O caso das prostitutas gregas
Um dos feitos maiores do cavaquismo, de que o próprio Aníbal mais se orgulhou à época, foi conseguir tirar Portugal da cauda da Europa, quando passámos aos gregos a lanterna vermelha do último lugar na estatística do PIB per capita na UE. Foi uma enorme alegria patriótica mas não durou muito, por causa não só da esperteza dos gregos mas também dos alargamentos que levaram a casa europeia a crescer da antiga dúzia para os atuais 27.
Os gregos sempre foram muito marotos, e em 2006, num golpe de magia abençoado por Bruxelas, aumentaram o seu PIB em 25%, através de uma mudança do método de cálculo da riqueza produzida, que passou a contabilizar o contrabando de tabaco, a lavagem de dinheiro e o valor acrescentado produzido pelas prostitutas.
Esta operação bizarra não foi inédita. Em 1987, a Itália tinha feito crescer o seu PIB em 15% num passe idêntico, que pôs os italianos a serem estatisticamente mais ricos que os ingleses.
Estes aumentos artificiais têm efeitos práticos bastante simpáticos numa data de estatísticas importantíssimas. Ao aumentar em 25% o PIB, mediante a incorporação do suposto valor acrescentado produzido de atividade ilegais, Atenas reduziu automaticamente o défice de 2,4% para 1,9%.
A simplicidade desarmante destes truques contabilísticos obriga-nos a olhar com desconfiança para as estatísticas que nos servem diariamente e estão a transformar a nossa vida num pesadelo - pois só de pensar no futuro ficamos logo com dores de cabeça.
Se o Eurostat autorizasse o INE a reavaliar em alta o nosso PIB, pondo uma lupa em cima do contributo da economia subterrânea, tiraria um grande peso de cima de Vítor Gaspar, que veria facilitada a tarefa de cumprir as metas que prometemos à troika - mas, na vida real, continuaríamos tão pobres ou tão ricos como antes desse exercício de caráter iminentemente ficcional.
As estatísticas valem o que valem - e na maior parte das vezes valem pouco. Sabe como é calculada a contribuição para o PIB de professores, médicos e enfermeiros do SNS, militares, políticos e restantes funcionários públicos? É simples. O contributo deles para a ficção da riqueza nacional medida pelo PIB é calculado pelo que ganham e gastam.
Dito por outras palavras. O recuo do PIB é umas das consequências negativas de um saudável emagrecimento do Estado e diminuição das suas despesas. Ao baixar em 25% o poder de compra dos funcionários públicos, o Governo está também a encolher o PIB!
As estatísticas valem o que valem - e na maior parte das vezes valem pouco, como o demonstra a anedota do homem que casou com a sua mulher a dias. Ela continuou a fazer a mesmas coisas que fazia enquanto era solteira, mas como o homem lhe deixou de pagar, ao passar de patrão para marido, o PIB diminui, apesar de tudo levar a crer que eles ficaram mais felizes.
Moral da história. O que temos a fazer é não levar isso do PIB muito a sério - e sermos felizes.
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no Jornal de Notícias