Se forem ao YouTube e pesquisarem "Did you know" encontram diferentes versões de um vídeo maravilhoso, recheado de dados reveladores do frenético ritmo dos tempos em que vivemos. Uma das coisas que mais me impressionaram foi ficar a saber que as dez profissões mais procuradas em 2010, nos EUA, não existiam em 2004 - o que equivale a dizer que estamos a preparar estudantes para empregos que ainda não existem, em que usarão tecnologias ainda não inventadas para resolver problemas que ainda nem sequer foram colocados.
Estes tempos exponenciais, de novas novidades e desvairadas mudanças de vidas e de costumes (frase roubada ao cronista Rui de Pina), obrigam-nos a nunca parar de aprender e a habituar-nos a conviver com a incerteza e a precaridade.
Refletindo sobre esta matéria, cheguei à conclusão de que os pequenos e médios meliantes são um dos grupos que mais depressa atingiram a excelência na capacidade de adaptação a estes novos e difíceis tempos. Senão, vejamos.
Como as agências bancárias reduziram a um mínimo insignificante o dinheiro que têm em armazém e equipam os cofres com sofisticados sistemas de alarme e abertura retardada, os ladrões redefiniram como alvo os Multibanco, que é onde agora estão as tão desejadas notas.
Como a cotação do ouro não para de subir (é o valor refúgio em épocas de crise), os ourives passaram a figurar entre os alvos preferenciais dos assaltantes.
Como os carros que vale a pena roubar não são os Clio, Punto e Corsa, em que os deputados da nação não querem andar, mas sim os Audi, Mercedes e BMW que todos os "parvenus" adoram - e estão num patamar tecnológico que não vai em cantigas de ligações diretas - os gatunos inventaram o carjacking, o roubo de viatura com condutor para lhe extorquir a chave/cartão que aciona a ignição.
Como a trepidante industrialização chinesa inflacionou o mercado internacional de matérias-primas, os bandidos desataram a gamar tudo quanto lhe cheire a cobre, latão ou outro metal em alta - tampas de saneamento, placas de trânsito, campas, etc..
A quem possa ficar chocado com este elogio aos pequenos e médios ladrões, recordo que eles desenvolvem a sua atividade desprovidos do mínimo apoio do Estado e do QREN (ou qualquer outro financiamento comunitário), na mais estrita observação da mais pura das regras do mercado (a lei da oferta e da procura) e com todos os riscos por sua conta - ao contrário dos tipos das PPP que têm o lucro garantido pois nós, os palermas dos contribuintes, alombamos com o risco por eles.
Eu, que em 56 anos de vida tive mais problemas com polícias do que com ladrões, tenho mais simpatia pelos pequenos e médios ladrões, que roubam os ricos, do que pelos ladrões de impostos, que vivem à nossa custa, sejam eles banqueiros desonestos ou políticos corruptos. São gajos que dão mau nome à classe dos ladrões.
Tenho uma pequena carteira de acções: 7300 Sonae SGPS, 912 Sonae Capital, 466 Impresa, 310 EDP Renováveis e 250 Santander. Valia 7 673 euros a 31 de Janeiro.
Este dinheiro dava-me agora jeito para ajudar a pagar as obras num andar que comprei. Mas custa-me liquidar, a cotações de saldo, uma carteira que a 31 de Janeiro de 2008 valia 13 881 euros (sem as 310 EDP R!).
Não há drama. Posso financiar as obras sem tocar nas acções. Mas me deixassem, fazia com a Caixa um negócio tipo Fino. Vendia a carteira à Caixa por 14 mil euros, salvaguardando o direito de a recomprar nos próximos três anos. O problema é que tenho tantas hipóteses de ser bem sucedido neste negócio como uma bailarina com uma perna de pau.
Estou a ver a cena. Chegado ao balcão, dizia ao que ia e a cara da bancária (preferia que fosse uma mulher) abria-se num largo sorriso e dizia-me: “O senhor está a querer-se armar em Fino!”. Depois explicava-me que o negócio era impossível porque não devo dinheiro à Caixa e a verba em causa é ridícula – para o caso poder mudar de figura, teríamos de acrescentar-lhe dois zeros à direita.
Fino pode vender 10% da Cimpor à Caixa por mais 62 milhões do que valem, porque a astronómica quantidade de dinheiro que deve provocaria rombos enormes nas contas de uma data de bancos, se eles tivessem de assumir que ele não pode pagar.
A explicação de Teixeira dos Santos para esta operação até nem é má – evitou uma perda de 80 milhões pela Caixa, em 2008. Só pecou por não ter usado o verbo adequado: em vez do evitar, deveria ter utilizado os verbos mascarar, camuflar ou esconder.
Os bancos sabem que ninguém está falido enquanto as pessoas não souberem que está falido. Por isso, usam as garantias do Estado e o dinheiro dos contribuintes para maquilharem os erros do passado e manterem créditos zombies artificialmente vivos.
Berardo deve mil milhões de euros a três bancos (CGD, BCP e BES), que usou para comprar 6,2% de um deles (BCP), onde acumulou perdas potenciais de 800 milhões de euros – superiores à contribuição dos EUA para a reconstrução da Faixa de Gaza. Esta notável performance foi premiada com o congelamento do pagamento de juros durante quatro anos e o prolongamento do prazo dos empréstimos.
O BCP tem 10% da Teixeira Duarte (TD), que tem 7,5% do BCP, cujo fundo de pensões tem 10% da Cimpor, onde a TD tem 23,3% (dos quais 5% dados como colateral à Caixa, que está em força nos cimentos). Em face desta teia, é mais provável o Estado português abrir falência do que a TD, que deve dois mil milhões de euros.
É por estas e por outras que o crédito está a ser negado a empresas viáveis, que a banca está a estrangular ao não lhes acudir aos problemas de tesouraria.
É por estas e por outras que dói no coração assistir à falência de grupos exportadores, como o corticeiro Suberus, que a banca asfixiou ao retirar-lhe o crédito operacional.
Os banqueiros que se cuidem. Se não arrepiam caminho, qualquer dia o Bonnie & Clyde volta a ser um filme de culto - e o El Solitário e o gangue das Perucas são os novos Robin dos Bosques.