O Metro do Porto é um curioso sistema de transporte público, já que é um três em um, ao acumular as funções de comboio suburbano (na linha da Póvoa), de metro ligeiro de superfície (na linha de Matosinhos) e de metro convencional subterrâneo (no atravessamento da Baixa e das zonas de traçado urbano mais antigo).
O Governo e a administração do Metro têm razão quando dão prioridade à linha do Campo Alegre sobre a da Boavista, pois é no eixo atravessado pela Diogo Botelho que estão as zonas de maior densidade populacional, os bairros da Pasteleira, Pinheiro Torres, Aleixo e Condominhas, bem como a Universidade Católica e um pólo da Universidade do Porto.
O Governo e administração do Metro não têm uma pontinha de razão quando querem poupar uns euros ao impor uma solução em que a Linha do Campo Alegre seguiria à superfície de Matosinhos até às Condominhas, o que implica deixar uma feia cicatriz na face do Vale do Fluvial e retirar a dimensão de largo e agradável boulevard à nova Via Nun’Álvares.
Enterrem-no, porra! Quando se faz uma coisa de novo é conveniente fazê-la bem, logo à primeira.
Derrapagem é palavra que os panditas da burguesia lisboeta bem pensante (um enorme saco onde convivem - mas a viverem em casas separadas - gente como Maria Filomena Mónica, António Barreto, Fernando Rosas e ofícios correlativos) adoram usar quando se referem às obras emblemáticas do Porto, como o Metro ou a Casa da Música.
O único problema é que, no exercício do seu legítimo direito a escarnecer dos pacóvios, não raro se esquecem de que as palavras e os números têm contextos.
Se, por exemplo, a primeira fase da construção do Metro do Porto custou mais x do que o y que estava inicialmente previsto, mas foram, no entretanto, acrescentados mais quilómetros de linha e novas estações ao projecto primitivo, é vigarice dizer que a obra derrapou x.
É deitar areia para os olhos das pessoas agitar os 148,6 milhões de euros de prejuízo registado, em 2008, pelo Metro do Porto, sem explicar que dos 246 milhões de euros que o Estado deve à empresa, de indemnizações compensatórias, apenas transferiu até agora 11,6 milhões.
Para se perceber como é que o passivo do Metro do Porto chegou aos 2,1 mil milhões de euros, é preciso saber que, por exemplo, só no ano passado, a empresa investiu dos 123,8 milhões de euros em obras e compras do veículos, e que a comparticipação do Estado foi apenas de 7,4 milhões.
Os números e as palavras não podem ser usados como pedras de arremesso contra a Regionalização.
Cavaco Silva, outrora o rei do betão, veio chamar a atenção para os excessos que estão a ser cometidos no particular do cimento, advertindo para a necessidade de se investir apenas em projectos que tenham uma relação equilibrada e saudável entre custo e benefício.
No que toca a auto-estradas, a construção e manutenção é um custo, e a quantidade de viaturas que as utilizam é o benefício. Quando o movimento é muito reduzido, o benefício é, por isso, quase nulo.
A este propósito, não me parece que seja de esperar grandes benefícios da existência de três diferentes auto-estradas a ligarem Lisboa ao Porto.
A A1 não só não está saturada como até começou a perder tráfego (menos 8500 carros/dia nos dois primeiros meses deste ano), tendência que é desejável e previsível que se mantenha – e se vai acentuar muito quando sofrer a concorrência do TGV.
Nesse sentido, faria mais sentido canalizar os recursos públicos disponíveis para fortes investimentos nas redes de transportes públicos nas duas grandes áreas metropolitanas.
A extensão a Cabanas, Gondomar, da Linha Azul do Metro do Porto (que esteve três anos congelada por causa das trapalhadas que o Governo arranjou a propósito da composição do Conselho de Administração) terá apenas andou sete quilómetros mas trata-se de um custo que vai gerar uma data de benefício.
As onze novas estações da Linha Azul vão melhorar a qualidade de vida de mais de 80 mil portuenses – 48 mil de Rio Tinto, 14 mil de Baguim do Monte e 22 mil de Fânzeres.
O grupo Barraqueiro, dono da Fertagus (a empresa que explora o comboio na ponte 25 de Abril em Lisboa), anunciou que está a trabalhar há mais de um ano numa proposta para o concurso da segunda concessão do metro do Porto – que é a principal aposta da empresa para 2009.
A Barraqueiro acrescentou que vai analisar uma candidatura à operação de TGV entre Lisboa e o Porto, que, de acordo com o calendário do Governo, deve estar no terreno em 2015.
Perguntado pelo Jornal de Negócios sobre se estava também interessado no TGV Lisboa-Madrid, José Luís Catarino, administrador da Barraqueiro, respondeu singelamente: “Achamos que a ligação Lisboa-Madrid em Alta Velocidade vai ser difícil de rentabilizar”.
Estas declarações - feitas por quem aposta dinheiro no negócio e não deixa a política entrar na equação - são a prova dos nove da rentabilidade do Metro do Porto e da linha de TGV Porto-Lisboa. E uma bofetada na cara dos tolos centralistas que dizem, histericamente, que “TGV para Madrid sim senhor, mas para o Porto, não, que horror, nem pensar, porque vai dar imenso prejuízo…”.
Num dos agitados jantares que pautaram o parto da Bússola, estava em cima da mesa a escolha do local para o anúncio, «urbi et orbi», da boa nova do nascimento deste blogue.
Três hipóteses foram aventadas:
a)Durante uma viagem do Metro do Porto até à Póvoa, numa carruagem alugada para o efeito;
b)Num pequeno almoço no «trendy» bar de alterne Calor da Noite;
c)No interior do Mercado do Bolhão.
A maioria escolheu o Bolhão. Assim se fez.
Apresentamo-nos ao Mundo tendo como cenário a fonte central do mercado e como banda sonora o desbocamento das vendedeiras que cravaram beijos ao Juca (acharam-no ainda mais bonito do que na televisão!) e se encostaram, dengosas, aconchegando-se na enorme solidez do Manel Serrão.
Foi um número. Um número já um bocado gasto, mas de sucesso (mediano) garantido. Não é por acaso que os líderes políticos em campanha eleitoral não dispensam a visita ao Bolhão.
O mercado é colorido e cinematográfico o que, aliado às bocas javardas das vendedeiras (que tratam o vernáculo por tu), garante automaticamente preciosos minutos de televisão nos telejornais. A receita tem-se revelado infalível.
Vem isto a propósito da histeria que se apoderou da cidade a propósito da sábia decisão da Câmara de concessionar o mercado a privados, matando vários coelhos com uma só cajadada – evita que ele venha abaixo e moderniza-o sem ter de nos ir aos bolsos.
A «overdose» de notícias sobre o Bolhão, que infesta as colunas dos jornais e inunda os noticiários televisivos, provocou-me uma alergia ao assunto e impediu-me de me documentar com detalhe sobre o projecto da holandesa TCN.
Mas acompanhei a abertura do dossiê, que já leva alguns anos de existência.
O lançamento concurso público de ideias e projectos para a modernização do Bolhão não mereceu, à época, o mínimo reparo aos «suspeitos do costume»,uma manada onde se distingue a «dramaturga Regina Guimarães» - só falta mesmo lá a infatigável Dona Laura da Associação de Comerciantes para o folclore ficar completo.
Dois candidatos (a Amorim Imobiliária e a TCN) apresentaram as suas propostas e ninguém tugiu nem mugiu.
Agora que o processo está concluído e pronto a ir para o terreno, é que os contestatários de aviário despertaram para o assunto e armaram este banzé, um triste «remake» da «rivolização», que os Media, na sua doce incompetência, aceitaram transformar num lamentável Watergate à moda do Porto - num eco regional do massacre mediático proporcionado pelo desaparecimento da pequena Maddie. Um inferno.
Não conheço em pormenor o projecto da TCN para o Bolhão, mas sei que da demolição das velhas Halles, no coração de Paris, só sobreviveu o típico restaurante «Pied de Cochon», aberto 24 horas por dia.
Sei também que o Covent Garden, um velho mercado transformado em galeria comercial, se tornou umas das principais atracções turísticas londrinas, onde se pode beber um Merlot enquanto se ouve um quarteto de cordas a interpretar ao vivo peças clássicas populares – ou presenciar espectáculos de rua de habilidosos malabaristas.
As cidades não são museus. Não podem ser conservadas em formol. Os tempos mudam. Seria uma tolice enorme e um vão esforço tentar transportar intacto até ao século XXI o Porto do passado, dos barcos rabelos, do Aniki Bobó, das casas sem esgotos, das donas de casa a gritarem água vai antes de despejaram os penicos para a rua.
Só os conservadores e reaccionários não compreendem a urgência e inevitabilidade da mudança.
Por norma, as pessoas resistem à mudança. Mário Soares considerou criminosa a decisão de construir o Centro Cultural de Belém, qualificando-a como um atentado ao Mosteiro dos Jerónimos . Está aí alguém que me contesta se eu disser que o CCB valorizou e enquadrou os Jerónimos?
Os pregadores do imobilismo armaram um enorme pé de vento contra o Cubo que José Rodrigues instalou na Praça da Ribeira, recolheram assinatura contra os molhes que protegem a barra do Douro, maldisseram a arquitectura inovadora e arrojada de Koolhas na Casa da Música e agora protestam contra a largura projectada para a Via Nun’Álvares que ligará a praça do Império à avenida da Boavista.
Os conservadores contestatários não se incomodaram enquanto o belíssimo Palácio do Freixo fenecia.Só despertaram para o destino desta jóia de Nicolau Nasoni quando a Câmara negociou com o grupo Pestana a instalação de uma Pousada de Portugal neste palácio, o que não só permite a sua recuperação e alindamento como dota a cidade de mais um importante trunfo para a atracção de turistas.
Quer-me parecer que se as cassandras catastrofistas mandassem,haveria uma feira de gado na praça D. João I, um mercado de cavalos nos Poveiros,a feira do pão na Praça de Lisboa – e a árvore da forca na Cordoaria.
Acordem! Os centros comerciais e os hipermercados são as novas feiras. Aceitem a mudança. Não sejam ridículos a tentar fazer frente aos ventos dos novos tempos que sopram.
Rui Rio está certo ao recorrer aos privados para tentar recuperar espaços e equipamentos importantes para a cidade e que estão degradados, como o Bolhão, a praça de Lisboa, o Ferreira Borges, o Rosa Mota ou o Bom Sucesso.
Compete aos cidadãos do Porto participar activamente na discussão pública dos projectos apresentados pelos privados, uma atitude de vigilância para garantir a qualidade destas intervenções e a transparência dos contratos de concessão.
PS. Foi minha a proposta vencida que sugeria que a Bússola fosse anunciada durante uma vigem do Metro. Gosto de olhar para a frente. Adoro a História - mas o passado só me interessa para me ajudar aperceber o presente e melhor me preparar para o futuro.
O Metro do Porto é muito mais do que um sistema de transportes e uma empresa estruturante do espaço urbano. É também uma obra de arte, um enorme motivo para termos orgulho em sermos portuenses, e, ainda, uma prova viva e documental do centralismo que asfixia o nosso país.
Concebido por Eduardo Souto Moura, o metro é uma obra de arte premiada internacionalmente, onde estão espalhadas as impressões digitais os nomes mais luminosos da Escola de Arquitectura do Porto, como Siza Vieira, Alcino Soutinho e Adalberto Dias, entre outros.
Tenho para mim que, mais coisa menos coisa, os metros reflectem o carácter das cidades que servem e dos passageiros que os usam.
O metro de Lisboa, onde a sobriedade elegante da pastilha de Maria Keil foi substituída nas estações por decorações concessionadas a artistas de diversas escolas e obediências plásticas, reflecte, na sua incoerência plural, o «patchwork» de uma capital rica num pais pobre e que atraiu como um imã poderoso gentes de todo o país, bem como os enteados, enjeitados e ambiciosos de um Império falido.
O grandioso e luxuoso esplendor das estações do metro de Moscovo glorifica o regime estalinista que as mandou fazer. A ostentação patente em estações como Ploshchad Revolitiusii, Komsomolskaya-Kolttsevaya ou a Mayakovskayasó é possível na capital de um país que foi sempre governado autocraticamente por czares de várias cores.
O metro de Los Angeles, quase exclusivamente usado por hispânicos, documenta a impotência do governo de uma cidade feita em nome do automóvel e assente em falhas geológicas para oferecer uma alternativa de transporte aos ilegais e excluídos que não podem conduzir um carro.
Com as suas estações vestidas quase por igual, com linhas rigorosas e depuradas servidas pelo cinzento do granito, o Metro do Porto é a cara da rudeza da cidade e da simplicidade franca dos seus habitantes. Não engana ninguém.
«Então viestes a Lisboa para poderes andar de metro?!» Perdi a conta às vezes que ouvi esta alegada brincadeira, dita assim ou por outras palavras, da boca de colegas meus quando me encontravam nas minhas deslocações diárias de metro entre Telheiras (onde vivia) e o Marquês (onde era a sede do jornal), no período em que estive em Lisboa a editar a Revista do Expresso.
Os lisboetas usam desbloqueadores de conversa pouco imaginativos quando encontram alguém do Porto. Por regra, desatam a tentar imitar de uma forma boçal a nossa pronúncia («Atão, como vai o Puaartu?»), convencidos que estão a ser tão engraçados como o Ricardo Araújo Pereira.
Felizmente que há cinco anos deixaram de poder fazer humor com o facto do Porto não ter metro.
O Metro do Porto é também um motivo de orgulho de uma metrópole que durante anos a fio sofreu o estigma de não possuir o mais eficaz e moderno dos meios de transporte urbano.
Cinco anos depois, num momento em que a sua rede une as duas principais estações de caminho de ferro (Campanhã e S. Bento), o aeroporto, o Dragão e o El Corte Inglês, não tenho dúvidas de que metro é mais um motivo para termos orgulho em sermos portuenses, a par de Serralves, o Parque da Cidade, do FC Porto, das Caves de Vinho do Porto, do Majestic, do Jornal de Notícias, da Anémona de Matosinhos, da livraria Lello, das tripas, do rio Douro e da Casa da Música e o Metro – só para citar uma dúzia de exemplos de uma lista interminável.
Jorge Fiel
PS. No dia exacto em que se comemora o quinto aniversário sobre o início da operação do metro no Porto, deixo aqui um pequeno extracto de um texto que tive o prazer de escrever para o livro que sublinha esta efeméride – cuja capa ilustra e encima este «post».
Neste dia não posso deixar de exprimir o meu regozijo por a empresa do Metro do Porto ter apresentado um novo desafio pelo qual todos nós estamos obrigados a lutar – a construção da nova linha circular subterrânea que sirva os bairros populosos.