Há um novo jornalismo que se chama fazer o que se quer, e o título que se quer, desde que venda.
Esta primeira página do Correio da Manhã é um desses casos. Lendo-se a peça há uma citação atribuida a um "actual dirigente", nem diz se é da SAD ou do clube e que critica a "passividade".
Eu, que conheço bem os métodos que se utilizam no CM, admito até que nenhum dirigente do FC Porto falou ao jornal - mas o porteiro também serve, para esta gente. E, se falou, e se criticou a passividade, estava a criticar o quê, se o o FC Porto ainda não podia ter feito mais do que fez, que foi dar a notícia - em primeira mão, aliás, o que é de notar.
O título de dentro é, aliás, igualmente notável: "Dirigentes criticam passividade". Ora, só há lá notícia - a ser verdade - de um dirigente. E nem se diz que é da SAD. Mas, como sempre, o CM não deixa que os factos atrapalhem um título para vender. Esses são os métodos de Octávio Ribeiro. Um dia ainda alguém vai fazer a históroia deste ano sw siewxção do jornal.
O Correio da Manhã há muito que ultrapassou os limites do jornalismo já nem digosério, digo apenas com um mínimo de vergonha, em relação ao "Apito Dourado". Ontem até falava em irradiação de dirigentes e árbitros, quando isso já não é possível no desporto portuguêshá muito tempo. Vale tudo e ai de quem queira fazer uma rectificação (estou a falar de jornalistas de lá, do Correio da Manhã).
E relembro apenas uma coisa: nos casos em que a justiça desportiva puniu árbitros por determinadas actuações, nunca puniu clubes nem dirigentes destes. Posso relembrar o caso de Inocêncio Calabote, de um Benfica-Sportig mais recente. Nesses casos nunca houve, aliás, escândalos públicos.
Apesar de a notícia ter aparecido meio escondida em alguns meios de Comunicação Social lá se ficou a saber , muito a custo , que o famoso processo das agressões ao ex- vereador socialista de Gondomar , Ricardo Bexiga , voltou a ser arquivado . Por falta de provas.
Para quem tem memória curta eu recordo que este foi o primeiro processo reaberto pela superequipa de Procuradores capitaneada pela dra Maria José Morgado , na sequência de umas tonitruantes declarações de Carolina Salgado , que coincidiram com a campanha de lançamento do livro que o presidente do SLB , ao que consta ,comprou aos milhares e agora anda a ver se despacha metendo -os às grosas nas malas dos carros dos clientes que lhe aparecem na empresa.
O que é preciso perguntar a quem de direito é porque é que foi tomada a decisão de reabrir um processo que estava encerrado por causa de uma entrevista e não sei quanto tempo depois se volta a arquivar com a justificação que as declarações da senhora ( que até confessavam a sua putativa participação ..) não trazem nada de novo aos autos.
Vistos os factos aquilo que era o mínimo exigível era vermos a senhora dra Morgado vir a terreiro reconhecer a sua precipitação ( que está muito na moda ) pedindo desculpa a quem incomodou e lamentandop as expectativas criadas que não conseguiu cumprir.
Bem ao contrário , o que a senhora dra Morgado fez , a crer nas notícias dos jornais que não vi desmentidas , foi atirar -se aos seus colegas do Porto imputando -lhes a culpa do fracasso por uma investigação incompetente realizada na altura dos factos.
Para além de a senhora dra , manifestar uma opinião altamente duvidosa sobre os seus colegas de trabalho teve toda a facilidade em tomar conhecimento dessa terrível e castradora incompetência sem precisar de reabrir o processo. Ou era preciso reabrir o processo para dar enquadramento e contexto à campanha que então desencadeou. ?
É que convém lembrar que o processo agora rearquivado era o único que aparentava ter uma gravidade especial , bem diferente das palhaçadas das frutas e dos cafés com leite com que se continua a gastar o dinheiro dos portugueses por causa de o Benfica ter perdido a hegemonia do futebol português há mais de 30 anos.
Van Gogh não passou a noite em branco para pintar a sua célebre Noite Estrelada
O pessoal da PJ pode não ser dotado de grandes aptidões para a investigação criminal mas alardeia uma brilhante imaginação criativa no baptismo das suas operações.
Não posso deixar de apresentar os meus mais sinceros parabéns ao (à) inventor (a) da Operação Furacão.
Se tivermos em conta os resultados, não podemos deixar de pensar que teria sido mais prudente e adequado apelidá-la de Operação Brisa -ou até mesmo Operação Corrente de Ar.
Mas nota-se que quando foi cunhada a operação a intenção dos padrinhos era magnífica, a de semear um rasto de destruição e devastação nos bancos e grandes companhias que se divertem a ganhar ao Fisco no jogo das escondidas.
Valha-nos a intenção, apesar de todos estarmos carecas de saber que o Inferno está repleto delas (das boas intenções).
Não posso esconder a inveja que sinto pelos agentes da PJ que crismaram a Operação Apito Dourado.
Trata-se de um nome feliz, que compreende uma conotação erótica (o apito é da cor do chuveiro na expressão inglesa «golden shower» que designa a bizarra prática sexual de urinar em cima de outrém), como convém a um caso onde abundam a fruta e os pingos escuros – bem como outras variedades de café com leite.
Se eu, por um daqueles acasos em que a vida é fértil, decidir torrar na inauguração de um bar de alterne a massa que o Expresso me pagou para se ver livre de mim, não hesitarei um micro-segundo em baptizá-lo Apito Dourado. Com a devida vénia aos génios da PJ.
Até me parece que já estou a ver o letreiro luminoso, com um enorme apito dourado a piscar em cima de um cesto de fruta copiado de uma natureza morta do Cezanne.
Não posso deixar de aplaudir, de pé, a argúcia e bom humor que se dissimulam por detrás do baptismo da operação em curso, Noite Branca, desencadeada com o benemérito intuito de colocar um ponto final à criminalidade violenta que tem sacudido a noite portuense.
Em primeiro lugar, saúdo o saudável sentido de humor do padrinho, que estava perfeitamente consciente de que os agentes envolvidos na operação iriam passar uma data de noites em branco, por causa da Operação Noite Branca.
Depois, descortino na escolha do nome uma cifrada sugestão enviada ao cuidado de Rui Rio, para que ele imite a iniciativa do seu homólogo parisiense e promova anualmente no Porto uma noite branca.
Assino por baixo a sugestão. Por um daqueles acasos em que a vida é fértil (não sei porquê mas estou convencido que já não é a primeira vez que uso esta expressão J ) eu estava em Paris no dia da primeira noite branca.
Foi uma coisa em grande. Todos os monumentos nacionais e edifícios públicos estiveram de porta aberta durante toda a noite.
Aproveitei para subir , de borla, até ao topo da Notre Dame, onde estão os aposentos do Corcunda. E assisti a uma irrepetível sessão de leitura de poesia numa repartição de Finanças no Marais.
Para conferir uma visibilidade extra a esta meritória iniciativa, o «maire» gay de Paris, Bertrand Delanoe (amigo íntimo e de longa data de António Monteiro, o nosso embaixador em Paris) deixou-se apunhalar, a meio da noite, no Hotel de Ville, no meio de um multidão de testemunhas.
Atirando para trás das costas as recordações parisienses, resumindo e baralhando. Os PJ até podem ser desajeitados na investigação criminal. Mas são exímios no que toca a baptizar operações e sempre que as coisas resvalam do estreito terreno da realidade para o fértil território da ficção.
Moita Flores, o ex-inspector da PJ reconvertido em prodigioso argumentista de telenovelas, é a prova dos nove do que acabo de escrever.
Há uma semana, a magistrada Maria José Morgado teve uma frase que, que eu desse conta, passou em claro aos analistas: "Os tribunais julgam os casos, mas os casos também julgam os tribunais".
Mizé Morgado falou assim numa longa entrevista ao Diário de Notícias em que até disse que era do Norte e o seu pai era um adepto fanático do FC Porto. As opções clubísticas são de cada um e ninguém tem nada com isso.
Mas aquela frase surge num contexto do Apito Dourado e das suas investigações. E como me parece que os tribunais plenários acabaram há mais de trinta anos, uma magistrada, mesmo do Ministério Público, dizer o que disse Maria José Morgado é altamente discutível, para dizer o mínimo.
O que a dra. Morgado está a deixar entender é que se não houver condenações no caso, os seus colegas juizes que vierem a fazer parte do colectivo não terão feito bem o seu trabalho. Eu, simples jornalista, posso dizê-lo; ela, magistrada, mesmo que do MP. e ainda mais parte interessada no caso porque trabalhou nele, não pode. Ou pelo menos não deveria dizê-lo porque deveria observar um dever de reserva. Porque o que eu entendo do que ela diz é que não se pode ter inteira confiança na Justiça.
A dra. Maria José Morgado é, hoje por hoje, a magistrada mais mediática do país e a que melhor utiliza os jornais. Mas não tenho dúvidas que se outro magistrado qualquer, de província por exemplo, se permitisse dizer algo assim, iria ser chamado à pedra.
Ao derrotar o Marselha, no Dragão, por 2-1, o FC Porto assumiu a liderança isolada do grupo A da Champions e tem praticamente garantida a passagem à fase seguinte da prova.
Ao perder com o Celtic, em Glasgow, por 1-0, o Benfica isolou-se no último lugar do grupo B e depende de um milagre para poder continuar nas competições europeias.
Ao empatar com o Roma, no Alvalade XXI, por 2-2 o Sporting consolidou o terceiro lugar do grupo F e não deve deixar escapar a qualificção para a Taça UEFA.
Este conjunto de resultados vem provar o que espíritos mais perspicazes já alertavam desde o Prater de Viena, em 1987, o Olímpico de Sevilha, em 2003, e a Arena de Gelsenkirchen, em 2004.
Está à vista de todos. O monstruoso processo Apito Dourado tem ramificações internacionais.
A procuradora geral ajunta Maria José Morgado não pode esperar nem mais um segundo. Tem de avisar a Interpol e denunciar esta medonha conspiração internacional que tem epicentro na mafiosa cidade do Porto!
Metam já (ou pelo menos quanto antes) as palavras chave «fruta» e «café com leite», declinadas em todas as línguas dos países filiados na UEFA, no sistema pan-europeu de escutas telefónicas a árbitros.
Carolina Salgado, João Botelho e Margarida Vila Nova, na Adega Kais, em Lisboa, no jantar comemorativo do final da rodagem de «Corrupção». Na altura o filme tinha mais 17 minutos
Estávamos em Janeiro de 2005. O jogo com o Trofense era importante demais para ser encarado com ânimo leve. Por isso, o presidente do Lixa telefonou a Pedro Sanhudo logo que soube que ele tinha sido designado para arbitrar esse encontro do campeonato da II Divisão B.
Cantou-lhe a canção do bandido. Como o jogo era muito importante para o Lixa, será que ele, Sanhudo, poderia dar um jeitinho? E será que ele estava precisado de alguma coisa?
O árbitro embarcou. Disse que sim. Não ele, pessoalmente. Mas a Associação dos Árbitros do Baixo Tâmega, por ele presidida, não tinha frigorífico. O presidente do Lixa declarou o assunto resolvido. Teria todo o gosto em oferecer um frigorífico, com arca!, à associação. Jeito por jeito.
Chegou-se a domingo e o Trofense ganhou. O presidente do Lixa liga a Sanhudo, que, com voz comprometida, desdobra-se em explicações. «Como viu, ó presidente, eu não pude fazer nada. A sua equipa não ajudou. O que é que eu podia fazer?». O presidente não deu mostras de ter ficado lixado, Aceitou as explicações. E sossegou o árbitro. Não voltaria com a palavra atrás. A Associação dos Árbitros do Baixo Tâmega ia ter um frigorífico. Oferecido por ele.
Este episódio, documentado por escutas telefónicas, é a base de um das centenas de processos do Apito Dourado. Em Março, a procuradora Maria José Morgado deduziu a acusação contra o presidente do Lixa(um homem de palavra) e Pedro Sanhudo, o árbitro que não podia fazer mais do que o que fez.
Vem a história do frigorífico da Associação dos Árbitros do Baixo Tâmega a propósito da corrupção, um tema que tem andado entre as bocas do Mundo e as primeiras páginas dos jornais.
Ainda recentemente ficamos a saber que Portugal desceu dois lugares, de 26º para 28º num total de 180 países analisados, no Índice de Percepção da Corrupção, um ranking elaborado pela Transparency Internacional que classifica os países segundo o eventual grau de corrupção do sector público.
Não me custa a acreditar no crescimento da corrupção entre funcionários públicos e políticos em Portugal. É o preço que temos de pagar pelo inevitável processo de democratização do poder de decisão que eleva o número de pessoas susceptíveis de serem corrompidas.
O que nunca me tinha passado pela cabeça é que esta democratização do poder estivesse avançada ao ponto de um capitão de fragata e um sargento da Amada terem sido formalmente acusados de corrupção passiva por uma empresa que pretendia vender mísseis Seasparrow e Harpoon para as fragatas da classe Vasco da Gama.
Nas vésperas das decisões políticas da atribuição de grandes obras (como o novo aeroporto de Lisboa e o TGV), decisivas para grupos económicos poderosos, convinha focarmos a vigilância na transparência destes processos, por forma a que não haja dúvidas de que ninguém usou a sua posição e/ou os recursos públicos em benefício pessoal ou do partido – em vez de dispersarmos a atenção por manobras de diversão e «faits divers» como o do frigorífico da Associação dos Árbitros do Baixo Tãmega.
Jorge Fiel
PS: Esta crónica foi redigida para o diário económico Oje, onde vai ser publicada e amanhã