Sandra Correia
Faça o favor de não se espantar se, por acaso, passar pela loja do MoMa em Tóquio e der de caras com uma imagem XXL de um guarda chuva de cortiça, identificado como o Pelcor umbrella, by Sandra Correia.
O guarda chuva e dois sacos (o messenger e o tote bag) em pele de cortiça, made in Portugal, são as coqueluches do catálogo e lojas de objectos de design do Museum of Modern Art, ao ponto de já representarem cerca de 10% das vendas da empresa dirigida por Sandra, 39 anos, uma algarvia de S. Brás de Alportel que reparte a vida entre Vilamoura e Lisboa, quando não está em viagem - amanhã voa para Nova Iorque onde apresenta 2ª feira os seus produtos na 5ª Avenida, no âmbito da Ecolux Fashion.
Na origem próxima desta paixão americana, está um telefonema do IAPMEI de Faro a perguntar a Sandra se ela estava interessada em receber a equipa do MoMa que vinha escolher objectos para a uma exposição sobre o nosso país. Foi um caso de amor à primeira vista. Estávamos em Maio de 2009. Um ano volvido, uma dúzia de artigos da Pelcor (guarda chuva, sacos, avental, pulseiras, anéis, etc) brilhavam na mostra Destination Portugal do museu da rua 53, entre a 5ª e a 6ª avenidas.
Sandra é a terceira geração de um negócio iniciado pelo avô António, fundador de uma fábrica de rolhas em S. Brás de Alportel, que subiu na cadeia de valor quando o seu filho César (o pai de Sandra é o antigo árbitro internacional de futebol César Correia) aproveitou o facto da cortiça algarvia ser mais fina para fabricar discos para rolhas de champanhe.
Os ventos sopravam de feição, após o investimento numa nova fábrica moderna, capaz de satisfazer as encomendas e cumprir as exigentes regras de clientes como a Moet & Chandon, quando, subitamente, a procura de champanhe na passagem do milénio se revelou inferior às previsões. Com os armazéns cheios, as casas de champanhe diminuíram substancialmente as compras de rolhas, nos anos seguintes, deixando os Correias barcos com mão de obra, cortiça e capacidade instalada em excesso.
Transformar a casca do sobreiro em pele de cortiça e usá-la como matéria prima para confeccionar roupa, calçado e acessórios, foi a solução inventada por Sandra para dar resposta ao excesso de cortiça, uma demonstração da acuidade da velha história dos chineses usarem o mesmo ideograma para significar crise e oportunidade – e mais uma subida na cadeia de valor do negócio da família, a coincidir com a chegada de uma nova geração.
Em Lisboa, os produtos da Pelcor estão à venda na loja própria, no nº 32 da rua das Pedras Negras, onde Sandra monta o seu quartel general quando está na capital e onde usa como cantina o Velho Macedo, um restaurante que fica a menos de cem metros de distância. Como sabe o que ela gosta, o dono pôs logo em cima da mesa um prato de broas de mel recheadas de presunto, esvaziado num abrir e fechar de olhos, e propôs-nos o pernil de porco (sugestão que ela aceitou, contanto que a sua dose viesse já desossada), que se revelou à altura e foi empurrado por um tinto da casa, oriundo de Torres Vedras e servido em jarro.
“Lá em casa sempre fomos todos Benfica”, contou ao Sandra, recordando que foi expulsa de uma aula por estar a ouvir um relato radiofónico de um jogo do clube do seu coração numa 4ª feira europeia. Acabado o Secundário, em Loulé, rumou para Lisboa e inscreveu-se no Instituto Superior de Comunicação. Desde miúda sonhava ser jornalista quando fosse grande, por influência do convívio com jornalistas da Bola e do Record quando acompanhava o pai por todo o lado.
No fim do curso, ainda fez um estágio no Record, mas rapidamente desistiu de ser jornalista e foi vender seguros da Tranquilidade Vida, onde não aqueceu o lugar, pois embirrou logo com a proibição de usar jeans. Depois de ter feito o pleno de três entrevistas, três contratos, despediu-se em protesto contra o dress code, fez as malas e retornou ao Algarve para trabalhar no negócio da família. Dito, por outras palavras, muito provavelmente não haveria guarda chuvas de cortiça à venda no MoMa se a Tranquilidade deixasse as vendedoras vestiram calças de ganga.
Jorge Fiel
Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias
Curiosidades
Carlos Manuel, Bento e Veloso foram alguns dos ídolos do seu clube (Benfica) que ela conheceu quando acompanhava o pai. Mas era sueco e não português o jogador que punha o coração adolescente de Sandra a bater mais depressa; o loiro e esguio Stromberg
Árbitro internacional, o pai estava ausente aos fins (ia apitar jogos do Nacional) e meios (jogos internacionais) de semana. Para a compensar, trazia-lhe sempre, de todos os novos países que visitava, uma boneca vestida com trajes típicos
O sucesso que o seu guarda chuva de cortiça teve quando o mostrou numa reunião de mulheres empresárias em Espanha foi para Sandra a prova dos nove de que estava no bom caminho
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Velho Macedo
Rua da Madalena 117, Lisboa
Água … 3,00 euros
Vinho … 6,00
Couvert …2,50
Broas de mel com presunto … 4,50
Pernil de porco no forno com batata e castanha … 24,00
Cafés … 3,00
Total … 43,10 euros