É preciso mudar de medicação
Tenho um método simples e infalível para não me desiludir, que consiste em nunca me iludir. Só se desilude quem previamente se iludiu. Ao recusar a ilusão adquiri um seguro imbatível que me protege do terrível sofrimento da desilusão.
Inicio a minha mensagem de Ano Novo aos leitores do JN, que tão generosamente me beneficiam com a sua atenção, partilhando este truque, válido para todas as esferas da nossa vida, mas inútil relativamente ao ano que está a dar os primeiros passos.
OCDE, Governo, Banco de Portugal, Comissão Europeia e todos os outros organismos que ousam insultar o futuro tentando prevê-lo foram unânimes no alerta. Os tempos que se avizinham são péssimos. 2013 vai ser pior que 2012 . Mais desemprego e menos apoios sociais. Menos salário e mais impostos.
O céu vai estar carregado de nuvens negras, de acordo com todos os boletins meteorológicos dos economistas.
Em face de tantos e tão credenciados avisos, não há lugar a ilusões e só por hábito e cortesia é que desejamos Bom Ano a amigos e conhecidos. Sabemos que o mais certo é que 2013 seja um ano mau.
Apesar de, por princípio, ser avesso a ilusões, também não sou daquelas pessoas que olham para os dois lados antes de atravessar uma rua de sentido único.
Não tenho com a vida mal-entendidos que me levem a ser pessimista. Sei que a unanimidade nem sempre é consensual. E já aprendi que prever o futuro olhando para o passado é partir do princípio que as condições vão permanecer constantes - ou seja, é exatamente a mesma coisa que guiar um carro a olhar apenas para o retrovisor.
Por isso, recomendo que olhemos para a estrada à nossa frente, não deixando que a árvore das caneladas entre S. Bento e Belém, que vão ter de ser dirimidas pelo Tribunal Constitucional, nos distraiam e toldem a visão da floresta.
E olhando para a frente com olhos de ver, quer-me parecer que mais lá para o fim deste ano, talvez após as eleições alemãs, o médico vai convencer-se que o doente até está a portar-se mais ou menos bem (tem feito dieta, toma os remédios e esforça-se por adotar um estilo de vida mais saudável), mas o tratamento não está a dar os resultados esperados, pelo que talvez seja melhor mudar a medicação.
Até porque, como nos ensinou George Bernard Shaw, o progresso é impossível sem mudança e aqueles que não conseguem nunca mudar de ideias não podem mudar nada.
E se algures entre a 7.ª e a 8.ª avaliações da troika, o médico alemão se convencer de que é melhor prescrever um tratamento diferente ao paciente português, apesar de eu não ser dado a ilusões, acredito que este 2013, que começou como o ano das Tormentas, acabe por se transformar no ano da Boa Esperança.
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no JN