Escola, Google e Facebook
Não podemos atribuir a um único facto a responsabilidade pelo desencadear de grandes acontecimentos. A I Guerra Mundial haveria de arranjar outro pretexto para deflagrar se a Mão Negra não tivesse assassinado o Franz Ferdinand em Sarajevo.
O curso de História não foi a minha primeira opção. Convencido de que me seria muito proveitoso conhecer os meandros do comportamento humano, inscrevi-me em Psicologia. Desisti ao fim de um ano.
A esta desistência não foi estranha a dificuldade sentida em copiar para o caderno as equações que o professor de Matemática rabiscava no quadro. Mas no momento da decisão também pesaram estar farto de passar fome em Lisboa (não havia Psicologia no Porto), as paredes e tectos das salas de aulas do ISPA estarem forradas com cartazes do MRPP, e um dos colegas com quem partilhava um apartamento na Flamenga ter provocado uma catástrofe de proporções bíblicas ao puxar o autoclismo de uma sanita entupida.
Quem estudou História ou é um curioso desta área não precisou de ver o Match Point, de Woody Allen (e a verificar a importância que o facto do anel não ter caído ao Tamisa acaba por ter no desfecho da história), para saber que a sorte existe.
Nunca fui professor porque, a meio do curso, apostei em ser jornalista. Mas não tenho a menor das dúvidas de que tive muita sorte em ter escolhido estudar História. Seria muito pior jornalista se na faculdade não tivesse aprendido a relacionar os factos políticos, económicos, sociais e culturais, a ler os sinais dos tempos e interpretar as movimentações numa comunidade.
Neste início de ano lectivo, em época de dramática contenção de custos, olhamos para a escola e não gostamos do que vemos.
Vemos que ao longo das últimas décadas o Estado gastou mais dinheiro, teve mais professores, menos alunos e mais insucesso escolar.
Os 100 mil chumbos no Básico, 17% de repetentes no Secundário e 46% que abandonam após o 12.º ano revelam um sistema doente - e dinheiro não é a solução para inverter os termos desta terrível equação.
A chave para tornar o ensino eficiente é perceber que as escolas estão a formar estudantes para profissões que ainda não existem. De acordo com o Labour Department dos EUA, as dez profissões mais procuradas no ano passado não eram conhecidas em 2004.
A escola não se pode limitar ao papel de mera transmissora de conhecimentos. Tem de ser capaz de fornecer aos alunos ferramentas e capacidades para durante a sua vida profissional resolverem problemas que nem sequer imaginamos com o auxílio de tecnologias ainda não inventadas.
Já repararam que quem acabou o curso no séc. XX não pôde usar iPad ou fazer pesquisas no Google e amigos no Facebook?
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no Jornal de Notícias