Teófilo Leite
“O dinheiro deve seguir o doente. Dar ao cidadão o poder de escolher onde quer ser tratado é um exercício de democracia económica, que estimula a eficiência e a qualidade da oferta porque obriga os prestadores a serem competitivos para captar o cliente. Financiar as instituições vicia o sistema”. Quem fala assim é Teófilo Leite, um engenheiro mecânico com uma visão económica do sector da saúde.
Teófilo, que acaba de tomar posse em Berlim como presidente do lóbi europeu dos privados da saúde (União Europeia de Hospitalização Privada -UEHP), tem uma agenda baseada em três princípios: acesso universal, sem qualquer tipo de descriminação (mesmo económica); elevada qualidade (“sem infecções hospitalares e doentes operados ao membro errado”); e sustentabilidade.
Toda a gente sabe que a saúde é cara. Em Portugal já consome mais do que 10% da riqueza nacional e continua a subir. Teófilo estima que se não houver um inflexão, rapidamente atingirá 1/3 do PIB. Para ele o farol é a Holanda, onde a saúde não é financiada pelo Orçamento mas sim pelos seguros de saúde obrigatórios – “tal como acontece cá com o seguro automóvel”.
Com um avô materno que fabricava formas para calçado, um avô paterno que fazia calçado por medida para os seminaristas de Felgueiras, e um pai comerciante de couros e calçados, estava escrito nas estrelas que Teófilo, 62 anos (“Ando nos 63, como se diz em Serzedo, Guimarães, onde nasci”) e seis filhos (a mais velha tem 36, o mais novo tem um), iria parar à indústria dos sapatos.
Nono de uma fornada de onze filhos, fez o secundário no Porto, no Liceu Alexandre Herculano, após o que rumou a Coimbra, onde o curso de Engenharia Mecânica foi interrompido pela Crise Académica de 69, que o atirou para Mafra, na companhia de Alberto Martins, Barros Moura e outros dirigentes estudantis.
Estava na tropa quando casou, em 1971, com uma filha do dono da Campeão Português. Acabou o curso no Porto, no ano seguinte, aproveitando as facilidades concedidas aos militares. O primeiro emprego foi como monitor na FEUP, mas quando passou à peluda foi logo mobilizado pelo sogro para o ajudar a gerir a maior fábrica portuguesa de calçado, que rapidamente pôs a produzir 12 mil sapatos/dia.
Em 1986, andava nos 38 anos, decidiu seguir o seu próprio caminho, deixando a Campeão Português e criando, também em Guimarães, uma empresa industrial, que baptizou ICC Indústria e Comércio de Calçado, especializada em calçado profissional de segurança (fornece o exército holandês, a IBM, Volvo, Mercedes, etc), que factura 15 milhões de euros anos e emprega 150 trabalhadores, que por ocasião do 25ª aniversário da fábrica receberam um seguro de saúde de prenda do patrão.
Foi parar à saúde por causa da conjugação no espaço e no tempo de uma série de acasos em que a vida é fértil. Primeiro foi um jovem médico que ajudara o seu pai nos últimos anos de vida e lhe propôs entrar no projecto que viria a ser a Casa de Saúde de Guimarães. Depois foi obrigado a perceber o sector por dentro durante os quatro anos (94-98) em que apoiou a mulher na sua luta inglória contra um cancro.
“A saúde é um sector estratégico para a nossa economia. Portugal deve ser a Florida da Europa. Temos muitos dias de sol e todas as condições para atrair os reformados do Norte da Europa”, afirma Teófilo, que escolheu almoçarmos no restaurante do Camélia Hotel & Homes, em Guimarães, o seu mais recente investimento, que ainda está a funcionar em regime de soft opening.
Vindo da sua hora de exercício diário no spa desta unidade, Teófilo atacou o bife enquanto manifestava o seu desagrado pela “visão mesquinha e corporativa” dos que querem aplicar à formação de médicos os princípios bolorentos do condicionamento industrial:
“É inadmissível que o país esteja a gastar dinheiro com os universitários que estão a estudar Medicina em Cuba, Espanha e República Checa, e a importar médicos de outros países. As nossas fábricas de saber têm de produzir médicos em quantidade não só para os dez milhões de portugueses mas também para os 30 milhões dos Palop, que vão precisar de cem mil médicos. Saúde é riqueza!”.
Jorge Fiel
Esta matéria foi hoje publicada no Diário de Notícias
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Camélia Hotel & Homes
EN 105, 787, Covas, Guimarães
Sopa de legumes
Bife com batatas alouradas e esparregado
Água
Vinho verde Gavinha Dourada
Fruta laminada (morango, ananás, laranja,uva)
Nota: O restaurante ainda não está aberto ao público. Como ainda não tem lista, o almoço foi oferecido
Curiosidades
Teófilo lidera um grupo na área da saúde, onde trabalham cerca de 250 médicos espalhados pela Casa de Saúde de Guimarães (30 quartos), Hospital Privado de Guimarães (96 quartos), Clihotel de Gaia (96 quartos), clínicas em Vizela, Urgezes, Pevidém e Taipas, a que acaba de juntar o Camélia Hotel & Homes (62 quartos)
Pensado inicialmente para acolher seniores, nacionais (calcula-se que 1/3 dos portugueses terão, em 2050, mais de 65 anos) e estrangeiros, o Camélia Hotel & Homes corrigiu o seu alvo e vai também funcionar como um hotel de saúde e aproveitar o facto de Guimarães ir ser, em 2012, Capital Europeia da Cultura, para captar turistas
O sector público continua a ser maioritário na saúde em Portugal, com um volume de negócios anual de cerca de seis mil milhões de euros, contra mil milhões dos privados. Teófilo chama a atenção para os 25% de desperdício na saúde pública, apontados pelo Tribunal de Contas, e defende que os privados devem subir a sua quota de mercado até 50%: “Já não há a desculpa de que os privados só são melhores em hotelaria e os casos difíceis têm de ir para o público. Neste momento, os equipamentos mais avançados estão nos privados”