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Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Fechar o ralo lisboeta do lavatório Portugal

Não sou daqueles que acham que nós, homens, fomos mais penalizados do que as mulheres na hora em que o Criador, na sua imensa sabedoria, deliberou sobre as penitências a observar pelos dois sexos relativamente à culpa pelo Pecado Original.

Ter de fazer a barba parece-me uma penitência bem mais benigna do que a suave prestação mensal que as mulheres adultas pagam, a título quase vitalício, para se redimirem dos nossos antepassados Adão e Eva terem trincado a maçã num compreensível momento de desvario – quem nunca cedeu a essa tentação que atire a primeira pedra!

Nunca fui de me dar ao incómodo de fazer a barba todos os dias. Habituei-me a justificar com as poupanças - em tempo (que é dinheiro), lâmina, espuma, água e after shave -, o que era olhado como um desleixo. Há coisa de poucos anos, José Mourinho foi um dos líderes da revolução libertadora que legalizou socialmente a barba de três dias, absolvendo-me do facto de só me por em frente ao espelho, antes do banho, uma ou duas vezes por semana.

Fechar o ralo do lavatório é o meu primeiro gesto da rotina quando faço a barba, o que me permite usar na limpeza da lâmina a água gasta na preparação da cara para a espuma. No final, depois de abrir o ralo, limpo com uma folha de papel higiénico os pelos que ficaram acumulados no lavatório. Temos de poupar água, que é um factor escasso.

O problema é que no lavatório Portugal o ralo Lisboa suga e desperdiça todos os recursos que a torneira do resto do país lhe despeja, sem que até agora ninguém lhe tenha conseguido por travão.

Num artigo publicado no Expresso, no dia de Natal, Daniel Bessa, fez as contas (o que ele sabe fazer, ao contrário do incompetente que o despediu do Governo) e concluiu que para trazer o défice de volta aos 3% do PIB o Estado português tem de arranjar dez mil milhões de euros.

Aumentar as receitas não é viável, pois não se pode tirar sangue das pedras – a economia está em coma e o tacho da cobrança coerciva das dívidas fiscais já está rapado. Reduzir o investimento público seria criminoso no país da UE que na década 98/08 teve o pior desempenho neste capítulo, com uma queda anual média de 4,6%.

A alternativa é reduzir drasticamente a despesa, o que implica desmantelar este Estado velho, gordo e centralista que gasta metade da riqueza do país. O combate à crise exige o reordenamento do território, a destruição deste aparelho de Estado e a redistribuição de competências.

Só a Regionalização pode fechar o ralo do desperdício lisboeta por onde se esvai a nossa riqueza. Se não se fizer, o resto do país não tem outra alternativa senão fechar a torneira e começar a pensar numa solução à catalã.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no DN

Nuno Cardoso Santos

Vinte e três séculos depois de Epicuro nos ter avisado que “nada impede que exista uma infinidade de Mundos”, Nuno está a dar razão ao filósofo ateniense - descobriu 32 novos planetas, o que lhe valeu ser um dos três portugueses contemplados com a bolsa de um milhão de euros, atribuída pelo European Research Council (ERC) a 219 investigadores, de um total de 2503 candidatos. 

“Estamos a caminhar a passos largos para descobrir outros pequenos planetas azuis a orbitar outras estrelas parecidas com o Sol”, garante Nuno Cardoso dos Santos, 36 anos, que escolheu almoçarmos na Duvália, que, tal como a Petúlia, pertence a Ilídio Pinto (histórico dirigente do hóquei portista), e fica no Campo Alegre, perto do Centro de Astrofísica da Universidade do Porto (CAUP).

Ainda não era uma da tarde quando lhe serviram os filetes de pescada. Fechou a refeição com um pingo de descafeinado. Ele estava com pressa pois tinha uma reunião às 14h30. 

Nuno nasceu em Lourenço Marques, mas ainda bebé veio com os pais (ela professora primária, ele pequeno empresário) para Lamego. Viveu ainda em Mirandela e em S. João da Madeira até ir estudar para Lisboa. A Física foi apenas o caminho. O objectivo era a Astronomia.

Lembra-se da primeira vez em que, ao colo da avó, ficou fascinado com a Lua e as estrelas. Em Mirandela, durante um eclipse do Sol, já o vemos a fazer cálculos, com uma mão nos binóculos e a outra num cronómetro. Tinha 16 anos quando construiu o seu primeiro telescópio e se apaixonou pelos anéis de Saturno, cometas, enxames de estrelas, nebulosas e crateras da Lua. Estava escrito nas estrelas que ia ser astrónomo.

Michael Mayor, que em 1995 descobriu o primeiro exoplaneta (planeta fora do sistema solar), e a possibilidade de colaborar com o Observatório de Genebra, foram a poderosa força de gravidade que o atraiu à Suíça, onde demonstrou, no seu doutoramento, que as estrelas com mais elementos pesados (tudo o que não é hidrogénio e hélio) tem mais probabilidades de ser orbitadas por planetas.

Acabado de desembarcar em Genebra, recebeu guia de marcha para o Chile. “Senti-me um piloto de uma nave espacial à procura de novos planetas”, diz Nuno  (que na adolescência delirou com a saga Guerra das Estrelas) ao recordar a primeira experiência ao comando do telescópio suíço no Observatório de La Silla, no deserto de Atacama.

Ser bem sucedido na caça de novos planetas implica paciência, cálculos complicadíssimos e sonos trocados. “Trabalhar de noite é muito duro”, diz Nuno, que em La Silla (onde já esteve 20 vezes) se deita ao nascer do dia e começa a trabalhar quando o sol se põe.

Os períodos de observação duram em média duas semanas, durante os quais recolhe dados que depois trabalha no CAUP. A velocidade de uma estrela varia se tiver planetas à volta. É através destas alterações, que ele descobre novos planetas e reúne informação (diâmetro, período orbital, atmosfera) sobre eles. Apesar de não os ver, sabe que eles estão lá e conhece-os.

O trabalho de cartografar a Via Láctea ainda está numa fase incipiente. Os 400 exoplanetas descobertos são quase todos muito grandes, do tamanho de Júpiter, que tem 300 vezes mais massa que a Terra. “O objectivo é chegar a um catálogo de pequenos planetas rochosos, parecidos com a Terra, que orbitem as suas estrelas à distância certa, para que possa existir água no estado líquido, a suportar a vida tal como a conhecemos”, explica.

Nuno está convencido de que não estamos sozinhos e um dia vamos descobrir que há vida num planeta distante: Mas não vai ser amanhã. “Na Ciência, temos de planear a médio e longo prazo. Em Portugal, a investigação está no bom caminho, mas ainda nos falta capacidade para fixar cientistas, porque não lhes damos estabilidade. Vivemos de bolsas. Hoje funciona, mas amanhã pode deixar de haver financiamento e ou abandonamos o trabalho ou vamos embora. Temos de ser capazes de absorver os melhores”, concluiu Nuno, a quem a bolsa da ERC garante estabilidade até 2014, o ano em que o seu filho vai fazer cinco anos.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

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Duvália

Rua do Campo Alegre 654, Porto

Couvert … 1,20 euros

½ Filetes de pescada … 9,00

½ Tripas à moda do Porto … 6,50

Água … 2,00

Café … 0,80

Pingo de descafeinado … 0,90

Total … 20,40

Deixa-me cheirar o teu bacalhau

 

Logo à noite, vai ser como deve ser. Cubro a base do prato com azeite, adiciono a gota de vinagre, tempero com pimenta, esmago o dente de alho e a malagueta - e vou misturando até ficar pronta a cama para a posta de bacalhau.

Talvez o meu apelido não seja estranho ao facto de sempre me ter interessado pelo fiel amigo, cuja história e evolução penso não terem ainda sido analisadas nas escolas de negócios, nem reflectidas pelos sociólogos e outros psicanalistas da Pátria. O’Neil exortou-nos a seguir o cherne. Sem melindre para o mano da garoupa, nem ofensa à memória do poeta, apelo a que sigamos o bacalhau, em tudo quanto ele nos tem para dar e não se esgota no prato.

Quantas vezes na cozinha, com uma embalagem com pedaços de bacalhau à frente, me interroguei sobre o que fazer. Bolinhos de bacalhau? À Brás ou à Gomes de Sá? Ou tão só a simples punheta, essa espécie de sushi à portuguesa?

Todos sabemos que há mil maneiras de cozinhar bacalhau, mas nem todos estamos convencidos há mais de uma maneira de fazer as coisas bem e somos tolerantes ao ponto de perceber que a verdade é plural - e temos de respeitar ideias, hábitos e comportamentos diferentes. Logo, durante a ceia, faça a si próprio o favor de aprender com o bacalhau a critica implícita que ele faz ao pensamento único e ao sectarismo dos que pensam ser donos da razão.

Peixe das águas frias dos mares do Norte, o bacalhau é uma matéria prima importada a que acrescentamos o valor da salga e da cura, desde que os nossos navegadores chegaram à Terra Nova. Não é por acaso que o coração da indústria bacalhoeira bate em Aveiro, terra onde abunda o sal e o sol.

No séc. XX, o bacalhau superou a inovação tecnológica  (a invenção do frigorífico), mantendo-se fiel ao tradicional processo de conservação (salga e cura), e logrou um upgrade da imagem, deixando de ser olhado como comida de pobres.

Recentemente, adaptou-se ao desembarque massivo das mulheres no mercado de trabalho e ao mal da falta de tempo. Como, no dia a dia, ninguém tem paciência para o demolhar convenientemente, apresenta-se agora na versão demolhada e ultra-congelada já pronta a cozinhar – e menos salgado para não sair da dieta dos hipertensos. E não perdeu de vista as novas gerações, entrando nas pizzas e lasanhas.

Para que não fique tudo em águas de bacalhau, ele só precisa mesmo que o país que o adoptou o assuma sem complexos como o seu maior embaixador gastronómico. O pastel de bacalhau é tão fundamental como a nata. As pataniscas têm tudo para serem uma coqueluche. E não há turista que não adore bacalhau com natas. Itália tem pizzas e pastas. Espanha tem paella e tapas. Portugal tem bacalhau. ‘bora aí internacionalizá-lo à séria!

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

Rui Costa e Sousa

Foto Ana Jesus Ribeiro

Não vale a pena ficar com remorsos ecológicos. O bacalhau não só não está em vias de extinção como, ainda por cima, nós estamos muito longe de ser o seu pior inimigo.

“Só na Terra Nova, há cinco milhões de focas e cada uma estraga em média, todos os dias, 80 kg de bacalhau. Sozinhas dão cabo de mais bacalhau do que nós, os espanhóis e os italianos juntos”, denuncia Rui Costa e Sousa, 55 anos, esclarecendo logo o uso do verbo estragar: “As focas só comem as vísceras. O resto, deitam fora”.

A concentração na Europa do Sul do consumo de um peixe que habita as águas geladas dos mares do Norte tem uma boa explicação: “Para ser gostoso, o bacalhau tem de levar azeite”.

Rui Costa (que é sportinguista) sabe do que fala pois é o maior importador de bacalhau seco, com quem lida profissionalmente há 33 anos, após ter feito o espólio no quartel da Ajuda da Polícia Militar, onde, sob o comando do major Tomé, fez uma tropa acidentada nos anos quentes de 74 e 75,  marcada por plenários às seis da manhã, troca de murros e tiros com os comandos -  e em que as manifs onde se gritava “Nem mais um só soldado para as colónias!” o pouparam a uma viagem até Nova Lisboa.

Ainda não havia IP5 quando deixou a Tondela natal, atravessou a Serra do Caramulo e desaguou em Aveiro, fazendo o percurso inverso ao do peixe fresco que o pai vendia e viajava de comboio desde o litoral.

Nos primeiros quatro anos, fez um pouco de tudo, desde camionista a carregar fardos às costas, o que descreve como curso de Económicas e Vassouras. Em 80, casou e estabeleceu-se como armazenista. Passou a industrial  já nos bons tempos dos anos 90, “em que havia muito dinheiro e pouco bacalhau, ao contrário de agora em que há muito bacalhau e pouco dinheiro”.

A facturação da RCSI (Rui Costa e Sousa & Irmão) estagnou nos 70 milhões de euros, apesar das vendas não pararem de crescer. “Este ano, os preços caíram entre 20% a 30%. Portugal é o sítio do Mundo onde o bacalhau é mais barato”.

O homem que ganhou o direito a ser chamado pelo nome da sua principal marca (Sr. Bacalhau) recebeu-nos numa das cantinas da sua fábrica no Cais dos Bacalhoeiros (Gafanha), que fica mesmo em frente a um enferrujado bacalhoeiro russo comprado pelo sucateiro Godinho após ter sido arrestado por dívidas.

Uma sopa de bacalhau inaugurou uma refeição monotemática em que foram servidos dois pratos, generosamente regados por um tinto de Silgueiros. O primeiro, mais tradicional, foi um Bacalhau à Beira Baixa, em que a posta cozida repousa em cima de uma rabanada de regueifa e é acompanhada por batatas, grelos e uma cebolada que o mestre Silva (um dos comensais e amigo da casa) fez questão de precisar ter sido confeccionada com duas partes de azeite, uma de vinagre e uma pitada de colorau.

O segundo prato, mais experimental, foi inventado pelo Mestre Silva que o baptizou Bacalhau à Rui Costa (“A melhor posta é a do Rui Costa”, gracejou logo o próprio) e consiste numa posta limpa, sem espinhas nem peles, passada por farinha, envolta num molho que leva manteiga, calda de pêssego, natas e Porto, e acompanhada por arroz chao chao enriquecido com pedacinhos de bacalhau.

Rui Costa fez questão de sublinhar que a sua versão favorita é o bacalhau na brasa, com muita cebola e azeite. “Este é o melhor bacalhau que há à face da Terra. O Belmiro só come Sr. Bacalhau”, declarou.

Há coisa de dez anos, o mundo do bacalhau foi abalado pela invenção da posta demolhada e ultra-congelada, revolução a que ele aderiu, contratando à concorrente Riberalves, para director industrial,  Guedes Vaz (outro dos comensais), a quem ele se refere afectuosamente como “o catedrático do bacalhau”.

“O consumidor não sabe nem tem tempo para demolhar o bacalhau como deve ser. Dependendo da grossura, precisa de estar entre 60 a 100 horas em água gelada, mudada uma meia dúzia de vezes”, explica Rui Costa que deve localizar no Brasil (onde faz 30% das vendas e o mercado cresce a olhos vistos) a nova fábrica de ultra-congelados, e partilha um segredo do negócio: “No dia em que é pescado, o bacalhau tem logo de ir dormir ao sal e demorar-se por lá um mínimo quatro meses”.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

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Cantina da fábrica RCSI

Cais dos Bacalhoeiros, Gafanha da Nazaré

Sopa de Bacalhau

Bacalhau à Beira Baixa

Bacalhau à Rui Costa

Dão Curral da Burra (tinto)

Cafés (com umas gotas de uísque velho)

Os três andamentos de um divertimento

Assim de repente, vejo que aqui pelo Porto já não me restam muitos amigos benfiquistas. O Rogério Gomes fez muito bem em concentrar no Gil Vicente a sua paixão clubística. O Vítor Pinto Basto é um caso à parte, pois simpatiza ao mesmo tempo com águias os dragões – ninguém me tira da cabeça que ela anda a treinar-se para Kofi Annan. O Mário Dorminsky deixou de ligar a futebol. E, com a sabedoria que só pode ter quem passou mais de metade da vida rodeado por milhares de livros, o António Catarino prefere falar de automóveis e rugby.

Há, claro, o Aníbal Campos, que é daqueles benfiquistas irredutíveis e com pedigree, ao ponto de também sofrer pelo Real Madrid, mas a esse já não o vejo há uma data de tempo – com grande pena minha.

Um jogo entre Porto e Benfica é mais ou menos como as férias, em que o divertimento tem três andamentos: a excitação da preparação, o saborear das férias propriamente ditas e o prazer de as relatar.

Como não tenho benfiquistas por perto, o meu divertimento no antes do derby resume-se a sentir à distância, via Media, o cheiro a medo e a nervosa ansiedade que transpira dos benfiquistas, já convencidos que, uma vez mais, a sua equipa se vai esgotar no papel de segunda lebre da Liga (a principal é, este ano, o Braga), que parte entusiasmada no Verão, ganha velocidade no Outono, desacelera no Inverno e desiste na Primavera.

Está cada vez mais curto o prazo de validade dos factos políticos e desportivos. Três meses depois de se ter enfiado num buraco, por causa das alegadas escutas de que estava a ser alvo (afinal, vai-se a ver, e o escutado era o outro…), Cavaco já se sente com a cabeça fora de água e promoveu o amigo Lima.

Os meus amigos portistas, que há coisa de um mês receavam que hoje nos pudesse acontecer uma coisinha má, andam felizes da vida a recordar a proeza do Lemos – que numa época marcou seis golos (quatro nas Antas e dois na Luz) ao Benfica de Eusébio – e os saudosos cinco secos aplicados na Supertaça, em casa do adversário. Nestes tempos difíceis é enorme a volatilidade dos estados de alma.

Hoje à noite, no durante, o que me dará mais gozo, para além da convincente vitória azul e branca, será ver como as equipas, que desembarcam em campo (será mesmo relvado?) com um plano de batalha definido ao pormenor com régua e esquadro, vão reagir às contrariedades, com um golo madrugador de Hulk, a expulsão anunciada do David Luiz ou a confirmação da lesão de Aimar.

Depois - os meus amigos benfiquistas conhecem-me – a minha vaidade será demonstrar, uma vez mais, quão competente sou a fazer o mais difícil, que é saber ganhar.

O champanhe será bebido em privado, com os meus amigos portistas. Como sempre, irei abster-me do mau gosto de perturbar o luto dos meus amigos benfiquistas com SMS gozonas, telefonemas achincalhantes, tuítes ácidos ou bocas foleiras no FB.

Jorge Fiel

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Jesus arranjou-nos uma data de chatices

Natal não é só quando um homem quer, também é para a semana e, como de costume, estou atrasado na minha lista de prendas. Não deixa de ser irónico que Jesus Cristo, cujo nascimento vamos comemorar, tenha sido poupado a duas das coisas mais difíceis que um homem tem de fazer: viver com uma mulher e fazer a lista de compras de Natal.

Tudo é delicado, logo a começar pela delimitação do perímetro de beneficiários. Trata-se de uma troca de presentes, o que quer dizer que podemos embaraçar uma pessoa ao dar-lhe uma prenda, quando a ela nunca lhe passou pela cabeça dar-nos outra coisa senão o desejo de um bom Natal!

Para evitar ser eu a ficar enrascado, tenho sempre dois ou três presentes de reserva, com a etiqueta pronta a ser preenchida em caso de emergência. Cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém. Quando, na noite dos Óscares, não se vê um lugar vazio no Kodak Theatre isso não quer dizer que os convidados apareceram todos e a horas, mas sim que a organização contratou figurantes vestidos a rigor e prontos a ocupar as cadeiras vagas um minuto antes das televisões entrarem em directo.

Elaborada a lista, há que escolher a prenda adequada ao gosto e necessidade de cada beneficiado e compatível com o dinheiro que estamos dispostos a gastar com ele. A dificuldade no cabal desempenho desta tarefa variaem função inversamente proporcional ao tamanho do nosso orçamento. Quanto maior ele foi mais fácil é. Não há quem não aprecie  receber um Rolex verdadeiro ou uma caixa de robalos fresquinhos. E um Mercedes novo dá jeito a toda a gente.

Como os tempos não estão para brincadeiras, há que evitar o desperdício. O economista Joel Waldfogel estima em 25 mil milhões de euros o valor destruído no mundo com as prendas de Natal.  Mais vale oferecer meias ou cuecas, mesmo correndo o risco de enfrentar um sorriso amarelo e ouvir a frase : “Estava mesmo a precisar…”.

Last, but not the least, há que valorizar as ofertas. Está provado que as pessoas avaliam as prendas que recebem em 20% menos do que custaram, um problema que não é de fácil ultrapassagem, pois não é educado deixar ir a etiqueta com o preço. Não é por acaso que no Natal 2008 o Tom Cruise gastou 4.900 euros só em papel de embrulho.

Com o seu nascimento, Jesus arranjou-nos uma data de chatices. Valha-nos que o inquérito da Deloitte revela que as famílias portuguesas encaram o futuro com optimismo e por isso, este Natal, vão gastar 620 euros mais que as inglesas (600) e as alemãs (485).

Eu aderi a esta onda positiva. Ao fim e ao cabo, o consumo natalício pode ser o Viagra de que a economia precisa para se endireitar. E, como avisa o Warren Buffet, “ter o dinheiro parado é como deixar o sexo para a velhice”.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

Mafalda Pinto Leite

A cozinha é território das mulheres, mas quando chegamos à haute cuisine, às estrelas Michelin e aos chefs que atingiram o Olimpo da celebridade, ao lado de cantores pop, vedetas de Hollywood ou futebolistas milionários, entramos num mundo quase exclusivamente masculino.

Mafalda, 33 anos, tem uma explicação: “O trabalho na cozinha de um grande restaurante é duro. É muita gente em stress, num espaço reduzido e num ambiente agressivo de vapores e cheiros. E a carga horária é muito pesada. O horário pode ser das nove às seis, mas o mais certo é não sairmos antes das duas da manhã. Chega a uma altura em que nós, mulheres, temos de optar entre a carreira e a família ”.

Melhor aluna do curso de chefes de cozinha do Natural Gourmet Institute for Health & Culinary Arts de Nova Iorque, Mafalda tinha 25 anos e trabalhava no Monte’s, em Chelsea, quando escolheu ser mãe.

Quando o espaço ocupado por Marina (a filha mais velha, que tem sete anos) na sua barriga se tornou incomportável com o duro trabalho na cozinha, não teve outro remédio senão sair do restaurante frequentado por Beckham, Madonna e príncipe William, e arranjar um emprego mais calmo na Book for Cooks, livraria londrina especializada em livros de culinária que tem uma cozinha ao fundo, onde são experimentadas receitas e servidas refeições rápidas.

Regressada a Portugal há cinco anos, Mafalda arranjou um irmão (Vasco, dois anos, obcecado por automóveis) para a Marina, escreveu dois livros práticos (“Cozinha para quem não tem tempo” e “Cozinha para quem quer poupar”), teve uma rubrica no Praça da Alegria (RTP) e uma participação no Mundo das Mulheres (SIC).

Falou-nos dos seus planos que, tal como as flores, vão desabrochar na Primavera, à mesa do Monte Mar, o restaurante da Quinta da Marinha que escolheu um pouco a medo (“não será muito caro?”), num dia em que a chuva nos impediu de desfrutar da magnífica varanda. Acompanhou os filetes de pescada com um improvável sumo de laranja, apenas por precaução, pois estava constipada e nas vésperas de umas mini-férias em Londres, aproveitadas a rever amigos, fazer compras de Natal em Oxford Street e repôr o stock de Earl Grey de chá verde na Fortnum & Mason. Não tomou café, porque do que ela gosta mesmo é de galões.

Na Primavera vai relançar o site, voltar à televisão e abrir um café (“Não é tão absorvente como um restaurante”) no Monte Estoril, onde mora. “Vai abrir às oito da manhã com um pequeno almoço fantástico. Durante o dia servirá comida leve, fresca e sazonal, num ambiente muito relaxado”, descreve Mafalda, que tem em curso uma cruzada de preservação dos sabores antigos e deliciosos da comida cozinhada pelas suas avós Pinto Leite e César Machado.  

“É possível fazer comida boa e saudável, temperada como antigamente”, diz, acrescentando ter pena que se esteja a perder o hábito da família conviver à volta da mesa: “Cozinhar é um acto de amor. É preciso ter carinho a pôr as coisas no prato, cortando, por exemplo, a maçã em forma de coração. E, ao fim de semana, a família pode juntar-se na cozinha a fazer um risotto”.

Mafalda nasceu no Porto, onde estudou no Colégio Inglês. A paixão pela cozinha despertada pelas avós, aguçou-se quando aos 16 anos se tornou vegetariana e tinha o desafio de infiltrar sabores no tofu, “uma tela em branco que não sabe a nada”. Aos 18 anos, iniciou a peregrinação pelo mundo fazendo cozinha vegetariana numa comunidade auto-suficiente, em Inverness, Escócia.

A excelente nota no curso em Nova Iorque abriu-lhe as portas do Chez Pannisse, em S. Francisco, de onde partiu para quatro anos como responsável pelas refeições num spa de luxo no Havai. Em Londres, no Monte’s aprendeu a cortar carnes. “Ser vegetariana fez parte do meu crescimento como pessoa. Em Portugal, com um peixe fabuloso, carne fantástica e queijos magníficos é quase um crime ser vegetariano”, diz Mafalda, que no Natal vai andar entre Lisboa e o Porto. Passa a véspera no Estoril. No dia, repartirá o almoço entre as famílias materna e paterna e à noite vai jantar à irmã. Como não é fã de rabanadas, vai levar um tiramisu, a sua sobremesa preferida.

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

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Restaurante Monte Mar

Av. Nossa Srª do Cabo, 2845, Cascais

2 Filetes de pescada com arroz de berbigão… 46,00 euros

2 Águas do Castello 0,25 l…  4,00

1 Sumo de laranja natural …4,00

1 copo Monte Velho branco … 4,50

1 café … 2,00

Total … 60,50 euros

A galinha da vizinha é mais bonita que a minha

Sally e John Bercow

Sally Bercow é uma mulheraça loura e de olhos cinzentos, que não abdica dos saltos altos, apesar de descalça já ser bastante mais alta do que o marido, John, o speaker da Câmara do Comuns. Ao contrário de Carla Bruni, fez ouvidos de mercador aos especialistas em imagem que a aconselharam a calçar sapatos rasos.

Como está desempregada, pensou candidatar-se a um lugar no Parlamento e o primeiro passo que dado nesse sentido foi esvaziar de esqueletos um armário atulhado deles. Em entrevista ao Evening Standard, Sally procedeu a um metódico strip tease de um passado em que fez tudo que as mães recomendam às filhas para não fazerem. Todos os dias apanhava uma bezana e todas as noites ia para a cama com um tipo diferente. Copos e sexo não esgotam o rol de pecadilhos de Sally, onde consta ainda ter adornado o cv com um grau em Teologia.

Estas saborosas revelações deliciaram os Media britânicos e fizeram crescer água na boca da Oposição conservadora, que logo tratou de arejar e escalpelizar o assunto na Câmara dos Comuns.

Como se já não bastasse andar toda a gente a comentar o passado libertino da mulher, desabou em cima do speaker mais um esqueleto, desta vez saído do seu próprio armário. A edição londrina do Metro desenterrou um ensaio que ele publicou com 23 anos, sugestivamente intitulado “The John Bercow Guide to Understanding Women”.

Abordagens ousadas  - “Se estiveres livre logo à noite, posso passar por tua casa para arranjarmos nomes para as tuas maminhas” – constam deste precioso manual, que incluiu capítulos especializados: “Como engatar virgens”, “Como se ver livre de uma mulher após ter feito sexo com ela” e “Como levar para a cama raparigas bêbadas”, sendo que o seu casamento com Sally serve como garantia da eficácia dos conselhos constantes deste último capítulo.

Fiquei cheio de inveja dos ingleses. Os nossos escândalos, do tipo Face Oculta, são uma porcaria quando comparados com este episódio da mulher bêbada e ninfomaníaca do speaker atrevido. Para recompensar, sábado de manhã fiquei cheio de orgulho por ser de um português a banca de comida mais procurada em todo o mercado da Portobello (sandes do lombo de um porco assado à vista de todos, rissóis, bolinhos de bacalhau e pasteis de nata) e à tarde fui uma das duas milhões de pessoas que andaram às compras em Oxford St por baixo de iluminações de Natal fornecidas pelos Castros de Espinho.

Eu sou assim, como a maioria dos portugueses. A um tempo orgulhoso com o sucesso dos nossos, mas sempre pronto a dizer mal deles (já repararam que as travessuras sexuais do Ronaldo são uma brincadeira quando comparadas com as do Tiger Woods?) e convencido que a galinha da vizinha é mais bonita que a minha.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

Dinis Manuel Alves

Fotografia de Carlos Jorge Monteiro

A nossa língua está a mudar a uma velocidade vertiginosa e o novo acordo ortográfico está inocente. O culpado é o telemóvel, mais concretamente as SMS, palavra hermafrodita –  a maior parte das pessoas atribui-lhe o sexo feminino (que vai buscar a mensagem), mas o masculino seria o mais correcto, pois é a abreviatura de Serviço de Mensagens Escritas.

“A lei do menor esforço é um motor essencial da evolução da língua”, reconhece Dinis Manuel Alves, filho de um guindasteiro do porto do Lobito, onde nasceu há 51 anos, e que agora é o responsável pela licenciatura em Comunicação Social do Instituto Miguel Torga, de Coimbra.

A bem dizer, não é o responsável pela licenciatura, porque as SMS e o MSN não são os únicos agentes de mudança da língua. O “correctês” dá uma ajuda: o 1º ciclo é a antiga licenciatura minguada por Bolonha, o 2º ciclo respondia por mestrado e as cadeiras dão agora pelo nome de “unidades disciplinares”.

A ideia de traduzir Torga para linguagem SMS tem origem num inocente desabafo numa aula, produzido por Dinis, que é senhor de um curriculum tão trepidante e ziguezagueante como se antevê tenham de ser todos neste frenético e perigoso séc. XXI: fez Direito, foi deputado eleito pelo PS, licenciou-se em Jornalismo e vagabundeou pela rádio (TSF), televisão (TVI) e jornais (Grande Reportagem, Jornal de Coimbra, Expresso e Tal & Qual), até deitar âncora na Universidade, doutorando-se em Comunicação Social e fixando-se como professor e investigador.

“A língua nunca é uma questão fechada. Mas temos de ter normas para nos entendermos”, diz Dinis, em jeito de preâmbulo ao desabafo de quem, como ele, não acha graça ao desleixo em curso na escrita que não é propriedade privada dos alunos -  a confusão entre o s e o ç levou Vara a escrever “suspenção” e um jovem professor a dirigir-se, por escrito, ao “Concelho Científico”.

O baralhanço entre o verbo estar e ter – “eu tive em Londres” -  foi a mãe do desabafo: “Quem dá assim erros devia, de castigo, traduzir para linguagem SMS um diário inteiro do Torga!”.

Duas alunas engraçaram com a ideia, puseram o dedo no ar e iniciaram a empreitada de tradução de 27.882 palavras (114.796 caracteres) do Diário XII de Torga (diarioxii.blogspot.com), que viria a ser completada por duas miúdas do 10º ano.

Intragável, a palavra que Dinis arranjou para caracterizar o resultado final deste trabalho, não se adequa, de maneira nenhuma ao magnífico entrecosto que deitamos abaixo num restaurante que estava cheio como um ovo - sábado é dia das famílias irem almoçar fora.

O Diário XII ficou intragável em linguagem SMS por que foi escrito num tempo em que os ponteiros do relógio andavam mais devagar e as professoras não eram tratadas por stôras. Também seria intragável a visão de um Cavaco de brinco na orelha, calções à guna abaixo dos joelhos, All Stars roxas e com o nome Maria, em caracteres chineses (arranjados pelo Fernando Lima), tatuados no antebraço.

Mas, como nos avisou o Dylan, os tempos estão a mudar. 1 500 SMS por semana sabem a pouco a uma maioria de adolescentes que preferem mandar mensagens aos amigos do que estar a falar com eles de viva voz. Impregnada de oralidade, simplificada, enriquecida com smileys que sinalizam o estado de espírito, a linguagem usada no Twitter e SMS veio para ficar. O operador inglês dot.mobile traduziu para linguagem SMS as principais obras da literatura britânica.

“A esferográfica Bic foi trocada pelo teclado. Não tarda muito a serem precisas aulas para ensinar caligrafia aos adolescentes”, concluiu Dinis, que ficou triste L quando soube que, no final de um lauto almoço, tinha de empurrar o meu carro que ficara sem bateria. Só ficou feliz J quando me viu pelas costas ;-).

 

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

 

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D. Duarte II

Rua de Moçambique 34, Coimbra

8 bolinhas de carne … 4,00

2 entrecosto com arroz de feijão malandro… 22,00 euros

1 Quinta de Cabriz branco … 9,00

Total … 35,00 euros

Cuidar dos mortos, enterrar os vivos

Gosto muito dos filmes em que entra o John Cusack. O primeiro que vi foi Grosse Point Blank, uma espectacular comédia de corrosivo humor negro, em que ele faz de Martin Blank, um assassino profissional a precisar de Prozac, que, a pretexto de um reunião do curso, regressa a Grosse Point, pequena cidade do Michigan. 

Nesta fita é tudo bom, desde o trocadilho do título (point blank quer dizer à queima roupa) até à Minnie Driver (no papel de ex-namorada e DJ da rádio local), passando pela banda sonora, que abre com o arrasador “I can see clearly now”, de Johnny Cash, inclui Brahms, Bowie e The Cure, e está recheada de canções escritas por Joe Strummer, dos Clash.

Como sou tão fanático pelos livros do Nick Hornby como ele é pelo Arsenal, não perdi a adaptação ao cinema de Alta Fidelidade, feita por Stephen Frears, com o Cusack na pele de Rib Gordon, dono de uma loja de música que só vende discos de vinil e está à beira da falência, um azarado aos amores viciado em fazer listas de cinco mais qualquer coisa.

Eu também tenho a mania das listas e não tenho dúvida nenhuma de que Being John Malkovich, de Spike Jonze, faz parte do meu top ten de filmes favoritos. No delirante argumento de Charlie Kaufman, Craig Schwartz (Cusack), um desempregado que vai trabalhar como arquivista no sétimo andar e meio de um prédio (onde todos têm de andar curvados) e descobre uma porta de acesso a uma estadia de 15 minutos dentro da cabeça de John Malkovich. Um filme que nem sequer precisava da Catherine Keener para ser uma verdadeira moca!

Apesar de gostar muito do John Cusack, ainda não decidi se vou ou não ver o 2012, em que ele faz de escritor divorciado mal sucedido (ganha a vida como motorista de limusine) que se vê na contingência de ter evitar o fim do mundo.

Quem ouve Medina Carreira ou lê João César das Neves não precisa de ir ver o filme de James Cameron para se sentir a bordo do Titanic quando faltavam 20 minutos para a meia noite de 14 de Abril de 1912 e o paquete chocou com um iceberg a 640 km da Terra Nova.

Quem lê nos jornais que o desemprego ultrapassou a barreira dos 10% (e vai continuar a subir) e os défices estão descontrolados não precisa de ir ao cinema para ver um filme catástrofe, porque já está a viver um.

Quando em 1775, Lisboa foi destruída pelo terramoto, o Marquês do Pombal aproveitou a catástrofe para lançar as bases de uma cidade moderna e próspera. É desta visão estratégica que precisamos. E, para começar, temos de deixar de cuidar dos mortos e enterrar os vivos. Porque parar de escavar é a regra número um para quem está metido num buraco e quer sair dele.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

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