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Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Elvira Fortunato

E se, de repente, deixasse de ser preciso verificar os prazos de validade, porque a embalagem muda de cor para lhe dizer que o iogurte ou o medicamento já não estão em condições de serem consumidos?

E se a escolha da cor para as paredes lá de casa deixasse de ser sinónimo de discussões infindáveis, porque a qualquer momento pode carregar e substituir o frio creme da parede da sala por um ocre quente e tropical?

E se deixasse de haver conta da EDP, pois os vidros acumulam durante um dia energia suficiente para o consumo doméstico? E se as persianas e cortinas se tornarem obsoletas, porque com um simples toque controla a tonalidade (mais escuro ou mais claro) dos vidros e até pode usá-los como mostradores de informação ou ecrãs de tv?

Estas novas novidades que vão revolucionar o nosso dia a dia num futuro não muito longínquo, serão possíveis graças a invenções geniais saídas da cabeça de Elvira Fortunato, 44 anos, cientista e líder do Laboratório de Ciência de Materiais da Nova de Lisboa.

A Elvira mais famosa do Mundo (critério Google) escolheu almoçarmos no Barbas, que considera, sem espinhas, o melhor restaurante de peixe de toda a Margem Sul, onde ela faz o essencial da sua vida. Mora em Almada e o laboratório fica no Monte da Caparica. Só atravessa a ponte para apanhar o avião (para já…) e ir a Alvalade ver o Sporting (ela e o marido compram sempre a gamebox).

Garoupinhas. Ela ia com a ideia nas garoupinhas, mas não como não as havia, aceitamos a sugestão da casa de uma (divinal!) cataplana de cherne e gambas.

Como estava um fabuloso dia de praia, comemos na esplanada – o marido Rodrigo (cientista e inventor como ela) e a filha Catarina, 11 anos (que não tinha aulas nesse dia) optaram pela sala.

Elvira tornou-se um caso sério na comunidade científica internacional com a patente da electrónica invisível, que logo despertou a cobiça da Samsung, que vai usar em todos os mostradores (telemóveis, máquinas fotográficas, tv, etc) a invenção made in Caparica, que proporciona resoluções altíssimas.

O ano passado, foi aclamada como o Cristiano Ronaldo da electrónica mundial, quando o mundo se apercebeu das enormes potencialidades da sua invenção do transístor de papel – que estão a ser exaustivamente inventariadas pela Universidade do Texas.

Jornalistas e cientistas de todo o mundo entupiram-lhe o telemóvel nos dias seguintes à divulgação, a 21 de Julho de 2008, de que ela tinha conseguido substituir o silício pelo papel (mais barato e flexível) como suporte de um transístor. O reconhecimento foi instantâneo e Elvira ganhou uma bolsa de 2,25 milhões do European Research Council, uma distinção sem precedentes para o nosso país.

É muito excitante estar à conversa com uma pessoa genial, capaz de arranjar novas aplicações para materiais comuns. Durante as duas horas que durou o almoço, abrimos sucessivamente diversas janelas fomos minimizando, sem nunca as fechar.

Elvira transpira uma autoconfiança sã, desprovida de uma gota sequer de arrogância. Está bem com a vida, apesar de não calar algumas criticas ao lado lunar da alma portuguesa: “Faço aquilo que gosto e ainda me pagam por cima”.

Quando lhe perguntamos como resiste à tentação de emigrar, responde: “O dinheiro é importante, mas há coisas mais importantes na vida do que um bruto ordenado. A minha família não está à venda. Em que outro país podia estar a almoçar o que comemos hoje com esta vista?”.

A satisfação e orgulho que tem na sua equipa (30 cientistas, de várias disciplinas, dos quais 12 doutorados) é infinita: “É a melhor equipa do mundo. No meu laboratório não existe a palavra impossível”.

Mas não esconde que lhe custa que num país, com uma fileira de papel poderosa, empresas como a Portucel e a Renova tenham desperdiçado a fantástica oportunidade que lhes foi oferecida, de aproveitar a invenção do transístor de papel para fabricar produtos inovadores e de maior valor acrescentado que o papel higiénico ou de fotocópia. Mal souberam do assunto, os brasileiros da Suzano atravessaram logo o Atlântico a correr….

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

O Barbas

Praia do CDS, nº 13, Costa da Caparica

Ameijoas à Bolhão Pato

Cataplana de cherne com gambas

Bucelas Myrtus branco

Água Vitalis

2 cafés

O almoço foi oferecido pelo Barbas por cortesia “com a professora” que, apesar de sportinguista, é cliente da casa

O mistério dos oito minutos na maquilhagem

O cabelo tornou-se um bem escasso. O nariz é torto, ao ponto de só respirar de uma narina. Não perdia nada se as orelhas fossem mais pequenas. A cara dá a impressão de nunca ter sido barbeada. A barriga é três vezes mais volumosa que o necessário. As mangas ficam sempre muito curtas. Resumindo: tenho um sério problema de imagem. O que é grave, pois, ainda por cima, já não sou um rapaz novo.

Foi  por causa  do substancial debate que se seguiu à entrevista de Sócrates à Sic que fiz este duro exercício de auto-análise. Já agora, e a propósito da entrevista. Ainda estou para perceber como é que ninguém teve a genial ideia de perguntar a Sócrates se ele meteu um Xanax antes de ir conversar com a Ana Lourenço.

Sabemos que ele entrou na Sic às 20h34, com um ar cansado, e que às 20h42,  à saída da maquilhagem, já estava sorridente, com melhor aspecto, gel na cabeça, e “estranhamente mais calmo do que o costume”. O que se passou durante aqueles oito minutos na maquilhagem?

Apesar de ido à televisão com o mesmo fato azul-cinza e gravata vermelha que usara à tarde no parlamento, os comentadores concordam que a entrevista foi o momento fundador de um novo Sócrates, com uma imagem mais doce, simpática, contida e humilde.

Foi tal e qual como nos jogos de futebol, em que os comentadores preferem discutir a arbitragem ao jogo propriamente dito.  TGV, BPN, política fiscal e  BPP são pormenores para os comentadores políticos, que preferem gastar o tempo de antena a analisar os prós e contras da mudança de imagem. O sucesso desta operação parece ser mais importante do que a eficácia das medidas anti crise do governo.

O grave é que os eles têm razão. O sociólogo Jean-François Amadieu, que  estuda há 30 anos a interferência e influência do aspecto físico na vida social das pessoas, garante que na política, trabalho ou escola, a imagem é mais importante do que a competência quando se trata de conquistar votos, arranjar um bom emprego ou ter boas notas.

Daniel Hammermesh, da Universidade do Texas, concluiu, após um estudo de campo de dez anos, que o salário dos feios é 9% abaixo da média e que os bonitos ganham 5% acima.

Este mundo não está para os feios, velhos e gordos. Donde concluo que estou tramado  - e não sou o único.

Deste ponto de vista, para mim e para Manuela Ferreira Leite, uma pequena centelha de esperança foi acesa pela vitória nas europeias do Paulo Rangel, um rapaz que não é anoréctico nem tem pinta de basquetebolista.

Será mesmo verdade que quem o feio amo bonito lhe parece, que é como o povo resume a tese da subjectividade da beleza, que garante que ela está nos olhos de quem vê?

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no DN

Angelino Ferreira

Há lista, mas não vale a pena consultá-la. Preferimos os filetes de polvo (com arroz do mesmo) aos de pescada. E Angelino esteve certeiro na escolha do vinho, o Muralhas, um verde de Monção, fresco e pouco alcoólico, por isso adequado à refeição (almoço) e à comida.

Este economista de 55 anos começou a frequentar discretamente as colunas dos jornais quando, com 26 anos, reabriu a Bolsa do Porto, fechada no pós 25 de Abril, e fez na compra e venda de acções até que, aos 40 anos, achou chegada a  hora de rimar profissão com  paixão  e foi trabalhar para o FC Porto.

Aqui chegado, talvez valha a pena esclarecer que se registou uma mudança estrutural de orientação no Aleixo, celebrizado pelo confesso benfiquista Ramiro, a quem sucedeu o filho, homónimo e da mesma obediência clubística, que no entretanto montou a sua própria casa, deixando o restaurante de Campanhã a cargo do cunhado (portista de cachecol), irmã e mãe.

Empresarialização. Se tivéssemos que resumir numa só palavra o que Angelino tem feito na vida, o vocábulo certo seria este, com 17 caracteres, um comprimento quase finlandês.

Na bolsa, foi corretor a nível individual até, por duas vezes, empresarializar a actividade, evoluindo de broker para dealer ao ser o pivot da criação das financeiras de corretagem Socifa & Beta e Pars.

No futebol, ajudou, atrás da cortina, a empresarializar o FC Porto, constituindo a SAD e assumindo o comando directo das operações da construção e financiamento do Estádio do Dragão e do Centro de Estágio do Olival. Agora é o responsável pela parte comercial.

Aos 50 anos, achou por bem casar trabalho e família e iniciou a empresarialização da actividade cinematográfica ao constitui a Yellow Entertainement, que no dia a dia é dirigida pela sua filha Soraia.

A Yellow estreou no início do mês, em 26 salas, a sua primeira longa metragem, Star Crossed, um remake do drama shakesperiano Romeu e Julieta, tendo o Porto como pano de fundo.

Soraia, 29 anos, a mais velha do casal de filhos de Angelino (Bruno fez Design de Comunicação e trabalha em Londres), sempre foi fanática por cinema (era a melhor cliente do multiplex de 20 cinemas do Arrábida Shopping) e por isso, após acabar o curso de Gestão,  na Católica, foi para Nova Iorque e Los Angeles (LA) aprender a gerir produção de cinema.

Star Crossed é o seu primeiro filho. A ideia nasceu, num jantar de amigos em LA no final de 2005, onde todos concordaram que Porto e futebol eram dois bons ingredientes para vender um filme.

A  rodagem arrancou no Porto, em Agosto de 2007. Durou as seis semanas previstas, envolvendo 80 pessoas, uma equipa multinacional com quatro actores estrangeiros, realizador inglês e um director de fotografia israelita.

Também não houve derrapagem no orçamento de 2,25 milhões de euros, reunidos por Angelino na sua qualidade de produtor executivo, verba onde  não entra sequer um cêntimo de subsídios públicos  - e só será recuperada se o filme conseguir fazer uma carreira internacional.

 “O mercado português não existe. É muito curto. O cinema em Portugal vale 70 milhões de euros/ano, o equivalente a cerca 15 milhões. O mercado interno apenas pode contribuir para recuperar 5% ou 15% do orçamento. Nós temos um problema de dimensão”, explica Angelino. No nosso país, em Portugal, além bilheteira e das receitas de product placement (Carlsberg e Vodafone), tem um contrato com a Zon Lusomundo e a Sic (para exibição em free TV).

Star Crossed é o cartão de visita da Yellow, que assim demonstrou ser capaz de fazer um produção de acordo com os parâmetros internacionais. Como não tinha curriculum, não conseguiu atrelar ao projecto, na fase da produção, uma distribuidora internacional.

“”O ponto crítico da actividade económica é a distribuição”, reconhece Angelino que está a tentar que Star Crossed seja exibido em salas internacionais antes de ir para o circuito DVD. Neste momento difícil, há uma coisa que o anima: “O Quem quer ser Milionário estava destinado para ser distribuído apenas em DVD e conseguiu oito Óscares”.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Noticias

 

 

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Casa Aleixo

Rua da Estação 216, Porto

1 Muralhas … 10 euros

2 pães … 1

2  meias de filetes de polvo…24

2 saladas mistas pequenas… 5

2 rabanadas … 5

2 cafés….2

Total….. 47 euros

Não podemos perder o comboio da Europa

O coro de vozes pesadas que se levantam contra a construção do TGV é mais uma triste manifestação do reaccionarismo português.

Em todos os grandes e pequenos momentos da nossa História, esta corrente bolorenta tentou travar o progresso, abusando dos galões da “autoridade” e “experiência” para condenar a ambição empreendedora do que ousam arriscar.

Camões simbolizou esta corrente reaccionária numa personagem. Vale a pena reler o Canto IV dos Lusíadas para reencontrar os detractores do TGV na trágica figura do Velho do Restelo, que condenou a expedição de Gama, identificando a gesta dos Descobrimentos com a ambição desmedida do ser humano.

O Velho do Restelo reencarnou na tenebrosa figura de Salazar, que travou o desenvolvimento industrial do país, submeteu-o ao isolamento  e promoveu a cultura do pobretes mas alegretes, remendados mas não rotos, pobrezinhos mas honrados.

Mais recentemente, o Velho do Restelo falou pela voz dos que condenaram a Expo 98 e o Euro 2004, que mostraram ao mundo um Portugal moderno, ambicioso e empreendedor, apagando de vez a imagem do país com cheiro a chichi de gato, povoado por velhas com buço e vestidas de preto, e onde as pessoas andavam de burro.

Se os Velhos do Restelo mandassem, não havia CCB nem Casa da Música, e a zona oriental de Lisboa ainda era uma imunda sucateira.

Não é preciso ser um Einstein para perceber que temos de avançar para o TGV. Seria criminoso ficarmos de fora da rede europeia de alta velocidade, num momento em que os onze países mais prósperos da Europa têm ou estão a construir linhas de TGV.

A Linha do Norte está no limite da sua capacidade e o desenvolvimento do país exige a rápida redução da distância entre o Porto e Lisboa, e da Galiza ao porto de Leixões e aeroporto Sá Carneiro.

O reforço do investimento público para combater a crise não é uma receita socialista. Sarkozy anunciou um pacote de mil projectos, no valor de 25 mil milhões de euros, financiados pelo Estado e a concretizar em dois anos.

Ao contrário do que propalam os Velhos do Restelo, há um défice de investimento estatal. Este ano, seremos o 7º país, entre os 25 da UE, com menos investimento público em percentagem do PIB.

Durante o cavaquismo, éramos a quarta economia da UE com maior percentagem de investimento público, que nos últimos dez anos caiu para metade, de 4%, em 98, para 2,1%, em 08.

O TGV tem de avançar. Não podemos perder o comboio da Europa. Não devemos, em cada eleição, pôr em causa tudo quanto o Governo decide. Precisamos de uma injecção de adrenalina nas veias da nossa anémica economia.

Quando se tem de recuperar o tempo perdido, não se leva o pé ao travão, mas sim ao acelerador.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

Sandra Tavares da Silva

Atrasou-se duas horas, mas foi-nos informando das razões, que eram duas, boas e inesperadas. A manhã dela arrastou-se até às três da tarde por causa de uma visita surpresa da Inspecção do Trabalho na sua quinta, em Vale de Mendiz,  e de uma chamada de urgência à Quinta de Roriz (onde ela ajuda a fazer os vinhos), que tinha acabado se ser comprada pelos Symington a João van Zeller.

A calma e a vista sinfónicas dos socalcos do Douro que se usufruem da esplanada do D.O.C., temperadas pela conversa com o chefe Rui Paula (que vai abrir o D.O.P. no Largo de S. Domingos, no Porto), ajudaram a que as duas horas passassem a voar.

A espera foi amplamente compensada pelo sorriso quente de Sandra e pela excelência dos seus vinhos e da comida – um menu escolhido pelo chefe.

Sandra, 37 anos, é uma enóloga muito bem sucedida. O Pintas, o primeiro filho que ela e o marido (Jorge Serôdio Borges, ex-enólogo na Niepoort) conceberam em 2001, foi aclamado no Financial Times, como “o melhor vinho do Douro” por Jancis Robinson.  E o Chocapalha Reserva 05, que ela faz na quinta dos pais, em Alenquer, foi eleito o melhor tinto pelo painel de provadores da Essência do Vinho.

Ela é um dos emergentes Douro Boys, incensados na imprensa internacional, mas não tem nada de rapaz. Filha de uma suíça e de um oficial da Marinha, Sandra mede 1m85, tem uns belíssimos olhos verdes e foi modelo profissional, tendo desfilado ao lado da Bruni, Schiffer, Christensen e Evangelista nas passarelas de Paris, Madrid ou Nova Iorque.

A roupa casual - camisa Esprit, jeans Massimo Dutti e botas Timberland – não disfarçava uma elegância que não foi abalada por ter andado, há coisa de três anos, com o Francisco na barriga.

“A moda, para mim, foi aproveitar o físico para viajar, conhecer pessoas, divertir-me e ganhar dinheiro. Nunca foi o meu objectivo de vida. Dei sempre prioridade aos estudos. Na moda, é fácil um pessoa deslumbrar-se com o dinheiro, as festas e a fama, mas é tudo efémero. Espreme-se e não sai nada. Pode ser dramático se uma pessoa se deixa ficar 100% dependente da moda”, declara.

No final do curso de Agronomia,  aplicou parte do dinheiro ganho na moda num mestrado em Enologia, feito em Piacenza. O pai passara à reserva e andava entusiasmado a plantar vinha numa quinta que comprara em Alenquer. E ela guardava gratas recordações de quando era miúda e ajudava o avô nas vindimas, em Alcochete.

Regressada a Portugal, há dez anos, logo tratou de fazer uma vindima no Douro, experiência que lhe foi proporcionada por Cristiano van Zeller na Quinta Vale D. Maria, onde ainda é enóloga.

Sandra não conhecia o Douro. Foi um caso de amor à primeira vista. Decidiu ficar apesar dos pais a advertirem que ia viver “para o fim do Mundo”.

“O Douro é uma região deslumbrante não só pela beleza da paisagem, mas também pelo seu enorme potencial. Há tanto por descobrir e fazer. Nós só estamos a começar. Ainda temos de provar que os nossos vinhos envelhecem tão bem como os de Bordéus e Borgonha”, explica Sandra que depois de se apaixonar pelo Douro se apaixonou por Jorge e logo trataram de fazer um vinho, baptizado a partir das pintas com que, por osso do ofício, coloriam as suas roupas de trabalho.

 “Ninguém consegue copiar os vinhos do Douro”, garante esta adepta de vinhos de várias castas. “O engraçado é fazer lotes. É mais arriscado, mas conseguem-se vinhos mais complexos”.

Sandra gosta e faz Porto, e acredita no seu futuro: “O Vinho do Porto vai ter melhores dias. Mas, para isso, é preciso investir em promoção. E o nosso papel como novos produtores é criar novos consumidores. No sul não há o hábito de beber Porto”.

“O Douro está a entrar na moda como destino turístico e isso vai ajudar o Porto. Mas é preciso que não estraguem tudo. Não precisamos de turismo de massas, de abrir auto-estradas e trazer camionetas, mas sim de turismo selectivo de pessoas que gostam de vinho”, atira Sandra à despedida (já eram quase seis da tarde), antes de saltar para o X3 onde faz mais de 200 km por dia, entre as três quintas onde trabalha no Douro.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

 

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D.O.C.

EN 222, cais da Folgosa, Armamar

1 carpaccio de polvo … 7 euros

1 carpaccio de lingua de vaca … 8

½ Tamboril em tempura de cogumelos, acompanhado de batatinhas de Montalegre 10

½ Cachaço de porco bísaro com migas de feijão, grelos e broa de centeio 10

1 Guru branco 07 *

1 Pintas Character *

Água Vitalis 4 euros

Granizado de frutos do bosque e limão com cassis *

2 cafés 4 euros

Total….. 43 euros

*Vinhos da Sandra oferecidos pela Sandra. Granizado foi uma gentileza do chefe Rui Paula

 

domingo, 7 de Junho de 2009

Casa de chá de Serralves

Domingo acordei cedo, como de costume . Sentei-me ao computador, dei uma vista de olhos pelos jornais, limpei a caixa de mail e espreitei o Facebook.

Estacionei no Twitter, num debate diletante sobre a etiqueta da limpeza das fossas nasais. A discussão foi conclusiva. Todos os intervenientes concordaram em condenar firmemente o depósito de burriés na parte de baixo dos tampos das secretárias e em defender a conveniência da invenção de um burrião – um dispositivo individual de recolha de burriés, para eventual e posterior reciclagem.

Achamos ainda que seria vantajoso que o Ministério do Ambiente promovesse a distribuição de burriões através de um jornal de grande circulação, preferencialmente o Expresso, que assim sempre se limpava um pouco mais de todos os anos inundar o país com seis milhões de sacos de plástico.

Acabei a manhã em Serralves, onde, atendendo ao dia que era, reflecti demoradamente em frente à obra Uma faca lançada de um ponto qualquer de Portugal sobre um ponto não qualquer da Europa (1), de Artur Barrio, antes de tomar café na casa de chá e vagabundear pelo parque.

O almoço foi frugal (uma sanduíche de atum, empurrada por um copo de Planalto) e tardio, mas glorioso,  na esplanada do Ourigo, na Foz, a ver as ondas cinzentas a bater nas rochas e a ouvir (aos berros) o Greatest Hits de Neil Young  & Crazy Horse, no iPod.

Acabei a tarde nos Aliados, na Feira do Livro, onde logrei chegar ao fim de uma volta vagarosa por todos os pavilhões com apenas 10,95 euros gastos em três livros (A amiga da Madame Maigret, de Simenon, Os crimes do estrangulador enluvado, de Rex Stout, e Quinteto de Buenos Aires, de Montalbán). No caminho entre a Foz a Baixa, apanhei um bocado de trânsito junto à Católica, onde vota a maioria das pessoas da Pasteleira.

Não sei se ainda há anarquistas. Mas após ver a sondagem da RTP1 o meu primeiro pensamento foi para a enorme satisfação que deviam estar a sentir antecipadamente os libertários, que por doutrina são avessos a qualquer forma de governo.

Porque acho que votar é um direito (de que não abdico) mas não um dever, domingo fiz parte daquela maioria silenciosa de 63% dos eleitores que protestou de forma preguiçosa – os 4,63% de votos em branco são militantes.

Mas como nunca simpatizei com as ideias do Proudhon, lá para Setembro contem comigo, munido de cartão de eleitor, na minha mesa de voto, que fica na Católica. A não ser que entretanto se me varra da memória a imagem do Rangel amuado, por não lhe terem telefonado a dar os parabéns, com um emplastro, alucinado e de óculos, a suar em bica, no lado direito do ecrã.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

…………..

(1)   Trata-se de um mapa Michelin da Europa com uma faca espetada perpendicularmente nos arredores de Zurique

 

António Pires de Lima

Nem foi preciso pedir. O Miguel passou-nos logo para a mão duas lambretas (0,1 l de cerveja de pressão) de Super Bock, servidas em copo especialmente concebido pela Unicer.

António estava a jogar duplamente em casa. A sede da Unicer é em Matosinhos e  o Miguel é sportinguista como ele – devoção que não impede que o seu restaurante seja o santuário preferido do estado maior portista e do Gotha do empresariado nortenho. Quem vai à Marisqueira de Matosinhos arrisca-se a tropeçar em Pinto da Costa, Jesualdo, Belmiro ou Rui Moreira.

“O meu prato preferido é ouvir o meu concorrente dizer mal do Sporting. A última coisa que me passaria pela cabeça seria hostilizar a massa associativa de um grande”, atira Pires de Lima, 47 anos, enquanto ataca um pratinho de camarões de Espinho, que come com casca.

O seu prato preferido no Miguel é, efectivamente, robalo grelhado com arroz de amêijoas. Ele estava apenas a dar um pontapé debaixo da mesa a Alberto da Ponte, presidente da Central de Cervejas (Sagres) e leão como ele, que ameaça processar o Sporting, alegando incumprimento do contrato por o clube ir publicitar a Super Bock nas suas camisolas.

A Super Bock ficou com Porto e Sporting, a Sagres com o Benfica. Pires de Lima reconhece que há riscos, pois o futebol é dado a polémicas, mas não teme sofrer danos colaterais desta guerra.

“Temos excelentes relações com o Benfica. Manifestamos interesse em apoiar o clube. Não foi possível porque, disseram-nos, receberam uma ‘proposta irrecusável’. Mas se algum dia se sentirem insatisfeitos com o patrocinador, continuamos à disposição. Se precisar de ajuda, o Luís Filipe Vieira tem o meu número de telemóvel”..

Em 2008, pela primeira vez em 81 anos de história, a Unicer associou-se ao futebol.  “Não estar no futebol significava abdicar de lutar pela liderança na cerveja. Não podia deixar o monopólio desse território à nossa concorrente”, explica este gestor, que começou a carreira em multinacionais (introduziu em Portugal a Dodot, Evax. Tampax e Scottex) antes de entrar nas bebidas  - demorou-se 13 anos na Compal.

A pedido de Hermínio Loureiro, que não tinha patrocinador para as competições mais difíceis, a Unicer ficou madrinha da Liga de Honra (Vitalis) e da Taça da Liga (Carlsberg)  - e com a promessa (não cumprida) de ter a preferência para a I Liga, em caso de saída da Bwin. “Mas isso agora já são águas passadas”, diz.

Pires de Lima jura que investe no futebol “menos de metade” do que a Sagres e que a sua primeira preocupação é sair mais forte deste dois anos de crise  (prevê que o sol só voltará a brilhar em meados de 2010).

As vendas de cerveja em Portugal vão cair 5% este ano (10% se o Verão for mau) e em Angola o recuo será de 20% (“não há dólares”). O consumo de águas lisas registará pela primeira vez registar uma quebra. Apesar disso, ele promete lucros iguais aos de 2008.

“Cada um segue a sua agenda. A minha é a da sustentabilidade. Prefiro ser um nº 2 forte e rentável, do que um líder a perder 20 milhões de euros/ano”, afirma, antes de desfiar com orgulho os números gordos dos quatro anos que leva à frente da Unicer: tirou 40 milhões de euros aos custos, gerou 100 milhões de lucro, distribuiu 80 milhões de dividendos e abateu 50 milhões ao passivo. “Nesse período a Central perdeu 80 milhões”, acusa.

A aposta no futebol não afecta a música, que ele considera importante “pelos valores e convívio, modernidade e universalidade que transporta”. “Os consumidores percepcionam a Super Bock como mais sofisticada e arrojada. Não a podíamos deixar afunilar no futebol”, diz.

As festas são o terceiro pilar da sua estratégia. Anda satisfeitíssimo por ter conseguido ganhar as Festas de Lisboa por três anos.

 “Temos de crescer a sul. O Sporting e as festas de Lisboa vão ajudar a ganhar a confiança dos consumidores”, conclui este lisboeta que não se importa de passar parte da semana longe do seu harém (a mulher e cinco filhas, todas de olhos azuis ou verdes). “Gosto de viver na Foz, do cheiro da cidade e das pessoas do Porto”.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

 

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Marisqueira de Matosinhos

Rua Roberto Ivens 717, Matosinhos

1 torrada aparada … 2,70 euros

1 torrada de centeio … 2,50

Camarão da costa…. 9,00

Percebas… 9,00

Robalo com arroz de amêijoas … 75,00

Cerejas… 6,00

8 lambretas … 8,00

2 cafés…2,60

Total….. 114,80 

Os arrumadores e a corrupção do tipo B

Eu não dou uma moedinha aos arrumadores.

Os meus amigos, que se deslocam em vistosos Mercedes, BMWs e Audis dizem que me posso dar a esse luxo porque a chapa cinza rato da minha carrinha Fiat Marea (matrícula de 2001) está tão crivada de amolgadelas e riscos que eu nem repararia se ela fosse vandalizada por um arrumador vingativo.

Eles devem ter razão. A minha atitude blasé face aos arrumadores  fundamenta-se no facto de ter muito pouco a perder se incorrer na ira deste modernos parasitas, que substituíram na paisagem urbana os cães vadios e os doidos (que andam disfarçados – compensados, como se diz agora).

O modelo de negócio dos arrumadores é decalcado da Mafia. Em troca da moedinha, protegem-nos deles próprios.

Há, no entanto, uma pequena maioria de arrumadores que não se limitam à venda ilegal de protecção, e fornecem serviços de valor acrescentado.

Há uns bons dez anos, quando o fenómeno dos arrumadores desabrochava e o Expresso no Porto ficava na Boavista, um colega meu (António Paulino) avençou um arrumador que não só lhe punha o carro a lavar, como fazia valet parking (se não havia lugar, estacionava em segunda e deixava-lhe a chave) e metia moedas no parquímetro se os fiscais aparecessem.

Eu próprio teria recorrido a este arrumador se o dr Balsemão não me pagasse, à época, um lugar de garagem.

A praga dos arrumadores revela um pernicioso traço do nosso carácter nacional e permite estabelecer um paralelo com a corrupção.

É grave receber sem dar nada em troca, e isso é tão válido para arrumadores como para funcionários e políticos corruptos.

Há dois tipos de corrupção. A do tipo A, maioritária no pais e entre os arrumadores, é praticada por pessoas a quem pagamos só para não nos lixarem.

A corrupção do tipo B é mais benigna e positiva, pois é produtiva e faz PIB. Estes corruptos abusam da sua posição e recebem uns dinheiros por fora, mas propiciam-nos serviços (facilitam a vitória num concurso, vendem-nos, à razão de 500 euros cada, anos de descontos para a Segurança Social ou garantem que o nosso processo vai ficar no fundo do monte até prescrever), tal como o arrumador do Paulino.

Os corruptores do tipo B prejudicam o Estado, mas, como diz o povo, “ladrão que rouba ladrão em cem anos de perdão”.  Um estudo do Centro de Estudos de Sociologia revela que a maioria dos portugueses partilha deste ponto de vista.

Perguntados sobre o que mais apreciam num político, a competência (34%) vem em primeiro lugar, seguida da responsabilidade e eficácia. Só 0,7% dos inquiridos refere a honestidade. É o elogio do “rouba mas faz”

Nós não nos importamos que roubem, contanto que sejam competentes, eficazes e empenhados.

Jorge Fiel

www.lavandaria.blogs.sapo.pt

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

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