulo pediu desculpa, mas não podia fazer-lhe esse favor. A sua frota, apesar de recentemente aumentada, só chega para as encomendas dos clientes habituais…
Jorge Fiel
Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias
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O Polícia
Avenida Conde Valbom 127
Pescada cozida …17,50
Garoupa grelhada … 21,00
Vinho da casa branco (Vinha das Servas) … 11,00
2 cafés … 2,40
Total … 51,90
Curiosidades
José Paulo Duarte pai (na foto) nasceu em 1918, numa família de agricultores abastados do Oeste. Como ficou órfão com 14 anos (o pai dele morreu tuberculoso), foi trabalhar como mecânico para ajudar a mãe a sustentar os seus sete irmãos. Depois de ter aproveitado a tropa (feita em Cascais) para tirar a carta, em 1946 comprou um camião Chevrolet e estabeleceu-se, fundando a Transportes Paulo Duarte. À sua morte, o filho homónimo sucedeu-lhe à frente do grupo, onde já trabalha a terceira geração – Gustavo e António, filhos de José Paulo Duarte filho, ambos internacionais de rugby
A maçã Royal Gala ultrapassou a Golden na preferência dos portugueses. Mas a fruta de eleição de José Paulo Duarte é a pêra rocha, que aprecia ao natural, cozida (sem açúcar à sobremesa) ou mesmo a substituir batatas ou arroz como acompanhamento: “Fatias fininhas de pêra rocha, salteadas em azeite e sal, ficam muito bem com um prato de porco”
A criação do mercado único europeu com a abertura das fronteiras tornou o transporte rodoviário imbatível relativamente à concorrência ferroviária. “Dantes, ficávamos um ou dois dias parados em Vilar Formoso. Agora fazemos Madrid-Lisboa em oito horas. E em 36 horas ponho os morangos de Odemira à porta do comprador inglês. Hoje em dia, as empresas não tem stock. O stock está no camião”, diz José Paulo Duarte