Filhos e politicos acham que somos uma ATM
Os meus filhos olham-me como se eu fosse um Multibanco privado de que só eles sabem o código de acesso - e convenientemente desprovido de qualquer limite máximo de levantamentos. Uma ATM de sonho, proibida de estar sem dinheiro e de responder que o saldo disponível não lhe permite efectuar essa operação. E estou em crer que isso não acontece só comigo, mas com a generalidade dos pais, o que significa para além rede gerida pela SIBS há por aí, espalhadas pelo país, umas dezenas de milhares de caixas Multibanco informais.
Não posso levar isso muito a mal. Ao fim e a cabo, eles não pediram para nascer, quem os encomendou fomos nós, não importa se reflectida ou irreflectidamente, e por isso temos de pagar - e durante cada vez mais anos - a portagem de os sustentar. Nisto de filhos, não há Scuts.
Mas o caso já pia mais fino quando sinto que há uma data de gente que não conheço de lado nenhum - e a quem não devo favores nem me prendem laços familiares ou outras obrigações -, que vive descaradamente à minha custa, com a mão indevidamente metida dentro dos meus bolsos, tal como os reles carteiristas de estação de comboio.
Por falar em carteiristas, e citando o jovem Penedos, acho um bocado pornográfico que o Governo se prepare para, no próximo dia 1, terminar com os apoios a 186.400 trabalhadores desempregados, enquanto que só o gabinete do primeiro ministro mantém 12 motoristas privados às ordens, e o Estado bulímico, que devora guloso metade da riqueza produzida por todo o pais, tem uma frota de 29 mil automóveis, que só em combustível gastam mais de 90 milhões de euros por ano – como dizia o outro (o secretário de Estado Perestrelo) “essa merda em subsídios de desemprego…”.
Nestes tempos em que as palavras verdadeiras não são agradáveis (e as agradáveis não são verdadeiras), declaro-me farto de ser chulado (preparam-se agora para nos extorquir mais dois mil milhões em impostos) e invejoso dos ingleses que elegerem um ministro que dispensou os motoristas do Governo e aconselha os colegas a andarem a pé ou de transporte público. E o pior é que não vejo jeito disto melhorar. Noutro dia, um provável ministro de um futuro Governo laranja dizia que “o problema deste país é que, desde que saiu o Paulo Macedo, as receitas fiscais nunca mais foram a mesma coisa”. Rosas ou laranjas, nisto são iguais. Acham que nós somos caixas ATM de recursos inesgotáveis. Os políticos olham para os cidadãos como os filhos para os pais. Nunca pensam em poupar, mas sim na melhor maneira de nos sacar dinheiro. São uns chulos que não aprenderam com Virgílio Ferreira que não se pode tirar sangue das pedras.
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias