Um almoço com Durão no Tivoli
Durão Barroso ainda era secretário de Estado quando intercedeu junto do comissário Manuel Marín para que os PALOP pudessem beneficiar de um programa comunitário. O espanhol aceitou o empenho e disse: "Gosto de vocês. São como os italianos. Menos brilhantes, mas mais honestos".
O presidente da Comissão Europeia usou este episódio para responder à pergunta sobre como é que nós somos olhados na Europa, feita ontem durante um almocinho de duas horas, no Tivoli Lisboa, com 16 responsáveis de jornais, rádios e televisões.
Estava tudo impecável. Abrimos com carpaccio de novilho, acompanhado por Vinha Grande. A seguir, foi uma tranche de robalo com um branco alentejano. Antes do café, servido com "petits macarons", tivemos direito a uma espetada de frutos tropicais. Há vidas bonitas. A refeição foi boa, mas a conversa ainda melhor.
Não vou cometer inconfidências sobre o que foi dito à mesa, porque aceitámos que o almoço era em off, mas sinto que devo partilhar as impressões com que fiquei do pensamento e estado de espírito de Durão.
Fiquei satisfeito por ele não ser daqueles que olham para os dois lados antes de atravessar uma rua de sentido único. Pelo contrário.
Está optimista e crítico das cassandras e do "intelectual glamour of pessimism".
Está optimista, apesar de consciente de que a UE se encontra no pior momento da sua vida - ou caminha para a integração ou para a desintegração.
Acha que a esmagadora maioria dos estados-membros (Alemanha incluída) está empenhada em salvar o euro. Os avanços institucionais são a prova disso. A Comissão Europeia nunca teve tantos poderes. E o novo tratado está, em alguns aspectos, mais à frente que os EUA.
Atribui o pessimismo dominante ao controlo de 95% do mercado da informação pelos anglo--saxónicos (que não são entusiastas do euro). O resto vai atrás, contagiado. Gostei da análise. Em termos de comunicação, a Alemanha vale cem vezes menos que o Financial Times, Economist e Wall Street Journal juntos.
Sobre Portugal, fiquei com a ideia de que Bruxelas pensa o que diz em voz alta. Faz uma avaliação positiva, acha que o Governo está a esforçar--se por safar a coisa, mas que ainda nada está decidido - enquanto a Irlanda está a cair para o lado bom e a Grécia para o lado mau.
Pareceu-me que o grande medo de Durão é que a Grécia caia (estava com cara de tripla se a questão fosse um Totobola), não só pelos efeitos devastadores para os gregos, mas também pelo risco de contágio nos afectar - e as novas firewalls não serem ainda suficientemente fortes para nos proteger. Resta-nos a consolação de sermos mais honestos que os gregos, que quando vão ao hospital só são atendidos se levarem no bolso dinheiro vivo para pagar aos médicos e enfermeiros.
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no Jornal de Notícias
PS. Mantive-me fiel às minhas duas resoluções de Ano Novo. Comi devagar, ao ponto de ser admoestado pela Leonor Ribeiro (a jornalista que há uns bons dez anos faz de canivete suíço do Durão) por estar a empatar o repasto - e não abri a boca, pois não tinha nada de importante para dizer.