Catarina Alves
Sem o saber, o irmão mais novo mudou-lhe a vida ao levar para casa da família, em Monção, uma cachorrinha rafeira que achara na rua. Ela tinha 14 anos, um bom coração, e apaixonou-se por animais para todo o sempre. Trocou o sonho de ser pediatra pelo de ser veterinária, que acabaria por transformar em realidade na UTAD. Em Vila Real, fez amizade com outra Catarina e o Miguel, sócios na aventura de criarem o seu próprio emprego abrindo uma clínica veterinária no Grande Porto
A cachorrinha rafeira que mudou
a vida da rapariga com bom coração
Nome: Catarina Alves
Idade: 32 anos
O que faz: Médica veterinária e Sócia da Clínica Veterinária de Águas Santas (Maia, Porto)
Formação: Licenciada em Medicina Veterinária
Família: Casada (o marido é gestor) sem filhos, mas com dois gatos, o Gatuso (que ela tirou da rua) e uma gatinha vadia que uma senhora entregou na clínica e ela adoptou. De vez em quando, os gatos recebem a companhia da Graf (uma rafeira que a clínica adoptou no primeiro dia de actividade) e do Tobias (um Epagneul Breton, que era do pai do seu sócio Miguel, e como era muito medroso era péssimo para a caça). “Quando ficam lá em minha casa, dormem junto com os gatos e o Gatuso dá-lhes a boas vindas com turras nos focinhos”
Casas: Apartamento em Águas Santas
Carro: VW Golf na versão carrinha para transportar os cães e gatos
Telemóvel: Nokia
Portátil: Asus
Hóbis: Viajar, jantar fora e ir ao cinema (“Pelo menos de 15 em 15 dias vamos ao Arrábida, que preferimos porque com 20 salas dá mais escolha”)
Redes sociais: Tem Facebook mas não vai lá todos os dias
Férias: Passa sempre 15 dias em Caminha, onde a família tem casa. Em Setembro, usando como pretexto a irmã estar a fazer um mestrado no Norte de Itália, deram uma volta de carro que começou em Milão e acabou em Veneza, com escalas no Lago Como, Suíça e Áustria. Em Maio vão a Marraquexe – já têm a viagem comprada na Ryanair
Regra de ouro: Todos os dias é preciso fazer algo para “mimar” a felicidade.
A culpa foi do irmão mais novo que levou lá para casa uma cachorrinha, adorável e completamente rafeira, encontrada na rua. Catarina tinha 14 anos e apaixonou-se pela cadela, baptizada Pipa. Ela já estava habituada a dar-se com a bicharada, pois o avô tinha uma quinta com cavalos e cães. Mas era a primeira vez que tinha a seu cargo a vida e conforto de um animal doméstico. Dois anos depois da Pipa (já falecida), adoptaram a Guga, achada a vagabundear pelo meio da linha de caminho de ferro em Caminha.
Os animais vieram para ficar na vida de Catarina, nascida há 32 anos em Monção, a capital do vinho Alvarinho, filha do meio do matrimónio de uma professora primária com um advogado – a mais velha seguiu a carreira do pai, especializando-se em Direitos Humanos, enquanto o mais novo, o que a viciou em animais, se quedou pela terra natal, dirigindo A Terra Minhota, um jornal fundado há 60 anos pelo avô.
A meio da adolescência, Catarina já tinha uma ideia bastante clara sobre a sua vocação. Como queria auxiliar os seres humanos indefesos, que não sabem como pedir ajuda, começou por encarar a hipótese de ir para Medicina e depois especializar-se em Pediatria, antes de mudar a agulha e tomar a solene de decisão de ser médica veterinária.
Como o último teste de Química lhe correu muito mal e os 17,2 valores de média se revelaram curtos para entrar à primeira em Medicina Veterinária, na UTAD, inscreveu-se em Zoologia por onde passou por um cometa antes de ser aceite, na 2ª fase, em Novembro, no curso que queria. “Fui praxada duas vezes”, conta, em jeito de balanço dos danos colaterais da pequena desgraça que foi o último teste de Química não lhe ter corrido bem.
Mudou de Monção (Minho), para Vila Real (Trás-os-Montes), onde cedo fez amizade com outra Catarina (Silva) uma rapariga do Porto que se tornaria namorada (primeiro), mulher e sócia (depois) de Miguel (Mateus), um rapaz de Tomar.
Enquanto andavam na universidade, várias vezes os três falaram na hipótese de fazerem juntos uma clínica. Mas se fossem desafiados a isso, não apostariam dinheiro em como esse sonho se viria a tornar em realidade.
No final do curso, os caminhos dos três amigos bifurcaram-se. A nossa Catarina e Miguel estagiaram, durante um trimestre, para a Washington State University, em Seattle (EUA), enquanto a outra Catarina viajou para Barcelona.
De regresso a Portugal, arranjaram uns biscates nem muito atraentes nem especialmente bem remunerados (Catarina, por exemplo, fazia as tardes na Clínica Catassol). Um belo dia, estavam à conversa no café Velasquez (Porto), onde paravam, quando desenterraram o velho projecto de fazerem a sua própria clínica.
Começaram por pensar ir para Leiria. Depois reconsideraram o pressuposto inicial que não havia mais espaço para mais uma clínica veterinária no Grande Porto. Fizeram e refizeram as contas, bateram a todas as portas em busca de apoios, gastaram solas à procura de um local, até reunirem os 200 mil euros necessários para transformar em clínica um antigo stand de automóveis, em Águas Santas, Maia.
“Achávamos que as coisas iam ser mais fáceis”, confessa Catarina, olhando para os quase seis anos que se passaram desde a abertura da clínica, a 25 de Julho de 2005. Não foi fácil. Mas as centenas de gatos (com infecções urinárias ou vitimas de quedas) e de cães (com problemas de pele ou vitimas de atropelamento) que trataram compensam largamente esses espinhos.
Jorge Fiel
Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias