Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Bússola

A Bússola nunca se engana, aponta sempre para o Norte.

Notícias da cauda

Bonjour,

O meu pequeno-almoço preferido em Paris é na Ladurée, da Madeleine. A versão básica inclui um pão, um croissant, um pain aux raisins e um brioche, manteiga, frasquinhos de compotas e mel, bem como a escolha de uma bebida fria (opto sempre pela acidez do sumo de toranja em detrimento do de laranja) e outra quente - chá, café ou chocolate (não tão grosso quanto o espanhol, em que a colher quase consegue ficar de pé, mas bem mais saboroso).

O petit-déjeuner Ladurée não é barato, mas é uma experiência que recomendo a todos, até pela sala Império e a freguesia, uma mistura de adolescentes russas endinheiradas e velhas sul-americanas ricas com franceses/as bon chic bon genre. Imperdível.

Domingo, constatei que para beneficiar deste pequeno luxo não se paga só em dinheiro (18 euros por cabeça), mas também em tempo, pois esperamos 25 minutos na queue (fila) por uma mesa.

Queue foi a palavra-chave destas miniférias do Carnaval. Sábado, o voo da Ryanair aterrou em Beauvais por volta das 10.00, mas já passava das 13.00 quando chegámos a Paris, porque o nosso lugar na queue não nos habilitou a embarcar no autocarro das 10.30 para a Porte Maillot. Tivemos de aguardar estoicamente ao frio na queue até chegar o das 11.30.

À tarde, na paragem de autocarro, na Bastilha, demorámos meia hora a perceber que o 69 não ia chegar - uma manifestação interrompera o seu percurso. Por isso, fomos de metro até à hora e meia de queue para comprar os bilhetes para a Torre Eiffel.

Segunda-feira, em dez horas da Disneyland, conseguimos entrar em dez actividades, o que dá a aterradora média de 57 minutos de queue por três minutos de diversão. Caríssimo, pois há que acrescentar a este preço os 70 euros da entrada e do bilhete de RER. Muito mais baratos foram os 50 minutos investidos terça de manhã na queue para o Museu d'Orsay. Proporcionar aos nossos filhos a experiência de dúzias de Cézannes, Van Goghs, Degas e Rousseaus vale bem os oito euros da entrada (que não pagámos, beneficiando das borlas para menores de 12 anos, estudantes 18-25 anos e jornalistas) e o mesmo tempo de espera que a pífia Casa Assombrada da Disneyland.

Como temos de tirar partido de todas as situações, mesmo as adversas, nesta viagem aprendemos:

a) A língua dá-nos pistas que não raro negligenciamos: não é por acaso que os franceses usam o patientez quando nos põem à espera;

b) A paciência treina-se, e qualquer ocidental após um dia na Disneyland fica a pedir meças a um chinês;

c) Como o tempo é dinheiro, a fórmula de cálculo do custo efectivo de uma diversão deve contabilizar o tempo investido na queue;

d) Devemos pensar duas vezes antes de resmungar: "Isto só mesmo cá em Portugal."

Au revoir

Jorge Fiel

Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias

Usar a Sainte-Chapelle para elogiar a vigarice

O pessoal quando vai a Paris não falha a Torre Eiffel, espreita a Notre Dâme e o Beaubourg, não dispensa o passeiozinho de bateau mouche, tira uma fotografia junto ao Arco do Triunfo, desce os Champs Elysées a assobiar a canção homónima do Joe Dassin, vagabundeia pelo Marais, inveja as montras da rue de la Paix, opina sobre as pirâmides do Louvre – e até pode arriscar um raide à ala Denon para ver a Mona Lisa e a Virgem dos Rochedos, redouradas com novo banho de popularidade por Dan Brown.

Faz isto tudo e faz lindamente, sendo mesmo de aplaudir os estóicos que não se importam de pagar duas horas e meia na bicha e oito euros para admirarem no Museu de Orsay a mais rica colecção de pintura impressionista e expressionista do Mundo.

Fazem bem em devorar tudo isto, mais o Quartier Latin, o Sacré Coeur, a Concórdia... Mas fazem mal em não reservarem uma hora para se deixarem encantar pela irresistível beleza dos vitrais da Sainte-Chapelle.

Se nós deixarmos, a luz transparente e colorida coada para o interior da capela, o seu céu estrelado, transportam-nos para sensações irreais, próximas das obtidas numa coffee shop de Amesterdão.

Apesar de não ser masoquista, custou-me que a meio da manhã de domingo, em Agosto, numa Paris habitada por mais turistas do que indígenas, tenha entrado na Sainte Chapelle dois minutos após lá ter chegado. Praticamente não havia bicha.

A Sainte Chapelle foi mandada fazer por Luís IX para servir de relicário à suposta coroa de espinhos de Jesus, comprada ao imperador de Constantinopla pela exorbitância de 135 mil libras - mais do triplo das 40 mil libras que custou a construção da capela.

Como é bom de ver, o rei beato foi enganado. A coroa era falsa. Mas se não fora a vigarice do Beduíno II, não existiria a Sainte- Chapelle.

Balzac dizia que por de trás de cada fortuna há um crime. Eu acrescento que por de trás de cada maravilha pode existir uma vigarice.

Não consegui apurar se há vigarice por detrás do Quai de Branly, o mais branché dos museus parisienses. Desconfio dos métodos usados pelos franceses para reunir a fabulosa colecção de 300 mil estátuas, roupas, máscaras, jóias, instrumentos musicais, etc, da Oceania, Ásia, África e Américas. Mas se não fosse a pilhagem, esta memória poderia ter desaparecido.

A propósito, e como contributo para a minha campanha contra a frase-fado “Isto só cá em Portugal!”, aproveito este elogio velado da vigarice para vos  informar que a Sainte-Chapelle demorou seis anos a ser construída, no século XIII, e que a edificação do Quai de Branly demorou quase o dobro (onze anos) e importou em 250 milhões de euros.

Jorge Fiel

Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2013
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2012
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2011
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2010
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2009
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2008
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2007
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub