O fato de treino de Belmiro
Terá Manuel Braga da Cruz dimensionado que com o seu dress code afastaria da Católica Mark Zuckerberger, pois o genial inventor do Facebook não dispensava os chinelos de piscina?
A minha consideração pelo engenheiro Belmiro já era elevada, mas subiu uma data de pontos naquela tarde de um sábado de Verão, em 1990, no lanche que se seguiu a uma partida-exibição de Boris Becker numa quadra de ténis improvisada no Estádio do Bessa.
A organização era do falecido Banco Fonsecas & Burnay, à época presidido por Pedro Rebelo de Sousa, que tratou de juntar no evento a fina flor da sociedade e finança de Lisboa e do Porto.
Já não me recordo se o convite incluía ou não dress code, mas pelo sim, pelo não, optei por fardar-me com um blazer, na observância da regra número 1 da minha política de indumentária que se resume numa palavra (camuflagem) e consiste em usar roupa que não chame a atenção.
A opção pelo blazer foi acertadíssima. Os convidados do Rebelo de Sousa mais novo trajavam todos o casual semichique, do estilo: casaco azul, camisa às riscas ou pólo (preferencialmente Lacoste ou Ralph Lauren), calças de algodão (na altura as vermelhas estavam muito na moda) e mocassins ou sapatos de vela.
Apesar do seu colorido fato de treino ser era o único ruído naquela paisagem homogénea, Belmiro aguentou firme e até ao fim a função social lanche/beberete, de copo na mão e ao lado da doutora Margarida, numa inequívoca demonstração de atitude - não consigo arranjar outra palavra que reúna o amor-próprio, ego, confiança e segurança que exalam deste comportamento.
Confesso a minha cobardia. Se chegasse de jeans, camisa de fralda de fora e crocs a uma sala cheia de gente de fato e gravata, eu engrenava logo a marcha-atrás e fugia do local a sete pés.
Para não arranhar a ideia bastante lisonjeira que tenho de mim próprio, convenci-me de que esta atitude (era precisamente por a mesma palavra poder significar coisas diferentes que Barthes qualificou a linguagem como fascista) de procurar sempre confundir-me com a paisagem é a mais adequada à minha condição de jornalista - que por definição deve ser um observador e não o centro das atenções.
Os códigos de vestuário estão cada vez menos rígidos e quase toda a gente já percebeu que também nesta matéria é preciso afrouxar o nó da gravata - no sentido figurado mas também literal.
Menos regras, mais flexibilidade e muito bom senso devem ser o alfa e o ómega da nossa actuação no século XXI.
Ao desaconselhar os alunos de frequentarem as aulas de calções e havaianas, a Universidade Católica está a revelar-nos que ficou presa no tempo, algures em meados do século XX. Terá Manuel Braga da Cruz dimensionado que com o seu dress code teria afastado da Católica Mark Zuckerberger, o genial inventor do Facebook, que não dispensava uns chinelos de piscina.
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no Jornal de Notícias