O problema dos sacos de plástico
Como estava distraído, só quando chegou a minha vez de pagar é que descobri por que é aquela fila do Jumbo de Gaia tinha menos gente do que as outras. Era a eco-caixa, uma invenção dos génios de marketing do grupo Auchan com o objectivo de ir habituando a freguesia a pagar dois cêntimos por cada saco de plástico.
Deram-me um folheto verde, onde se anunciava que “hoje é um bom dia para começar a mudar o Mundo” e se apresentava os novos sacos de dois cêntimos como “maiores, mais resistentes, reutilizáveis, totalmente degradáveis e com um processo de decomposição mais rápido e menos poluente”.
Os sacos “oxo-degradáveis” podem ser mesmo uma maravilha, mas eu senti-me enganado. E não foi por causa dos dois cêntimos. Hoje em dia já nem os arrumadores se dão ao trabalho de apanharem do chão as moedas escuras e pequeninas. Não. O que me desagradou foi a absoluta falta de criatividade da operação.
Não tenho absolutamente nada contra as tentativas das empresas de passarem custos para os consumidores. Estão no papel delas. O que eu exijo é que elas façam bem as coisas.
Quando o Lidl desembarcou em Portugal com o seu conceito de “hard discount” definiu, logo à partida, regras claras. Os preços são baixos, mas a variedade é diminuta e os sacos pagam-se. Ninguém vai lá ao engano.
Não vou ao Lidl se quero comprar pimentos recheados com barriga de atum. E quando lá vou, faço-me acompanhar de um saco azul do Ikea para transportar as compras.
O caso do Pingo Doce foi mais complicado, já que se tratou de mudar as regras a meio do jogo (os clientes estavam habituados a sacos de plástico de borla), e a venda dos sacos era parte integrante de uma mais vasta operação de reposicionamento da cadeia.
A admirável maestria com que os responsáveis do grupo Jerónimo Martins colocaram o Pingo Doce a combater o Lidl no segmento “discount” (com a vantagem das lojas serem mais agradáveis) e os hipermercados (juntando aos preços baixos a conveniência da localização) merece ser caso de estudo nas escolas de negócios. Passou a cobrar os sacos mas em troca deu preços mais baixos e afagou-nos o ego ecológico.
O Pingo Doce foi pioneiro no uso da retórica verde e ecológica para convencer a clientela a aceitar, com um sorriso nos lábios, pagar pelos sacos. Foi um enorme sucesso já que repassou custos para os clientes ao mesmo tempo que conseguia um real impacto ecológico, já que o consumo de sacos caiu brutalmente.
Dois anos depois, a Auchan tinha de fazer mais e melhor do que uma cópia desajeitada da estratégia da Jerónimo Martins. É tudo uma questão de dar e receber. E o Jumbo quer receber sem dar nada em troca.
Eu não gostei da minha experiência na eco-caixa pindérica, pateticamente emoldurada num pórtico verde ao estilo dos que assinalam as chegadas das etapas da Volta a Portugal em bicicleta.
Não dei os dois cêntimos pelo saco “oxo-degradável”. A lata de feijão preto, o triângulo de brie e a baguete foram conviver com os jornais no saco a tiracolo que a Aldo me deu há meia dúzia de anos. E resolvi escrever esta crónica.
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias