Alda Telles
Alda Telles, directora geral da Fonte, sonhou ser hospedeira e arquitecta antes de fazer Economia na Nova e arranjar no jornalismo o seu primeiro emprego à séria. Após três anos na revista Futuro, em que entrevistou Bill Gates e o pai do primeiro bebé proveta português, resolveu ir tratar do seu próprio futuro e desembarcou no então incipiente mercado das agências de comunicação
Loura, fala francês e fuma Ritz
Alda fuma Ritz por razões estéticas e profissionais. Não é preciso usar óculos para descortinar o lado estético da coisa. Desenhada em 1970 por António Garcia (que também vestiu outras marcas míticas, como os SG, nas suas variantes Filtro, Ventil e Gigante, High Life, Monserrate, Sintra e Kayak), a embalagem dos Ritz é realmente muito atraente.
A razão profissional conta-se em duas penadas. Alda fumava Lucky Strike, por razões estéticas e afectivas. Também não é preciso usar óculos para constatar o lado estético. Concebida em 1940 por Raymond Lowry (designer industrial que assinou marcas da Shell e Coca Cola, bem como os rótulos das sopas Campbell), a embalagem dos Lucky Strike é terrivelmente sexy.
A razão afectiva para ela fumar Luckies, tal como Mike Hammer (o duro detective que se farta de levar porrada nos policiais de Mickey Spillane), tem a ver com uma lenda sobre a origem do nome da marca, Lucky Strike, um trocadilho que traduzido para português tanto pode significar golpe de sorte como greve bem sucedida.
Reza a lenda, contada a Alda, que a marca foi criada pelos grevistas de uma tabaqueira que misturaram restos de tabaco existentes na fábrica e o comercializaram para arranjarem massa para aguentarem a greve. A lenda não deve ser verdadeira, pois a marca nasceu em 1853, quando os garimpeiros da corrida ao ouro na Califórnia precisavam mais de um golpe de sorte que os operários das tabaqueiras norte-americanas de financiamento para greves selvagens….
Voltando às razões profissionais para ela fumar Ritz, é preciso explicar que esta marca pertence à Tabaqueira (que após as vicissitudes decorrentes da sua privatização foi parar ao regaço da Phillip Morris), que desde tempo imemoriais faz parte da carteira de clientes de Alda.
Um belo dia, no meio de uma reunião, ia dando uma coisinha má ao CEO norte-americano da Tabaqueira, quando Alda acendeu um Lucky Strike (marca da concorrente British American Tobacco). Quando se recompôs, pediu-lhe que não voltasse a fumar tabaco da concorrência na sua presença. Ela mudou-se para o SG Gigante.
“Eu consumo os produtos dos meus clientes”, assegura Alda Magalhães Telles, 47 anos, directora geral e maior accionista da Fonte, consultora de comunicação onde a Euro RSGC detém 30% do capital desde 1995.
Filha de um industrial de metalurgia ligeira, nasceu no Campo de Ourique e tem levado a vida dentro de um quadrado com não mais de um quilómetro de lado, abrangendo a Estrela (onde a Fonte tem sede, no 60C da rua de S.Bernardo, ao lado da holding dos Espírito Santo), Amoreiras e Lapa (onde mora).
Não toca piano, mas é senhora de francês fluente e educação esmerada, prendas que não são estranhas ao facto de ter estudado do liceu francês, dos cinco aos 17 anos, onde foi colega de Rita Blanco.
Teria uma dúzia de anos quando começou a ganhar para os seus alfinetes dando explicações aos miúdos do prédio, actividade, que mais para o final do liceu começou a acumular com a realização de inquéritos de rua para a Marktest.
Teenager, começou por sonhar ser hospedeira do ar (na altura era uma profissão com glamour), antes se decidir a ir para Arquitectura. Acabou por corrigir a rota, seguindo para Economia. Quando entrou na Nova, em 1981, o curso ainda cheirava a fresco – a primeira fornada de licenciados ainda não tinha saído.
Ir trabalhar para um banco ou para o INE eram as saídas mais óbvias para uma jovem licenciada em Economia, em 1986, o ano em que Portugal foi recebido na CEE. Como nenhuma destas perspectivas a seduzia, andou com o nariz no ar até descobrir que no INESC ia ser leccionado um curso, de nove meses, financiado pelo Fundo Social Europeu, sobre a gestão em ambiente de ninhos de empresas.
Era mesmo aquilo que ela queria: ganhar competências na área da gestão, num curso dado por bons professores (como Emanuel dos Santos, secretário de Estado do Orçamento, ou Luis Filipe Pereira, o ex-ministro da Saúde que agora lidera o grupo Efacec) que tinha como cereja em cima do bolo o facto de ser pago (40 contos/mês).
Estava a acabar a formação quando tropeçou numa oportunidade de trabalhar nos media, sector que desde miúda a maravilhava. “Sempre gostei de jornais e revistas, que comecei a devorar quando tinha 11 a 12 anos, por alturas do 25 de Abril. De manhã, o meu pai lia o Diário de Notícias. À tarde era o Diário de Lisboa. E levava muitas revistas lá para casa, como o Paris Match. Lembro-me de passar as férias a ler números antigos da Plateia, Flama, Século Ilustrado…Sempre gostei de coisas vintage e tive a mania de guardar tudo e mais alguma coisa”, confessa Alda, que colecciona caixas de fósforos, pacotes de açúcar, imagens de Madonnas, isqueiros Zippo, e por aí adiante.
Jorge Nascimento Rodrigues abriu-lhe as portas do fantástico mundo da Comunicação Social ao convidá-la para ser jornalista na Futuro, uma revista mensal de divulgação científica, onde se demorou três anos, foi coordenadora de Redacção, trabalhou com jornalistas veteranos como Luís Marques e Virgílio de Azevedo, e aproveitou por dar uma perninha no caderno de Economia do Expresso, dirigido por Jorge Wemans.
Ter conhecido Bill Gates, em Madrid, e ser a primeira a entrevistar Pereira Coelho, o médico que foi o “pai” do primeiro bebé proveta português, são algumas das recordações mais fortes que guarda da incursão pelo jornalismo.
Fundou a Ipsis, com o apoio de dois investidores, no final dos anos 80, desembarcando no mercado, ainda incipiente, das agências de comunicação em que Luis Paixão Martins (LPM), Madalena Martins e Carlos Matos (Imago) e Joaquim Letria foram os pioneiros.
“Era mais fácil do que agora. Havia imenso caminho a desbravar, mais dinheiro e menos concorrência – não havia concursos, era tudo ajustes directos. E as relações com os meios eram mais simples. As agências ajudaram a crescer o jornalismo económico de empresas e negócios, ao facilitar o acesso dos jornalistas às fontes”, afirma Alda.
Em 1991, após ter constatado que as irremediáveis divergências que a separavam dos investidores (“nunca perceberam que as pessoas são o mais precioso activo neste negócio” a apresentou-lhes uma proposta de MBO (Management Buy Out). Eles recusaram e por isso Alda foi à vida dela, fundando a sua própria consultora de comunicação, que baptizou Fonte.
Jorge Fiel
Esta matéria foi publicada na edição de Novembro do Briefing
“Não repares na secretária”
O gabinete é suficientemente amplo para albergar uma bicicleta e uma vuvuzela, vários posters (já amarelecidos..) de equipas campeãs do Sporting (que partilham as paredes com quadros da pintora Maria João), um confortável sofá preto de cabedal com um tapete afegão aos pés - e a inevitável mesa redonda de reuniões. “Não repares na minha secretária”, disse Alda, um pedido difícil de atender, já que a sua enorme mesa de trabalho está apinhada de livros, CDs, DVDs, dossiers, deixando apenas livre o espaço para se movimentar o teclado do computador. Casada com um advogado que faz as compras lá para casa no super do Corte Inglês, Alda tem um filho de 15 anos, que frequenta escola alemã, e adora viajar. As últimas férias foram passadas entre Atenas, Santorini e Creta. Nas próximas pode ser que vá pela terceira vez à Índia.