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Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Nós só queremos Lisboa a arder

Há alguns anos (não muitos), com os ânimos incendiados pela vã tentativa do estado-maior benfiquista de quebrar a hegemonia portista com manobras na secretaria, esteve em voga a palavra de ordem "Nós só queremos Lisboa a arder".

A provocação não caiu no goto da generalidade dos residentes na capital, pelo que amiúde alguns lisboetas, meus amigos ou conhecidos, perguntavam-me se também eu achava bem a ideia de pegar fogo à sua cidade.

"Não. Lisboa é uma bela cidade. O que defendo é o uso de uma bomba de neutrões, de modo a preservar o magnífico património edificado". Foi esta a resposta que formatei para dar nessas ocasiões. Quando a pergunta não é séria, sinto-me desobrigado de responder a sério.

Neste novo século, trabalhei oito anos em Lisboa, uma das mais bonitas cidades do Mundo, pela qual é muito fácil uma pessoa ter uma paixão fugaz e à primeira vista.

Estou imensamente feliz por o JN me ter proporcionado voltar a viver na cidade que amo e onde nasci, mas não posso negar que, de vez em quando, ainda sinto uma pontinha de saudade de alguns pequenos prazeres que Lisboa pode oferecer, como um fim de tarde no miradouro da Graça, petiscar ao almoço uma sanduíche de rosbife e um copo de branco no terraço do Regency Chiado, ou tomar o café matinal na esplanada da Ponta do Sal, em S. Pedro do Estoril.

Quando alguém é incapaz de diferenciar se estamos a falar em sentido estrito ou figurado, geram-se situações embaraçosas e terríveis mal-entendidos. Ninguém quer mesmo Lisboa a arder. O que queremos a arder, num fogo purificador, é a governação centralista que empobrece o Norte e desgraça o país.

O modelo centralista de pôr todas as fichas em Lisboa, partilhado por todos os partidos do arco da governação, é o responsável por 2000-2010 ter sido a pior década de Portugal desde 1910-20 - anos terríveis em que vivemos uma guerra mundial, golpes de Estado e a epidemia da gripe espanhola.

Na primeira década deste século, o crescimento médio anual da nossa economia foi de 0,47%, apesar do afluxo diário médio de seis milhões de euros de Bruxelas, que valiam todos os anos 2% do PIB.

Já ultrapassado pelo Alentejo e Açores, o Norte é a região mais pobre do país, apesar de ser a que mais contribui para a riqueza nacional, com 28,3% do PIB, logo a seguir a Lisboa e Vale do Tejo, com uns 36% enganadores, já que aí está contabilizada a produção feita noutras partes do país pelas grandes companhias nacionais e multinacionais com sede na capital.

Quando leio que ao abrigo do famoso efeito de dispersão - uma vigarice inventada para desviar para Lisboa fundos comunitários - dinheiro destinado às regiões mais pobres está a ser usado pelos serviços gerais e de documentação da Universidade de Lisboa, dá-me vontade de ir para a rua gritar "Nós só queremos Lisboa a arder".

Não. Nós não queremos mesmo Lisboa a ser consumida pelas labaredas. O que queremos é dizer que estamos fartos de ser chulados e já é tempo de impedir que Portugal continue a arder em lume brando, por culpa de governantes incompetentes ou corruptos.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Jornal de Notícias

Um buraco chamado Lisboa

Olhado de cima e visto em perspectiva, Portugal é como um bilhar snooker que descai sempre para um buraco chamado Lisboa, que absorve, bulímico, os recursos humanos e materiais do resto do país.

Olhado de cima e visto em perspectiva, Portugal é como um bilhar snooker que descai sempre para um buraco chamado Lisboa, que absorve, bulímico, os recursos humanos e materiais do resto do país.

O problema não é novo. Quem leu a "Queda de um anjo", de Camilo, sabe que este maléfico magnetismo já era poderoso mesmo num século como o XIX onde o Porto liberal, invicto e vitorioso da Guerra Civil, viveu um dos períodos de maior esplendor da sua história.

Ao nacionalizar os grupos económicos que viviam à sombra da protecção do Estado Novo, o 25 de Abril abriu o espaço para a emergência, a Norte, de uma nova geração de empresários, de que Belmiro de Azevedo e Américo Amorim são as cabeças de proa, que mudaram a face do país.

O poder económico deslocou--se para Norte, onde uma impressionante multidão de PME produtoras de bens transaccionáveis salvaram, com as suas exportações, o país da bancarrota.

Os empresários do Norte não ficaram à espera das privatizações e aventuraram-se a criar os primeiros bancos privados (BPI e BCP) após a revolução, numa altura em que os velhos capitalistas ainda mantinham bens e famílias na Suíça e no Brasil.

Cavaco pôs um ponto final a esta fase de desenvolvimento harmonioso e liberal da economia do país ao usar o programa de privatizações para fazer renascer os grupos engordados à mesa do salazarismo. Nenhum analista político e económico honesto deixará de identificar a década cavaquista como o período em que os portugueses, anestesiados pela chuva torrencial de dinheiro vindo de Bruxelas, consentiram na construção de um estado ultracentralista e fecharam os olhos ao nascimento de dois monstros (o do défice e o da Função Pública).

Fernando Gomes foi o líder que capitalizou a nível político o poder económico da região, que já se deslocava para o buraco negro lisboeta. A proclamação pela UNESCO do Centro Histórico do Porto como Património da Humanidade, o metro do Porto, o Parque da Cidade, o Porto Capital Europeia da Cultura, a Casa da Música são as marcas deste período áureo da metrópole que, com o seu porto de Leixões e aeroporto Sá Carneiro, é a cabeça natural da mais empreendedora região do nosso país.

Apesar de ser o líder respeitado de uma região e de estar informado das desventuras na capital do fidalgo minhoto Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda (o herói da novela camiliana), Fernando Gomes não resistiu ao cântico das sereias lisboetas e na primeira oportunidade trocou a vista da Avenida dos Aliados pela do Terreiro do Paço, com o resultado conhecido (o suicídio político).

A contínua migração para Lisboa de líderes e massa cinzenta tem de deixar de ser uma fatalidade.

Para ressurgir, a Região Norte precisa de políticos que olhem para o Porto, Aveiro, Braga, Guimarães, Viana do Castelo, Bragança, Viseu, Guarda e Vila Real como pontos de chegada - e não como pontos de partida.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no JN

Um bilhar que descai para o buraco Lisboa

 

Em 1671, para casar a filha, Catarina de Bragança, com Carlos II, de Inglaterra, D. João IV, que, “apesar de restaurador, era burro como, em geral, os reis eram” (cito o meu amigo Luís Miguel, catedrático nesta matéria), incluiu no dote as cidades de Tanger e Bombaim. Mesmo acreditando que a Catarina fosse ainda mais pavorosa que a prima do Frankenstein e a maga Patalógica juntas, parece-me excessivo, até mesmo escandaloso, o dote que o papá rei providenciou.

Em 2010, para justificar o injustificável facto do PS estar a faltar mais uma vez à palavra dada aos eleitores em duas legislativas, o ministro das Finanças veio candidamente, com aquela lata que é marca de água dos políticos mentirosos (passe a tautologia), lavar dai as mãos explicando que o adiamento para as Calendas do TGV Lisboa-Porto-Vigo “é um gesto de aproximação do PSD”.

Ou seja, Teixeira dos Santos, que, apesar de ser de nortenho é trampolineiro como, em geral, os ministros são (digo eu), usa, majestático, no século XXI, os parolos do Norte como dote para obter o apoio (incerto e desnecessário) do PSD ao documento ficcional apelidado PEC, da mesma maneira que D. João IV usou Bombaim e Tanger para desencalhar a filha feiosa.

Ultrajado é pouco para expressar o que sinto face ao desprezo centralista com que é tratado o Norte, a mais pobre região do país, apesar de ser a segunda que mais contribuiu para a riqueza nacional. Em vez de tentar corrigir as assimetrias, o Governo de Lisboa só as agrava. As dotações do PIDACC (plano de investimentos da administração central) para o Porto levaram este ano um corte de quase 300 milhões de euros (caindo de 351 para 55 milhões), enquanto que para Lisboa subiram 27%, de 264 para 327 milhões.

Sou favorável ao princípio do utilizador-pagador (acho mesmo que o tipo que inventou as Scuts devia ser enforcado), mas não percebo porque é portuenses que viajam até à Póvoa do Varzim vão ter de pagar portagem e os algarvios, que usam a Via do Infante, e os lisboetas, que viajam até Sintra, estão dispensados dessa maçada.

Das grandes obras públicas referendadas nas legislativas 2009, sobreviveram três – o novo aeroporto de Lisboa, a terceira travessia sobre o Tejo em Lisboa e o TGV Lisboa-Madrid -, que não precisaram de ser sacrificadas no altar do entendimento com o PSD. Fica no tinteiro o TGV para o Porto e Vigo. Não é preciso por mais na carta para toda gente perceber que vivemos num país que é tal qual como um bilhar que descai sempre e escandalosamente para o mesmo buraco, chamado Lisboa.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

Cheira mal, cheira a Lisboa

Tenho o nariz torto. A narina esquerda não funciona. Infelizmente, esta surdez parcial do meu olfacto não me protege do fétido fedor que sevicia quem passa ao largo de Aveiro. Falo do mau cheiro literal, não do figurado - do negócio do sucateiro Zé Godinho ter quartel general em Esmoriz, de Oliveira e Costa ser de Esgueira, e Vara e os Penedos serem visitas frequentes de Aveiro, onde mantêm longas conversas com o juiz de instrução criminal.

Se trapalhadas e negociatas obscuras libertassem realmente um odor pestilento, não se podia passar perto de Aguiar da Beira e os carteiristas do eléctrico 28 estavam no desemprego, pois a podridão do ar nos mais belos e ricos bairros de Lisboa afugentaria os seus 2,5 milhões de turistas.

A fábrica de Cacia da Portucel é a origem do fedor que tortura os automobilistas viciados na A1 e os passageiros económicos e/ou ambientalistas do Alfa. Há coisa de 15 anos, quando visitei esta celulose,  comprovei a enorme capacidade humana em se adaptar a circunstâncias adversas. Achei que o almoço era a ocasião certa para fazer a pergunta. Fartos de a ouvir, os anfitriões responderam pacientemente que algumas semanas bastavam para concluir o processo de dessensibilização - e deixarem de sentir o cheirete.

Esta fantástica capacidade para comermos num ambiente de latrina preocupa-me muito, principalmente nesta altura em que para decifrarmos os casos de actualidade é preciso ter um curso de Direito (e dos bons, aqueles da Independente não chegam). Só assim compreendemos as nuances da arquitectura de um sistema judicial canceroso e sabemos traduzir para português um dialecto judicial atulhado de “atentados ao Estado de Direito”, “elementos probatórios”, “irrelevância criminal”, “denegação de justiça”, “medidas de coação”, “expedientes administrativos” e “emissões de certidões”.

Temo que, tal como os trabalhadores da Portucel de Cacia, nós, os portugueses, nos dessensibilizemos e deixemos de sentir o fedor a podridão da pandemia de escândalos a que estamos sujeitos. Por isso, ou estes políticos conseguem reduzir drasticamente a quantidade de lixo que produzem e arranjam um eficiente tratamento da sua porcaria (dotando-se de um sistema subterrâneo de esgotos e de uma ETAR na periferia, longe dos nossos olhos), ou o melhor é darmos ouvidos ao conselho de Eça de Queiroz: “Os políticos e as fraldas devem mudar-se com frequência – pela mesma razão”.

Não me apetece viver num país que cheira como uma casa de banho que continua em uso apesar ter o autoclismo avariado – e em que não consigamos ouvir a marcha “Cheira bem, cheira a Lisboa” sem nos escangalharmos a rir às gargalhadas.

Jorge Fiel

Esta crónica foi publicada hoje no Diário de Noticias

É preciso vender o Porto em Lisboa

As dormidas de estrangeiros no destino Porto e Norte de Portugal cresceram 4,1% face a 2007, que já tinha sido considerado “um ano excepcional”.

Este aumento nas dormidas reflectiu-se positivamente nas receitas turísticas, que subiram 3,8%.

A revitalização do Sá Carneiro é a mãe e o pai destas boas notícias. Abandonado pela TAP, o aerporto do Porto recebeu uma fantástica injecção de adrenalina administrada pelas low cost.

Entre 2003 e 2008, ao número de comapanhias aéreas a voar para o Porto mais do que duplicou (passou de sete a 16, enquanto que as rotas cresceram 140% (passaram a ser 56).

Mas o novo fôlego a dar ao turismo no destino Porto e Norte exige diplomacia e implica agir no mercado interno.

Para continuar a crescer sustentadamente, temos de fazer um esforço de marketing, concentrado na Área Metropolitana de Lisboa, para atrair turismo interno.

Temos também de ter a coragem descomplexada de integrar o produto turístico Lisboa que é vendido por essa Europa fora. Sugerir aos “short breakers” que visitam a capital que é uma excelente ideia tirarem um dia para darem uma saltada até ao Porto.

Jorge Fiel

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Um método de despistagem de idiotices

Não gosto de clichés. Nunca gostei. Arrepiam-me. É por isso que fujo de ler as crónicas que os jornalistas (e ofícios correlativos) lisboetas escrevem quando regressam de uma estadia no Porto.

Não as lia para não me incomodar. Mas agora arranjei um método infalível de despistagem de idiotices, com a ajuda do software Word.

Antes de me aventurar a ler uma crónica, faço uma busca das seguintes palavras: francesinha, aloquete, cadeado, postura, Aleixo, francesinha e praça de táxis, tripas.

Se tiver apenas duas (ou menos) destas palavras, arrisco uma leitura. Se tiver entre três e quatro ainda fico a pensar. Mais de quatro? Ni hablar!

Desde que inventei este método genial ainda não li mais nenhuma crónica sobre o Porto escrita por um lisboeta.

Jorge Fiel

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Confesso que tenho invejo do Zoo de Lisboa

Amar o Porto não me impede de gostar (e muito) de Lisboa, onde trabalhei durante quase seis dos nos nove anos que leva este atribulado século.

Como portuense invejo algumas das coisas que Lisboa tem.

Uma das coisas que invejo em Lisboa é o seu Jardim Zoológico, sendo que nesta frase se compreendem os dois sentidos: o literal e o figurado.

Invejo em Lisboa o Zoo de Sete Rios, a que todos os anos faço questão de levar o meu filho João. É bom uma pessoa poder-se meter no metro e  desembarcar num parque onde pode ver ao vivo leões, girafas, hipopótamos, rinocerontes, camelos, macacos, elefantes e preguiças.

Invejo ainda em Lisboa o cosmopolitismo que herdou do facto de ser a capital de um império desfeito – a mistura de raças e culturas, a diversidade de gentes e costumes.

Foi com base num cruzamento de culturas diversas (o famoso melting pot) que a América se tornou grande.

Jorge Fiel

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Pinto Monteiro não pode andar por aí a queixar-se que tem medo de sair à noite em Lisboa

 

O Procurador Geral da República (PGR) tem um ar simpático, é um excelente comunicador e tem um jeito muito seu de colocar na agenda mediática os dossiês que o preocupam.

 

Esta semana, Fernando Pinto Monteiro aproveitou um aparentemente anódino encontro organizado pela Associação dos Antigos Aluno da Lusíada de Lisboa para discorrer sobre crescente sentimento de insegurança que se apoderou dos portugueses, apesar do número de homicídios ser cada vez menor.

 

Na opinião do PGR o medo dos cidadãos filia-se no novo tipo de criminalidade e deu exemplo desta mudança de perfil: “Antigamente roubavam os carros que nós deixávamos nos parques. Agora roubam-nos com as pessoas lá dentro”.

 

O PGR teve ainda o engenho a série televisiva  mais vista em todo o Mundo para desculpabilizar eventuais atrasos e falhanços da sua equipa: “É como aquela série CSI. Encontra-se um cabelo e descobre-se o criminoso. As pessoas exigem que o Ministério Público actue assim”.

 

Pinto Monteiro, que até a este ponto tinha brilhado em grande altura, borrou a pintura quando no final da charla resolveu confessar que tem medo de sair à noite em alguns locais do centro de Lisboa, dando como exemplo o Cais do Sodré.

 

Nestas questões da segurança e dos direitos dos cidadãos, o PGR não é um treinador de bancada que se pode dar ao luxo de dizer que tem medo de sair à noite em Lisboa ou que ouve uns estalidos esquisitos de no telefone, que indiciam que pode estar sob escuta. Nestas matérias, Pinto Monteiro é mesmo o treinador e por isso não devia andar por aí a queixar-se pelas esquinas.

 

Jorge Fiel

 

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4050-327 Porto e 1250-149 Lisboa serão dois códigos postais de uma mesma região?

Para Florida a Foz fica em Lisboa

A passagem por Lisboa do guru norte-americano Richard Florida abalou seriamente algumas das minhas convicções sobre a geografia da minha vida e do meu país.

Confesso que não conhecia Florida, um rapaz com a minha idade mas muito mais curriculum (foi professor do MIT e Harvard e mantém colaborações regulares no Financial Times e no New York Times), citado com alguma frequência por Sócrates - o que equivale a dizer que está completamente na moda.

Deslocações semanais entre duas cidades pontuam a minha vida. Terça feira, às 9.47, apanho em Campanhã o Alfa para Lisboa, onde fico a trabalhar durante a semana. Domingo, faço o percurso inverso, embarcando no Intercidades das 9.30.

Florida veio explicar-me que afinal eu estava enganado e não divido a vida entre duas regiões. O norte-americano puxa bem para cima (uns bons 600 quilómetros) a fronteira norte de uma Lisboa imensa que, do seu ponto de vista, se estende ao longo da costa atlântica  desde Setúbal até à Corunha, e que é uma das 40 megaregiões mundiais - a 34ª, à frente de Xangai, Madrid, Berlim ou Singapura .

Esta ideia é sedutora, ao arrumar na mesma gaveta as minhas viagens semanais de comboio entre o Porto e Lisboa e as deslocações pendulares diárias entre S. João do Estoril e a avenida da Liberdade (suburbano mais metro).

Suplementarmente, a ideia de Florida tem o condão de fornecer a solução para um problema que ele próprio me tinha criado com o enunciado de uma outra tese sua: “O trabalho desloca-se até as pessoas e não o contrário”.

Uma pessoa tem de ter formatos preparados para responder às FAQ da nossa vida. Por isso, quando amigos e conhecidos me comentavam, em tom levemente interrogativo,  “Então, de volta a Lisboa…?!?” eu respondia: ”É! A vida é assim. O pescador vai pescar onde há peixe”.

Ora este meu  “sound byte” contraria aparentemente o edifício teórico de Florida, já que se trata de um desdobramento do ditado do Maomé (ou seja o pescador, isto é eu) a ir ter com a montanha (ou seja a pesca, i.e. o trabalho) e não o contrário, como pretende o guru de Sócrates.

Mas a contradição é apenas aparenea já que à luz da geografia de Florida eu não mudei de região. Ele jura que a rua Júlio Dinis, 4050-327 Porto e a  para a avenida da Liberdade 1250-149 Lisboa são apenas códigos postais diferentes no interior da mesma mega-região.

Mas agora que estou iluminado pelas ideias avançadas de Richard Florida, poderei brindar os amigos que mais prezo com uma resposta mais bem elaborada.  Preparem-se. A próxima vez que me disserem “Então de volta a Lisboa…!?!” vão levar na volta do correio com um resumo das teorias de Florida, que não se esgotam na tese das mega-regiões.

Florida brilhou ainda a grande altura ao reformular a velha tese de que Portugal é Lisboa e o resto é paisagem (na sua versão  “Portugal é formado por dois países; Portugal e Lisboa”). E garante que o desenvolvimento das cidades é directamente proporcional à quantidade de gays e lésbicas que alberga (Berlim e Paris, governadas por gays, estão no bom caminho).

Jorge Fiel

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Esta crónica foi publicada no Diário de Notícias

 

 

 

O Foz Velha e a Lisboa pequena


(Uma das salas do Foz Velha)


Estive recentemente no Foz Velha no jantar do quinto aniversário - aqui vão os parabéns atrasados para o chefe Marco Gomes e a sua Carla. Já se sabe que se come divinalmente naquela casa e em dia de aniversário é... de cair para o lado com tantos sabores.

Acontece que na minha mesa ficaram, claro, outros ilustres comensais, como a Estela Machado, da RTP, que há-de ser a minha professora de golfe quando eu me dedicar a esse desporto.

Não divagando demasiado do que aqui me traz, prossigo. Na mesma simpática mesa estava também um simpático casal lisboeta, o dr. Cabanelas e a mulher, a viver no Porto há salvo erro 23 anos. Mas, dizia o dr. Cabanelas, "a minha mulher não gosta disto, nunca se adaptou". Seria do frio, seria da chuva, que vento não era certamente e atrevi-me a perguntar à simpática senhora. A resposta foi implacável:

"Aqui as pessoas é só casa-trabalho-casa!".

Pois claro, estamos na cidade do trabalho, assim reconhecida até por alguém da melhor sociedade lisboeta.

Mas há mais. Conta o dr. Cabanelas:

"Vim há 20 e tal anos por três meses para estagiar no prestigiado instituto do prof. Guimarães dos Santos e fui ficando. Mas no dia em que cheguei, era véspera de feriado e fiquei logo admirado porque estava toda a gente a trabalhar. E disse logo: além de médico também sou engenheiro. Engenheiro de pontes!". Não percebi à primeira, mas percebi logo à segunda: "Nunca trabalho nas pontes!".

E por isso, o nosso caro e simpático médico ficou por cá - sempre conseguiu fazer pontes...

E por aqui se vê como é difícil para alguns lisboetas adaptarem-se ao clima cá de cima. É que por cá trabalha-se!

Mas isto pega-se, asseguro-vos. O próprio dr. Cabanelas me explicou que a filha, que veio para cá pequenita e hoje é naturalmente grande e trabalhadora, já não tem esses problemas e adora o Porto.

A lição, óbvia: não é de nascença, mas é preciso catequizá-los de pequeninos. Aí ficam tão bons como nós.

Manuel Queiroz

 

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