Olhe, por favor, para a cara das empregadas da Loja das Sopas
Sou um fã da Loja das Sopas. Parece-me bom negócio pagar 4,70 euros e receber em troca uma taça de salada (com feijão, pepino, tomate, beterraba, feijão, etc) regada com azeite, uma sopa, um pão e uma água – e ainda a consciência tranquila por ter optado por uma refeição saudável.
A Loja das Sopas é um exemplo das novas e bem sucedidas cadeias de restaurantes que fazem surf em cima da onda crescente de preocupação dos cidadãos com a forma física e com que lhe põem no prato .
O segredo reside na hábil combinação entre a tendência dominante no comportamento social com os eficazes métodos e organização das marcas tradicionais de “fast food”, como a McDonald’s e a Pizza Hut.
O sucesso da Loja das Sopas baseia-se na capacidade de tatuar a etiqueta “saudável” na sua imagem. O resto já tinha sido inventado: comida barata, padronizada, servida rapidamente.
A Loja das Sopas é uma das faces visíveis do triunfo do fenómeno “low cost” que está a revolucionar as economias ocidentais, transferindo o poder dos produtores para os consumidores.
Este mundo - em que almoçamos na Loja das Sopas, viajamos na Ryanair, compramos o sofá na Ikea, vestimo-nos na Zara e lemos os jornais gratuitos – está a dar razão a Américo Amorim, o homem que ganhou o seu primeiro par de sapatos quando acabou a escola primária e construiu a maior fortuna deste país usando como lema a máxima “mais do que zero é muito”.
A moda “low cost” é uma epidemia que contagiou todas as esferas da actividade económica.
A procura dos carros “low cost” (marca Dacia) da Renault na Europa obrigou o fabricante francês a aumentar a capacidade de produção e a construir uma nova fábrica. A Fiat, Toyota e Honda também estão a preparar-se para criar marcas de baixo custo.
Na aviação, a galopante conquista de quota de mercado pelas “low cost” a obrigou companhias tradicionais a adaptarem-se às novas regras. Na sua luta pela sobrevivência, a TAP está a investir um milhão de euros numa segmentação em quatro categorias diferentes da tradicional classe económica, um movimento que tem como objectivo captar os passageiros que acham que “mais que zero é muito” e querem pagar o mínimo possível.
A globalização ajudou à massificação desta nova classe de consumidores que exigem serviços e produtos a preços reduzidos.
Para não morrerem afogadas pela maré “low cost”, as empresas portuguesas estão obrigadas a baixar os seus custos de produção. Para que as nossas empresas se mantenham competitivos num Mundo em que o poder está na carteira dos consumidores, o Governo não pode ceder na flexibilização da legislação laboral.
Da próxima vez que passar numa Loja das Sopas olhe, por favor, para a cara das pessoas que lá trabalham e tente adivinhar se alguma delas tem contrato para a vida e ganha horas extraordinárias.
Jorge Fiel
Esta crónica foi publicada no Diário de Notícias